Memórias da Dor

CRÍTICA | ‘Memórias da Dor’

Amanda Firmino

Baseado no drama “A Dor”, escrito por Marguerite Duras, personagem principal do filme, Memórias da Dor (La Douleur) é um filme autobiográfico. O longa conta parte da vida dessa escritora que é considerada uma das maiores autoras europeias do século XX. Roteirista de “Hiroshima, Meu Amor”, sua relação com o cinema já era íntima em vida bem antes que esta história tão pessoal fosse cinematografada, participando como diretora de diversos curtas e narradora de várias histórias.

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Fuga do lugar-comum

O enfoque do cinema francês, no geral, é muitíssimo diferente da forma como conhecemos peças cinematográficas. Acostumados com a filmografia norte-americana, que toma conta de todos os cinemas brasileiros e de grande parte do mundo, talvez o grande enfoque nos sentimentos e sensações dos personagens dos filmes franceses seja capaz de nos causar muito estranhamento.

E é a isso que se propõe Memórias da Dor. O lugar-comum do cinema padrão não existe aqui. A história, o desenrolar do filme e todas as situações pelas quais passa Marguerite estão longe de ser algo que vemos diariamente na sétima arte. A mulher de meia-idade, casada, envolvida com um grupo de resistência francês do qual participa seu marido, Robert, que acaba por ser preso pela SS, nos surpreende cena após cena ao não participar da visão estereotípica esperada da mulher na sociedade, tanto nos anos 40 como atualmente: recato e subserviência não são palavras que possam descrever a personagem de Mélanie Thierry, de forma alguma.

Memórias da Dor

A história

Memórias da Dor é um drama que conta com a sensibilidade do diretor e roteirista Emmanuel Finkiel. Passado durante a Segunda Guerra Mundial, numa Paris tomada pelo exército nazista, Marguerite vive uma história capaz de causar compaixão, apesar da distância geral de nossa atual realidade. Andando pelas ruas da cidade sitiada, tentando descobrir algo sobre a atual situação de seu marido de todas as formas possíveis, por estar às cegas sobre Robert desde sua captura. Marguerite sequer sabe se o mesmo está vivo ou não. Assim, tem que lidar com o peso dessa dúvida e tudo que isso a faz sentir.

O filme foca na desesperança, entremeada pelo sofrimento da protagonista. Como o próprio título nos deixa claro, sua proposta é mostrar como Marguerite faz esta passagem por um momento tão trágico de sua vida. No entanto, não há nenhum momento que Marguerite desista de viver sua própria vida. Mesmo que os maiores esforços sejam dedicados a saber o que acontece com Robert. A personagem insiste em sobrepujar a dor.

Memórias da Dor

Atuações brilhantes

O destaque vai para o personagem de Benoît Magimel, que atua brilhantemente como Pierre Rabier. Oficial da Gestapo, ele se aproxima de Marguerite com intenções subliminares. Além disso, nos permite observar um lado diferente da personagem. Aguerrida, obstinada e quase inconsequente, Marguerite envolve-se, a princípio, de forma acidental, nas entranhas da guerra. O misterioso agente é um sopro de sensibilidade que é tão focado nas emoções da autora, o que pode não agradar os fãs mais inquietos de cinema.

Shulamit Adar é outra presença incrível no filme. Sua personagem, apesar da pequena participação, nos permite um mergulho ainda mais profundo na dor que a guerra causa. Ademais, nos proporciona outro tipo de estranhamento, este mais dramático e pesaroso. A senhora Katz também aguarda por saber o destino de uma pessoa muito querida por ela. A saber, o desfecho é capaz de causar um nó na garganta até do mais insensível espectador.

Memórias da Dor

Excelência técnica

Tudo no filme contribui para a experiência que o diretor nos deseja fazer vivenciar. A trilha sonora simples, mas potente, bem como os jogos de câmera com efeitos singelos, nos cobrem de envolvimento no caos pessoal da personagem. Além disso, ainda ganhamos, de brinde, um final inesperado e agradável.

Memórias da Dor é um filme para agradar os verdadeiros fãs de cinema. Afinal, tem ótimas passagens – técnicas e emotivas – para serem apreciadas. Talvez incomode um pouco a lenta marcha dos acontecimentos. Mas conhecer a autora francesa de forma tão íntima é um presente inigualável. Principalmente numa produção com uma categorização tão boa que faz crer que é uma viagem no tempo de volta à Paris de 1944.

::: TRAILER

::: FICHA TÉCNICA

Título original: La Douleur
Direção: Emmanuel Finkiel
Roteiro: Emmanuel Finkiel
Elenco: Mélanie Thierry, Benoît Magimel, Benjamin Biolay, Shulamit Adar
Distribuição: Imovision
Data de estreia: qui, 06/06/19
País: França
Gênero: drama
Ano de produção: 2017
Duração: 126 minutos
Classificação: 12 anos

Amanda Firmino

NAN