BAÚ DO BLAH! | 12 Homens e Uma Sentença (Original x Remake)
Bruno Giacobbo
Remake ou releitura. Qual é a diferença entre os dois? Esta é uma dúvida que ainda confunde a cabeça de muita gente, principalmente daquelas pessoas que encaram o cinema com um hobbie de final de semana. Mas não há mistério: remake é uma refilmagem onde nada é mudado. Mesmos planos, diálogos e situações. Releitura é algo diferente. O autor parte de uma material pré-existente e faz uma história nova. Ele tem liberdade para criar. O desfecho da trama, por exemplo, pode ser completamente diferente. Partindo destas definições, algumas perguntas são obrigatórias: Qual é a necessidade de se filmar qualquer uma das duas opções? Não seria melhor criar um material original? Em tese, sim. E eu costumo ser peremptoriamente contra remakes. No entanto, como penso ser burrice morrer abraçado em convicções, sempre dou uma chance para este tipo de obra. E foi assim que me deparei com uma agradável exceção.
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12 pessoas decidindo por uma vida
Escrito originalmente por Reginald Rose para a televisão, 12 Homens e Uma Sentença (12 Angry Men) é uma história de tribunal quase toda passada na sala de um júri. Dentro desta, as pessoas presentes no título precisam decidir o destino de um jovem porto-riquenho, morador de um cortiço, acusado de matar o pai a facadas. Mas não assistimos ao julgamento. Não sabemos o que pensam advogado ou promotor de acusação. Não sabemos como o público reagiu à medida da exposição dos fatos. Não temos nenhuma informação prévia. Só existem duas cenas fora do recinto: a primeira tomada, quando são informados sobre todas as consequências possíveis da decisão que estão prestes a tomar; e a última, quando os jurados são vistos indo embora da corte. Com uma dinâmica distinta de outros filmes do gênero, o roteiro adaptado pelo próprio autor possui duas versões separadas por exatos 40 anos.
As duas versões: a original de 1957 e o remake de 1997
A primeira é de 1957 e foi dirigida pelo meu cineasta favorito: Sidney Lumet. Com 33 anos, este judeu-americano da Filadélfia tinha vasta experiência teatral, televisiva e viria a ser considerado um dos realizadores mais prolíficos de todos os tempos. Entretanto, na época, sabia pouco de cinema. Esta foi sua estreia e, afortunadamente, teve a chance de trabalhar com um material que lhe era familiar. Ou seja: perfeito para quem ainda precisava se habituar com a nova arte. A segunda é de 1997 e foi realizada por outra lenda por quem também tenho grande apreço: William Friedkin. Ao contrário do seu colega, o homem por trás daquele que talvez seja o melhor longa de terror da História, “O Exorcista” (1973), tinha vasta experiência cinematográfica. E mesmo tendo todo este know-how ele fez um remake. Há leves e pontuais diferenças, contudo, nada que nos permita classificar a segunda como uma releitura.
O original de 1957
Com sua estrutura teatralizada, basicamente um cenário e um modesto orçamento de 340 mil dólares, o longa-metragem de 1957 apostou na força do seu texto e do seu elenco liderado por Henry Fonda e Lee J. Cobb, nos papéis dos jurados de número oito e três, respectivamente. Ao longo de sua carreira, o diretor ganharia fama por encarar cada película como se fosse uma peça e ensaiar bastante antes de rodar. Aqui, foram três semanas de preparação. O resultado é uma trupe excepcional com o entrosamento exigido por filmes com este tipo de estrutura. Só que isto não é tudo. O cineasta, que também ficaria famoso por participar de todas as etapas de feitura das suas produções (ele deixou valiosas lições no livro “Fazendo Filmes”), junto com o fotógrafo Boris Kaufman, alternando enquadramentos e lentes, conseguiu criar um clima de claustrofobia que reforça a pungente tensão pré-existente nos diálogos.
O remake de 1997
E o remake de 1997? Qual é o seu verdadeiro diferencial? Esta foi a questão que me impeliu a vê-lo. À pungência do roteiro e dos diálogos acresceu-se um elenco superior ao de 40 anos atrás, com Jack Lemmon, George C. Scott (nos papéis de Fonda e Cobb), Armin Mueller-Stahl e James Gandolfini, entre outros nomes, e uma contingência histórica: a chance de termos quatro atores negros entre os 12 jurados.
Quando a versão original foi rodada, Sidney Poitier, o primeiro homem negro a conquistar um Oscar, ainda não tinha vencido o seu prêmio por “Uma Voz nas Sombras” (1963) e ter quatro atores negros entre os protagonistas era algo improvável em 1957. Logo, se antes eram apenas brancos decidindo o futuro de alguém à margem da sociedade (em menor ou maior grau, hispânicos, assim como negros, sempre sofreram preconceito), agora, na teoria, as coisas seriam diferentes. Só na teoria, pois, através das atitudes do jurado de número dez (Mykelti Williamson), descobrimos que até os discriminados podem acabar discriminando. Mesmo que, às vezes, este seja um comportamento reativo.
As sutis diferenças entre a versão original e o remake
De resto, existe ainda outra particularidade que separa as duas versões de 12 Homens e Uma Sentença. A original é uma obra cinematográfica e foi indicada em três categorias do Oscar: filme, direção e roteiro adaptado, sem, infelizmente, vencer nenhuma delas. Já o remake é uma produção televisiva e recebeu indicações ao Emmy e ao Globo de Ouro. O grande destaque foi o veterano George C. Scott, vencedor dos prêmios de melhor ator coadjuvante. O diálogo derradeiro do seu personagem, o jurado número três, com o jurado número oito, vivido por Jack Lemmon, é um dos poucos momentos em que os filmes diferem. Não são exatamente as mesmas palavras e eu prefiro esta nova versão. Um pouco antes de capitular e votar pela absolvição do jovem, ele levanta as mãos, grita e chora. É o expurgo da tensão, a mesma que o público sente vendo estas obras maravilhosas.
Desliguem os celulares e excepcional diversão.
::: TRAILER de 1957 (original)
::: TRAILER de 1997 (remake)
::: FICHA TÉCNICA
Título original: 12 Angry Men
Direção: Sidney Lumet (1957) e William Friedkin (1997)
Roteiro: Reginald Rose
Elenco: Henry Fonda, Lee J. Cobb, Martin Balsam, John Fiedler, E. G. Marshall, Jack Klugman, Edward Binns, Jack Warden, Joseph Sweeney, Ed Begley, George Voskovec, Robert Webber (1957); Jack Lemmon, George C. Scott, Armin Mueller-Stahl, James Gandolfini, Courtney B. Vance, Ossie Davis, Dorian Harewood, Tony Danza, Hume Cronyn, Mykelti Williamson, Edward James Olmos, William Petersen (1997)
País: Estados Unidos
Gênero: drama, thriller
Ano de produção: 1957 e 1997
Duração: 96 e 117 minutos