O pedido de João

Marcus Di Bello

João encontrou o gênio da lâmpada, que lhe concedeu um único pedido. João refletiu por alguns segundos e, pensando na atual condição da sociedade, pediu que o mundo mudasse. E que cada um pudesse trabalhar com aquilo que verdadeiramente ama. E que ninguém sofresse opressão do sistema. E que todos pudessem viver em paz.

– Feito!

E o mundo mudou. Ninguém lembrava como era antes. Era como se estivessem em um universo paralelo. A humanidade transbordou amor. No começo, tudo era motivo para festa. As crianças sofriam, pois lhes era permitido trabalhar com aquilo que verdadeiramente amavam (e “trabalhar” nesse universo paralelo era sinônimo de “projeto de vida”), porém, por serem ainda imaturas, demoravam a descobrir e entender aquilo que amavam. Então foi criado um local para que as crianças pudessem aprender de tudo um pouco, com profissionais que amavam o que faziam, para que assim elas pudessem decidir.

Não existia dinheiro. Não faltava nada a ninguém, mas era preciso que cada um trabalhasse com aquilo que verdadeiramente ama, então, se alguém ainda não tivesse descoberto, acabava fazendo qualquer coisa fingindo amar. E com o fingimento do amor, palavras surgiram para dar conta de explicar o que era cada camada desse fingimento. Palavras como gratidão, justiça, carinho, afeto, consideração.

E com a falta do amor verdadeiro começaram os conflitos. E novos sistemas foram surgindo. E novos movimentos nasciam. Até que um outro João, anos depois daquele primeiro, encontrou o gênio da lâmpada, que lhe concedeu um único pedido. João refletiu por alguns segundos e, pensando na atual condição da sociedade, pediu que o mundo mudasse. E que cada um pudesse trabalhar com aquilo que verdadeiramente ama. E que ninguém sofresse opressão do sistema. E que todos pudessem viver em paz.

– Feito!

Marcus Di Bello

Ator, diretor, dramaturgo, poeta e ser humano. Escreve desde 2006. Influenciado principalmente por Charles Bukowski, Mário Bortolotto, Raymond Carver, Paulo Leminski e Henry Miller. Admira Kafka, Baudelaire, Carlos Drummond de Andrade, Samuel Beckett e Dylan Thomas. Gregório é o protagonista dos contos e uma espécie de alter ego do autor, que mistura passagens autobiográficas e ficcionais.
NAN