Crítica de Filme | Uma História de Amor e Fúria

Wilson Spiler

“Meus heróis não viraram estátuas. Morreram lutando contra os que viraram” ou “Viver sem conhecer o passado é andar no escuro”.

Com essas frases – ou quase isso – , já temos um breve resumo do que conta Uma História de Amor e Fúria. Dirigido por Luiz Bolognesi, a produção demorou quase uma década para ficar pronta, devido às dificuldades de se fazer animação desse tipo no Brasil. Além disso, o cineasta – e também roteirista – fez uma profunda pesquisa dos momentos históricos de nosso país para que víssemos na tela uma versão alternativa – e verdadeira – do que aprendemos nos livros. Por conta disso tudo, mesmo apresentando pequenas deficiências, o longa é uma vitória para o cinema nacional.

Com um elenco de dubladores como Selton Mello Camila Pitanga, além da participação especial de Rodrigo Santoro, Uma História de Amor e Fúria conta a história do amor entre Janaína e Abeguar, um guerreiro indígena que, ao morrer, assume a forma de um pássaro e volta de tempos em tempos “encarnado” em outro corpo. Durante seis séculos, o romance sobrevive, atravessando quatro fases da história do Brasil: a colonização, a escravidão, o regime militar e o futuro, em 2096, quando haverá uma guerra pela água. Em todos estes períodos, os dois lutam contra a opressão.

Derrubando "mitos" como Duque de Caxias

Derrubando “mitos” como Duque de Caxias

Mas o que há de tão especial no filme? Além de ser uma animação voltada para um público mais adulto (fato raríssimo em nosso país) – com referências a quadrinhos de Frank Miller, entre outros – e utilizar uma técnica diferente da produzida por aqui, baseada no anime, mas com traços “disneyanos” (há defeitos, é verdade, mas também não deixa de ser louvável a tentativa), o longa põe por terra abaixo os “mitos” nacionais como Duque de Caxias, por exemplo, que promoveu uma guerra sangrenta para recuperar o território ocupado pelo povo. Mostra também como foi feita a colonização no Brasil, além de provocar empresas como a CCR (responsável pelas Barcas S.A. e a Ponte S.A. no Rio), que, no futuro, domina boa parte dos transportes.

É bem verdade que Uma História de Amor e Fúria, é claro, tem como pano principal o romance que rompe séculos, até porque, se fosse contar apenas a História do Brasil, tornaria-se uma espécie de documentário e perderia um público precioso – e necessário – para o sucesso da produção nos cinemas brasileiros. A presença de nomes famosos no elenco também ajuda a angariar espectadores, embora a escolha dos atores para a dublagem não tenha sido baseada nisso e sim na qualidade da interpretação dos profissionais.

O Rio de Janeiro em 2096... profecia?

O Rio de Janeiro em 2096… profecia?


“Para não dizer que só falei de flores”, a técnica de animação é bem interessante, mas algumas cenas me incomodaram um pouco, como quando o pássaro voava céu adentro. Não me convencia muito a interação da ave com o cenário. Mas isso foi sendo amenizado com o decorrer do filme, principalmente na última parte (a do futuro), que é, sem dúvida, a mais bem-feita longa de 74 minutos. Aliás, esse último detalhe sobre a duração da película é outro ponto positivo, feito sob medida para não cansar o público com um tema relativamente complexo.

Uma História de Amor e Fúria tem tudo para marcar uma nova era no cinema brasileiro. Basta que nossos cineastas tenham a coragem de Bolognesi e pensem grande, saindo dessa mesmice de comédia “à lá Zorra Total” que assola as nossas salas de exibição. Dinheiro é importante, mas conteúdo é tudo! E isso, essa produção tem de sobra.

O romance indígena entre Abeguar e Janaína

O romance indígena entre Abeguar e Janaína

– Confira nossa matéria sobre o bate-papo com o diretor Luiz Bolognesi

BEM NA FITA: história bem contada e original; tempo de duração pontual; aula de História do Brasil na telona; ousadia acima de tudo.

QUEIMOU O FILME: a técnica de animação ainda necessita de ajustes, embora tenha evoluído no decorrer do filme.

FICHA TÉCNICA:

Nome: Uma História de Amor e Fúria
Diretor: Luiz Bolognesi
Elenco: Rodrigo Santoro, Camila Pitanga, Selton Mello
Produção: Fabiano Gullane, Caio Gullane, Luiz Bolognesi, Laís Bodanzky, Marcos Barreto, Debora Ivanov, Gabriel Lacerda
Roteiro: Luiz Bolognesi
Fotografia: Anna Caiado, Daniel Greco
Trilha Sonora: Rica Amabis, Tejo Damasceno, Pupillo
Duração: 74 min.
Ano: 2012
País: Brasil
Gênero: Animação
Cor: Colorido
Distribuidora: Europa Filmes
Classificação: 12 anos

Wilson Spiler

Will, para os íntimos, é jornalista, fotógrafo (ou ao menos pensa que é) e brinca na seara do marketing. Diz que toca guitarra, mas sabe mesmo é levar um Legião Urbana no violão. Gosta de filmes “cult”, mas não dispensa um bom blockbuster de super-heróis. Finge que não é nerd.. só finge… Resumindo: um charlatão.
NAN