CRÍTICA | ‘Como Nossos Pais’ faz da arte uma extensão da própria vida
Bianca Moreira
No século XX, a mulher conquistou o direito à existência. No século XXI, ela luta pelo respeito ao seu corpo e suas escolhas, contra a violência domestica e sexual, contra a discriminação no mercado de trabalho e diversas outras cobranças e condutas sociais que às é imposta. Mas afinal, o que querem as mulheres num mundo em que já são reconhecidas como capazes de gerirem a própria vida, de assumirem a direção de empresas e de serem competentes chefes de família?
Essas e outras questões que permeiam a vida da mulher branca burguesa pós-contemporânea são tema do mais recente filme de Laís Bodanzky, Como Nossos Pais. O longa mostra que mesmo quando a mulher ocupa posições socialmente mais privilegiadas, ela ainda é alvo de opressões.
A história se passa em torno de Rosa que é mãe, funcionária, filha, esposa, irmã e, acima de tudo, mulher. A personagem vive um momento peculiar de sua vida. Após uma verdadeira crise de identidade e da descoberta de que sua mãe – com quem tem uma relação extremamente conturbada – tem uma doença terminal, ela passa a refletir sobre sua própria vida e toma consciência do local desprivilegiado que ocupa.
Rosa carrega toda a responsabilidade de criar suas duas filhas sozinha, já que seu marido, Dado, está muito ocupado em defender a reserva amazônica brasileira e não tem tempo para se preocupar com “causas menores”. Ela também é quem banca a casa, faz visitas à mãe e ajuda seu pai.
Nesse aspecto, Laís evidencia a reorganização familiar burguesa, na qual a posição da mulher mudou, mas a do homem sofreu pouquíssimas alterações. Hoje, a mulher foi para o mundo, ocupando lugares de expansão social como os homens, no entanto, eles não se voltaram para os deveres de casa e tão pouco aos da paternidade.
Um dos grandes destaques do filme são as cenas de nudez. Rosa aparece nua em um quarto de hotel quando está sozinha, é uma das poucas vezes em que o corpo feminino nu foi representado no cinema sem que estivesse associado ao sexo. A personagem está nua para si, porque é bom e confortável. Em outro momento, a personagem tira a camiseta no meio do centro de São Paulo após andar de bicicleta, repetindo o mesmo ato de seu colega que estava andando com ela. Naquele momento, ela não estava tentando seduzir alguém ou chamar atenção, só queria ter o mesmo direito que o homem tem de poder tirar a camisa quando está cansada e suada.
Dentro disso, é interessante destacar a importância da presença das mulheres na produção cinematográfica. Ver mulheres sendo representadas dentro do olhar de outra mulher traz uma diferença imensa, porque ela carrega o lugar da experiência.
Como Nossos Pais faz da arte uma extensão da própria vida. Trata-se de um filme que emergiu da realidade como possibilidade de reinvenção da subjetividade e do mundo. É com certeza, um filme que se tornará debate nas mesas de jantar.
Laís Bodanzky produz aqui uma arte essencialmente crítica e feminista. Denuncia a cultura patriarcal, o falocentrismo e produz um discurso que está preocupado em inventar novas formas de existência, não só das mulheres, mas também dos homens.
::: TRAILER
::: FOTOS
::: FICHA TÉCNICA
Título original: Como Nossos Pais
Direção: Laís Bodanzky
Elenco: Maria Ribeiro, Clarisse Abujamra, Paulo Vilhena
Distribuição: Imovision
Data de estreia: qui, 31/08/17
País: Brasil
Gênero: drama
Ano de produção: 2017
Duração: 102 minutos
Classificação: 14 anos