CRÍTICA | ‘Black & White’ já vale a pena por trazer à tona temas que o brasileiro evita
Giovanna Landucci
Black & White é uma história fictícia e criada a partir de pesquisas realizadas pelo diretor Tristan Aronovich. O filme se passa em São Paulo, no bairro do Brás. Segundo o diretor, o projeto é pautado na discussão do tema preconceito. Para chegar neste objetivo, escolheu focar no crescente número de adeptos ao neonazismo no Brasil. E é a partir daí que se dá o encontro da história real de Johan Mengel, que se torna um personagem da ficção proposta pelo diretor com o restante do elenco que dá vida ao longa.
Por trás de um assassino pode haver intenções grandiosamente malignas como, por exemplo, os serial killers, que se alimentam do pavor de suas vítimas e da não saciedade que encontram em sua ausência de sentimentos. Porém, há outros assassinos que não agem por essa lógica, e estes são os chamados crimes passionais. Os crimes passionais, muitas vezes, são movidos por uma ideologia, seja ela qual for. No caso deste filme, que retrata o neonazismo presente no Brasil, e mais precisamente em São Paulo, os crimes são de ódio racial ou ideológico, pautados na religião e em uma supremacia branca.
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O filme é baseado na história de um grupo de neonazistas investigado por uma espécie de célula do FBI, interpol e similares. Alguns dados sobre nazismo e neonazismo presentes no filme são surpreendentes. Seja por desconhecimento dessa realidade ou até mesmo por não querer acreditar que haja tanto preconceito, homicídio e ódio pautados em diferenças sociais, religiosas e raciais no mundo. Os discursos contidos no filme que beiram o absurdo e a ignorância foram desenhados a partir das visitações que Tristan fez com a equipe técnica por estes núcleos em São Paulo, buscas de discursos da Arians Brothers e outras pesquisas acadêmicas de livros e documentários sobre o tema.
Black & White é rodado inteiramente em preto e branco para trazer as nuances de escalas de cinza e colocar todos os personagens no mesmo patamar. A coloração traz o conceito de que não há por que ter preconceitos se todos somos iguais perante a Deus, perante as leis. Os olhos dos atores traduzem uma ausência de emoção, mas ao mesmo tempo um ódio que reverbera até na projeção da voz. Falo dos crimes que chocam a maioria das pessoas, mas que para eles são exercícios da soberania da raça branca, da religião de Cristo, e isso é demonstrado a todo o momento. Paralelamente a isso, temos planos estáticos, captados com esmero de artesão e uma monocórdia narração em off que dita os interrogatórios que reforçam esta sensação.
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Essa vontade de recriar o cinema em sua mais pura essência compensa até uma série de defeitos da produção, como o roteiro meio bagunçado e atuações abaixo da média. As falas são um pouco forçadas e, às vezes, demarcadas. Há também motivações não muito inspiradas, diálogos mal trabalhados e algumas elipses que não se encaixam perfeitamente, mas isso fica de lado diante da sensação de dever cumprido.
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Os sentimentos provocados por Black & White são de uma inquietação crescente que não se desfaz nas horas seguintes após assistir ao filme. O mal, conforme mostrado por Aronovich, mora ao nosso lado e frequenta os mesmos lugares. Não tem rosto ou forma própria. De qualquer jeito, ainda que seja simples chegar nisso, o longa vale a pena por estender a discussão sobre o tema que as pessoas costumam se esquivar. Depois que as luzes se acendem, conseguir fazer com que uma obra seja responsável por trazer à tona temas que o brasileiro evita já é uma vitória completa.
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::: TRAILER
::: FICHA TÉCNICA
Direção: Tristan Aronovich
Roteiro: Tristan Aronovich
Produção: Luciana Stipp
Elenco: Tristan Aronovich, Chad Christopher, Marjo-Riikka Makela, Amanda Maya, Eric Sherman
Duração: 92 minutos
Ano: 2015