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QUEERLAND | ‘The Family’ e nazismo não abraçam comunidade LGBTQ+

Giselle Costa Rosa

“Não cabe ao Estado fazer cultura, mas, sim, criar condições de acesso universal aos bens simbólicos. Não cabe ao Estado fazer cultura, mas, sim, proporcionar condições necessárias para a criação e a produção de bens culturais, sejam eles artefatos ou mentefatos. ”

Gilberto Gil – cantor, compositor e ex-ministro da Cultura

Estado nazista

Na semana passada, a notícia da exoneração do secretário da Cultura Roberto Alvim, após um discurso plagiado do chefe da propaganda do nazismo, Joseph Goebbels, foi manchete em todos os jornais. Devido a isso, uma grande onda de indignação eclodiu nacional e internacionalmente. Leia/veja (ou reveja) o discurso no site do G1.

A saber, no Brasil, no atual governo, existe um filtro de ideologia religiosa para escolher os projetos artísticos a serem financiados, particularmente no cinema. Está explícito o desejo de utilizar a política cultural do Estado brasileiro para disseminar a ideologia do governo, aproximando-o do nazismo.

Aliás, essa visão autoritária da cultura, exacerbada no discurso de Alvim, demonstra o quanto as minorias estão em risco. Além de nossa democracia, claro. Alinhado com os ideais do nazismo, a ordem é discriminar negros, bem como mulheres, índios e a população LGBTQ+, e – por que não – os judeus?

O nazismo prosperou através de sua propaganda simples, forte e sólida dirigida às massas. Em geral, com mensagens que muitas vezes eram mentirosas, mas que contadas mil vezes se tornariam realidade, como disse Goebbels. De fato, os pilares exaltados nesse regime são a pátria, a família e Deus (mas lembre-se: só serve o deles), mesmo ideias adotados pelo governo de Bolsonaro.

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Os excluídos da ‘família’

Nessa família e nesse conservadorismo cristão não cabem, de cara, a comunidade queer. Os índios só se forem evangelizados (senão exterminados); os negros, caso domesticados; as mulheres só caladas e os judeus, dizimados (?)

Para ilustrar o quão perigoso pode ser juntar, intrinsecamente, política e religião, indico que seja assistido The Family – Democracia Ameaçada, minissérie documental, com apenas 5 episódios, que estreou neste mês na Netflix. Jornalistas investigativos lançam luz sobre a Confraria, uma organização fundamentalista cristã que atua secretamente nos corredores do poder de Washington. Bem, no decorrer dos episódios vemos que os tentáculos dessa organização – que não é a única a atuar assim – alcançam o mundo todo.

Religião como ferramenta de poder e exclusão

São fatos de bastidores elucidativos. Em nome de um Jesus e pautados em sua própria versão da Bíblia, homens (todos heterossexuais brancos) discutem e decidem o futuro das populações pelo mundo. Sua influência, o poder fincado nos EUA, fazem dessa Confraria uma das mais influentes no planeta. Seja um ditador cruel ou um ícone religioso, todos que os “escolhidos” têm ou tiveram contato com seus dirigentes. Nem é necessário falar que os únicos interesses em pauta são a manutenção da concentração do poder e das riquezas na elite, né? A religião é nitidamente um imbróglio para construir um elo de ligação entre eles e os líderes dos países.

As mulheres dentro dessa Confraria só têm o papel de apoio, só falam quando solicitadas, devendo ser procriadoras e prendadas. O objetivo de vida deve ser casar e ser sustentada por um “BOM homem de fé”.

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Na ‘família de Deus’ não cabe a comunidade queer

O que mais me chamou atenção nessa minissérie – além do alcance político-econômico e sua cruzada cristã – é, certamente, como eles também interferiram junto às lideranças dos países estrangeiros aos ataques à comunidade LGBTQ+, apoiando leis de proibição de casamento ou até mesmo pena de morte (como no caso da Nigéria). Uma atuando na defesa da “família e dos bons costumes”. Até mesmo a Rússia de Putin surge nesse cenário, flertando abertamente com essa orientação ao se aproximar da Igreja Ortodoxa Russa pela luta do fortalecimento da família tradicional.

A Romênia foi outro país que sofreu influência nesse setor. A Confraria apoiou, sem sucesso, um referendo contra casamento gay, uma iniciativa de ONGs próximas à poderosa Igreja ortodoxa reunidas em uma “Coalizão para a família”.

Mais do mesmo: manutenção das elites no poder

Aliás, os conservadores dessas organizações sonham em restabelecer a antiga ordem onde as famílias queer, “aberrações”, não tinham vez nem voz. Onde as mulheres se limitavam a administrar a casa e ter filhos. Afinal, querem enterrar a cultura “progressista e devassa”. Colocar os negros e índios “preguiçosos” nos seus devidos lugares.

Por fim, manter a elite econômica protegida de qualquer turbulência e abrir vias na qual ela possa, cada vez mais, prosperar em cima da miséria crescente da população. Imperante mesmo se faz defender a democracia sem fazer vista grossa diante dessa política excludente de ideologia religiosa.

::: TRAILER

::: FICHA TÉCNICA

Título original: The Family
Temporada: 1
Número de episódios: 5
Direção: Jesse Moss
Elenco: James Cromwell, David Rysdahl, Ben Rosenfield, Jeff Sharlet
Distribuição: Netflix
Data de estreia: sex, 09/08/19
Gênero:  documentário
Ano de produção: 2019
Classificação: 14 anos

Giselle Costa Rosa

Integrante da comunidade queer e adepta da prática da tolerância e respeito a todos. Adoro ler livros e textos sobre psicologia. Aventuro-me, vez em quando, a codar. Mas meu trampo é ser analista de mídias. Filmes e séries fazem parte do meu cotidiano que fica mais bacana quando toco violão.
NAN