Crítica de Filme | O Quarto de Jack

Bruno Giacobbo

Uma adaptação do romance livremente inspirado na vida da austríaca Elizabeth Fritzl, que teve sete filhos de uma relação incestuosa com o pai, Josef Fritzl, ao mantê-la em cárcere privado, no porão de casa, por 24 anos, O Quarto de Jack, dirigido por Lenny Abrahamson e roteirizado pela própria autora do livro, Emma Donoghue, traz a história de Joy (Brie Larson), uma jovem sequestrada aos 17 anos, por um desconhecido, e forçada a viver em um galpão, nos fundos de uma casa. Violentada pelo seu raptor, ela engravidou e deu à luz a Jack (Jacob Tremblay), um menino, hoje, com cinco anos. Lá, naquele mundinho particular chamado apenas de quarto, a adolescente amadureceu com a maternidade, se tornou mulher e se viu obrigada a criar todo um mundo ficcional para que o filho tivesse a infância mais normal possível; o que ela conseguiu graças a brincadeiras lúdicas e o uso da imaginação. Isto tudo, sem jamais abandonar a ideia de um dia fugir daquele lugar, algo que, no seu íntimo, mais cedo ou mais tarde, Joy sabia que teria a chance de conseguir.

O filme se divide em duas partes bastante claras: uma passada dentro do quarto; a outra transcorrida no mundo exterior, quando mãe e filho precisam se adaptar a uma nova vida. O resultado desta divisão é um desequilíbrio que influencia o ritmo com que a história é contada e torna a segunda parte um tanto desinteressante, principalmente, quando comparada a primeira. A construção do mundinho particular de Joy e Jack foi feita com o esmero de um artista. Como a trama é narrada pelo menino e ele não conhece nada além daquele lugar, em momento algum temos a sensação de claustrofobia que um adulto criado ao ar livre teria naquele cubículo. Sob a ótica do garoto, tudo ali é grande e amplo. Esta sensação é transmitida pelos enquadramentos precisos usados pelo cineasta. No entanto, perto do momento da fuga, Abrahamson muda a forma de filmar e faz uma panorâmica do quarto. Neste instante, fica nítida para o público a pequenez e a insalubridade daquele ambiente.

quartodejacktopEntre quatro paredes, a ação é toda focada no relacionamento entre mãe e filho. Ocasionalmente, aparece a figura do sequestrador vivida pelo ator Sean Bridgers. A necessidade de trabalharem, durante boa parte do tempo, apenas um com o outro, criou um laço quase que umbilical entre Larson e Tremblay. Esta cumplicidade é notada tanto na película, como nas diversas entrevistas que concederam durante a divulgação de O Quarto de Jack. E o fruto dela são momentos inspirados, de grande ternura, envolvendo dois intérpretes promissores, ela, disputando seu primeiro Oscar; ele, em início de carreira, com tenros nove anos na vida real, e um futuro brilhante pela frente. Até aí tudo bem. Se o filme fosse inteiramente dentro do quarto, seria um daqueles trabalhos que beiram a perfeição. Contudo, há uma quebra neste ritmo e a partir do instante que os protagonistas passam a conviver com outros personagens, temos outra história. As participações de Joan Allen e William H. Macy, por exemplo, na pele dos avôs sofridos, nada mais são do que um desvio do que verdadeiramente importa: Joy e Jack.

Desliguem os celulares e boa diversão.

FICHA TÉCNICA:
Diretor: Lenny Abrahamson.
Produção: Ed Guiney e David Gross.
Roteiro: Emma Donoghue.
Elenco: Brie Larson, Jacob Tremblay, Joan Allen, William H. Macy, Sean Bridgers, Megan Park, Cas Anvar, Amanda Brugel, Joe Pingue, Tom McCamus e Wendy Crewson.
Música: Stephen Rennicks.
Diretor de Fotografia: Danny Cohen.
Edição: Nathan Nugent.
Duração: 117 minutos.
País: Canadá e Irlanda.
Ano: 2015.

Bruno Giacobbo

Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
NAN