CRÍTICA | Nem ‘Tudo é Irrelevante’ no documentário sobre Hélio Jaguaribe

Larissa Bello

O documentário, que tem narração e participação da atriz Fernanda Montenegro em sua primeira parte, conta a trajetória do filósofo e cientista político, Hélio Jaguaribe. O filme tece uma costura narrativa em torno de seu protagonista, que inicia falando sobre o existencialismo dentro de uma visão cósmica, passando pela história política do Brasil, adentrando-se nas questões socioeconômicas mundiais, e termina falando sobre a própria elite intelectual brasileira.

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O longa é dirigido por Ernesto Baldan e Izabel Jaguaribe, filha do Hélio, cujo filme anterior foi “Paulinho da Viola – Meu Tempo é Hoje” (2004). Em Tudo é Irrelevante, Hélio Jaguaribe (2018), a linguagem visual escolhida pelos diretores foi o uso de ilustrações e grafias exibindo palavras que se encaixam em diversos rostos, inclusive do próprio Hélio, que dão seus depoimentos a respeito dos temas já citados acima. Esses momentos apresentam uma fotografia que é uma mistura de sépia com preto e branco, intercaladas pelas ilustrações e imagens que fazem uso de pouca cor.

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E é já na introdução da narrativa que se explica o título da obra, uma vez que Hélio discorre sobre a questão da irrelevância da condição e existência humana dentro de um contexto cósmico universal. Esse início provoca uma certa estranheza e, ao mesmo tempo, seduz pelo fato de criar uma aura de mistério sobre qual enfoque a narrativa propõe desenvolver-se. Até mesmo um conceito de transcendência vem à tona. Perante os depoimentos, parece que é chegada a uma certa conclusão ao afirmar que a arte seria uma das grandes responsáveis para se alcançar esse estado. E que o ser humano teria a capacidade de transcender a si mesmo. A tela então se escurece por completo e ficamos ouvindo somente a trilha sonora durante alguns minutos. Numa intenção talvez de fazer com que o espectador reflita e verifique a possibilidade de experimentar tal teoria.

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Depois desse momento, as imagens retornam e o Hélio fala agora sobre sua família e de suas origens, que vem de uma mãe portuguesa, um pai cearense e um filho carioca. A costura então toma o rumo mais pessoal da vida de seu protagonista. A medida que os temas vão sendo incluídos, novos depoimentos vão se somando: Celso Lafer, Candido Mendes, Maria da Conceição Tavares, Francisco Weffort, Zuenir Ventura, Luís Paulo Rouanet, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, entre outros.

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Depois disso, a temática parte para o contexto histórico e político do Brasil. Seguindo uma ordem cronológica que se inicia no governo de Getúlio Vargas, passa pelo Golpe de 1964 e a instauração da Ditadura Militar, onde Hélio se posicionou veemente contra, e termina falando sobre o olhar visionário de Juscelino Kubitschek e a fundação de Brasília. Porém, alguns detalhes importantes são deixados de fora da narrativa. Como, por exemplo, a participação de Hélio na criação do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), no final dos anos 80. Bem como o fato de ter trabalhado no Projeto Brasil Ano 2000, no governo de José Sarney, além de ter sido ministro da Ciência e Tecnologia no mandato do presidente Fernando Collor de Mello. Talvez esses fatos tenham sido considerados irrelevantes pelos cineastas, como se justifica no título do filme. Ou, realmente se intencionou ofuscar tais informações dado o caótico momento político no qual passa o país.

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Irrelevante ou não, vale destacar o admirável momento quando Hélio fala sobre qual seria o papel do intelectual dentro de uma sociedade. Ele diz que todo intelectual tem como dever transformar o mundo em que vive, torná-lo melhor. A partir dessa premissa, ele demonstra o quanto de atitude falta em muitos daqueles que se dizem intelectuais não só no Brasil, mas no mundo.

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A arte cinematográfica por si só, diferentemente do que é proposto sobre transcendência humana pelo Hélio, não tem a capacidade de transcender em si mesma. Ela precisa do espectador para completá-la e validar sua existência. E esse espectador é livre para interpretar essa arte de acordo com aquilo que é inerente a sua compreensão de mundo. Este é um documentário que foi feito para um tipo muito específico de público. E essa limitação é feita a partir de uma escolha do próprio cineasta.

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O crítico e teórico americano Bill Nichols diz que os documentários podem representar o mundo. Que eles defendem um determinado ponto de vista, afirmando qual é a natureza de um assunto, para conquistar o consentimento ou influenciar opiniões. Nesse sentido, é preciso então discordar do título de Tudo é Irrelevante, Hélio Jaguaribe, pois quando se opta em fazer um documentário, todas as imagens e contextos nele contidos lidam não somente com questões estéticas, mas, e, principalmente com questões éticas. E estes são detalhes profundamente relevantes.

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::: TRAILER

::: FICHA TÉCNICA

Direção: Izabel Jaguaribe, Ernesto Baldan
Roteiro: Suzana Macedo, Izabel Jaguaribe
Elenco: Hélio Jaguaribe, Fernanda Montenegro, Maria da Conceição Tavares Fernando Henrique Cardoso, entre outros.
Produção: Jaguar Filmes
Coprodução: Canal Brasil
Distribuição: Arthouse
Duração: 83 minutos
Ano: 2018
País: Brasil

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Larissa Bello

Graduada em Rádio & TV. Pós-graduada em Leitura e Produção Textual. Capixaba, residiu por 8 anos no Rio de Janeiro, onde atuou em diversas áreas do audiovisual. Atualmente reside em Fortaleza/CE, onde é afiliada da ACECCINE (Associação Cearense de Críticos de Cinema) e é autora do blog Cine em Foco (https://cineemfoco.blogspot.com/).
NAN