QUEERLAND | A masculinidade tóxica na dramaturgia: É preciso assumir!
Bruno Cavalcante
No último domingo (29), o ator Reynaldo Gianecchini (46) assumiu, pela primeira vez, em entrevista à Ela, que já teve relacionamentos com pessoas do mesmo gênero. “Tive, sim, romances com homens e acho que esse é o momento certo de dizer”, revelou o astro de “A Dona do Pedaço”, que ainda completou: “O desejo para mim não passa pelo gênero nem pela idade.”
A revelação de Gianecchini pode não ser uma grande surpresa para parte do público, que durante tantos anos acompanhou as revistas e sites de fofocas insinuando que o ator já teria se envolvido com homens. Até mesmo durante o seu casamento com a jornalista Marília Gabriela. Para quem não se lembra, Giane e Gabi mantiveram um relacionamento matrimonial durante 8 anos. No entanto, na época, muitos apontavam que, na verdade, o casamento entre os dois era apenas fachada e que, de fato, Gianecchini tinha mesmo uma relação com o filho de Marília, o também ator Theodoro Cochrane. A teoria nunca foi oficialmente confirmada.
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O caso de Gianecchini é bastante incômodo dentro do que temos vivido durante todos esses anos. Afinal, Reynaldo estreou em horário nobre como o par romântico de duas grandes beldades: como Vera Fischer e Carolina Dieckmann. Isso aconteceu na novela “Laços de Família”, exibida pela Rede Globo no ano 2000. De lá pra cá, o ator emplacou diversos trabalhos. Em quase todos figurando como o galã das produções. E o que isso significa para um jovem iniciante no mundo da dramaturgia no início do século XXI? – “Seja tudo, menos gay!”. E foi o que aconteceu.
Machismo e homofobia no show business
Não é novidade pra ninguém que, durante anos, ou até mesmo nos dias de hoje, para que a carreira de um ator venha a ter êxito, ele jamais deve sofrer com qualquer tipo de interferência em sua imagem de “macho alfa”. Caso contrário, seu nome é automaticamente descartado para futuros trabalhos. Um caso parecido aconteceu com o ator norte-americano Colton Haynes (31), que, antes de se assumir gay em 2016, era tido como uma grande promessa em Hollywood. Na época, o astro era destaque das séries “Arrow” da DC e “Teen Wolf” (2011-2017).
Apesar de continuar participando desses projetos, Colton só conseguiu mesmo trabalhos adicionais nas séries “American Horror Story” e “Scream Queens”, ambas produzidas por Ryan Murphy, que “coincidentemente” também é gay. Em diversas entrevistas, Haynes já relatou abertamente que se tornou muito mais difícil conseguir papéis após se assumir.
No Brasil
Outro caso recente é o de Leonardo Vieira (50), conhecido por suas participações em novelas e séries durante as décadas de 90 e 2000. Dentre os diversos trabalhos do ator, temos algumas produções de grande sucesso como “Sonho Meu” (1993); “Quatro por Quatro” (1994); “Os Maias” (2001); e “Senhora do Destino” (2004). Em quase todas elas, o apelo sexual do galã era sempre muito requisitado. Leonardo assumiu sua homossexualidade em janeiro de 2017, logo após ser fotografado beijando um amigo em uma festa no Rio de Janeiro. A foto viralizou e o caso acabou afetando a vida social do ator, que um mês depois decidiu falar sobre sua orientação sexual em uma carta aberta.
Uma observação curiosa é que o último trabalho de Vieira aconteceu na novela “Vitória”, produzida em 2014 pela Rede Record. Ou seja, antes de tudo vir à tona. No entanto, de lá pra cá, o ator não apareceu em nenhuma outra produção para TV. Além disso, Leonardo chegou a reclamar da violência sofrida no Brasil por parte de comentários e ameaças após se assumir, o que acabou contribuindo para sua mudança para Portugal.
“Vários fatores foram determinantes para minha mudança. Em primeiro lugar, busca de melhor qualidade de vida. Isso inclui viver melhor gastando menos. Em Portugal, a homofobia é bem menor que no Brasil, eu não sofro ameaças de morte por ser eu, como já aconteceu no meu país.”, disse o ator em entrevista ao EXTRA, em maio de 2019.
Novos tempos, novas transformações
Analisando o desenvolvimento do machismo e a homofobia no mundo do entretenimento ao longo do tempo, é claro que iremos encontrar uma curva ascendente e positiva, visto que, hoje, temos galãs como Reynaldo Gianecchini falando sobre sua sexualidade de uma maneira tão natural à imprensa. Além dele, tivemos também outros grandes nomes tidos como “machões” que se assumiram gays e que até então não chegaram a ter suas carreiras afetadas ou reduzidas como o veterano Marco Nanini e o galã internacional Luke Evans (“A Bela e a Fera” / “Drácula: A História Nunca Contada”). Evans (40), que se assumiu aos 22 anos, revelou à revista The Jackal, em 2017, que ser gay não prejudicou sua carreira em Hollywood, mas que prefere manter sua vida pessoal separada e fora dos holofotes.
Todavia, muitos desses nomes que ainda continuaram com certa relevância após suas declarações, em parte, foram ou são beneficiados pelo conceito da bissexualidade, caso de Gianecchini, José de Abreu, Miguel Falabella e Luís Fernando Guimarães. E, querendo ou não, o preconceito sofrido por gays, principalmente os afeminados, ainda é muito mais intenso e até mesmo letal.
A representatividade importa
É claro que existem muitos atores gays ou bissexuais que estão tocando suas carreiras e não desejam a exposição, o que devemos respeitar. Até porque, se hétero não precisa sair por aí assumindo pra família que gosta do sexo oposto, o gay também não é obrigado a fazer. No entanto, assumir-se gay, lésbica, trans ou bi vai muito além do “eu”. Hoje, um ato como esses, principalmente partindo de alguém famoso e admirado pelo público, pode ser um conforto para aquela pessoa que esteja passando por problemas de autoaceitação. A verdade é que o mundo é plural e todo mundo precisa se sentir representado.
Por isso, cada vez mais faz-se necessário nomes como Gianecchini, Luke Evans, Silvero Pereira, Sam Smith, Colton Haynes, Daniela Mercury, Fernanda Gentil, Silva, Pabllo Vittar e tantos outros. Afinal, representatividade importa sim!