Crítica de Filme | Álbum de Família

Bruno Giacobbo

Por ter começado sua carreira no teatro e passado pela televisão, antes de chegar a Hollywood, o nova-iorquino Sidney Lumet criou um estilo particular de conceber e dirigir filmes. Sua filmografia, composta por mais de 50 longas, tem como característica marcante a “teatralização”: muito ensaio antes das filmagens, aposta irrestrita no talento dos atores, poucos efeitos e, sempre que possível, uso escasso de cenários. Há quem goste, há quem deteste. Particularmente, eu adoro e vinha sentindo falta de obras deste naipe.

Para a minha felicidade, tivemos este ano um filme brasileiro que, mais ou menos, segue estas características, o bom “Vendo ou Alugo”, de Betse de Paula. O que eu não poderia imaginar era a surpresa que a penúltima semana de 2013 reservava. A estreia do excelente Álbum de Família. Protagonizado pelas divas Meryl Streep e Julia Roberts, o longa-metragem de John Wells é um legitimo herdeiro da escola “lumetiana” de cinema.

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A história gira em torno de uma reunião na casa dos Weston. Bárbara (Julia Roberts), Ivy (Julianne Nicholson) e Karen (Juliette Lewis) são obrigadas a cuidar da mãe, Violet (Meryl Streep), depois que o pai, Beverly (Sam Shepard), a abandona. Contudo, elas não estão sozinhas. Bárbara tem a companhia do marido Bill (Ewan McGregor), de quem está se separando, e da filha problemática Jean (Abigail Breslin). Também fazem parte deste confuso núcleo familiar o tio Charles Aiken (Chris Cooper), a tia Mattie Fae Aiken (Margo Martindale) e o primo Little Charles Aiken (Benedict Cumberbatch).

Apesar de Álbum de Família ser uma adaptação da peça “August: Osage County”, olhando para filmografia de Lumet, é possível traçar um paralelo entre ele e o clássico “Longa Jornada Noite Adentro” (1962). Em ambos, nos deparamos com uma matriarca viciada em drogas lícitas e que esteve internada até pouco tempo atrás (Meryl Streep e Katharine Hepburn). Há, ainda, a figura do primogênito (a) que não quis seguir os passos do pai e é fortemente criticado (a) (Julia Roberts e Jason Robards). Além disto, nas duas películas, quase todas as cenas acontecem dentro de um antigo casarão de fazenda.

Ser semelhante a um dos mais famosos trabalhos de Lumet, por si só, não faria do filme de Wells uma grande obra. Ele precisaria de algo mais. De algo que o tornasse digno de lembrança. E este detalhe é justamente o elemento principal dos principais longas-metragens do velho cineasta: o talento dos seus atores. Em cena, o estrelado elenco brilha de forma quase que uniforme e valoriza o ótimo roteiro de Tracy Letts.

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Se as veteranas Streep e Roberts dão uma aula e justificam as respectivas indicações para o Globo de Ouro, é necessário destacar, também, as belíssimas interpretações de Martindale, Cumberbatch e Cooper. A síntese do trabalho primoroso deste grupo é uma antológica, dramática e engraçada (tudo isto ao mesmo tempo) cena de jantar. Ao término desta, a minha vontade era levantar e aplaudir de pé, como se estivesse em um teatro.

Seria injusto encerrar sem mencionar a importância de John Wells para o sucesso de Álbum de Família. Com vasta experiência televisiva, fazem parte do seu currículo as premiadas séries “ER” e “The West Wing”, ele era o nome certo para realizar este projeto. No melhor estilo “lumetiano”, sua direção, precisa e segura, soube extrair o máximo de seus intérpretes.

Desliguem os celulares e boa diversão.

BEM NA FITA: A interpretação de todo o elenco, principalmente Meryl Streep e Julia Roberts. O roteiro de Tracy Letts e a direção de John Wells.    

QUEIMOU O FILME: Nada. Lá no céu das estrelas cinematográficas, Sidney Lumet deve estar bastante feliz.

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FICHA TÉCNICA:
Diretor: John Wells.
Elenco: Meryl Streep, Julia Roberts, Julianne Nicholson, Juliette Lewis, Ewan McGregor, Chris Cooper, Abigail Breslin, Benedict Cumberbatch, Margo Martindale, Dermot Mulroney, Sam Shepard e Misty Upham.
Produção: George Clooney, Jean Doumanian, Grant Heslov, Steve Traxler, Bob Weinstein e Harvey Weinstein.
Roteiro: Tracy Letts.
Fotografia: Adriano Goldman.
Trilha Sonora: Gustavo Santaolalla.
Duração: 130 min.
Ano: 2013.
País: Estados Unidos.

 

Bruno Giacobbo

Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
NAN