Crítica de Filme | Jersey Boys – Em Busca da Música

Bruno Giacobbo

Quando Clint Eastwood anunciou que faria um musical tal notícia causou grande alvoroço. O gênero não combinava nada com o ex-protagonista de filmes de cowboys e policiais violentos. A seu favor o fato de, como diretor, ter realizado trabalhos tão distintos quanto o díptico sobre a Segunda Guerra, A Conquista da Honra e Cartas de Iwo Jima, de 2006, e dramas premiados como Menina de Ouro, vencedor do Oscar, em 2004. Ainda assim, a primeira vista, algo não fazia sentido.

Analisando melhor o projeto, a filmagem da peça da Broadway, ganhadora de quatro Tonys, sobre o músico ítalo-americano Frankie Valli e a banda The Four Season, já dava para perceber que a ideia não era tão absurda assim. Ao decidir levar para as telonas a história de quatro jovens nascidos e criados na comunidade italiana de New Jersey, um mundo impregnado pela violência latente e pelos costumes da Máfia, Eastwood teria a chance de brincar com o gênero. E foi o que ele brilhantemente fez.

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Jersey Boys: Em Busca da Música, em cartaz desde o último dia 26 de junho, não é um musical convencional. A primeira e mais marcante distinção é o fato do filme ter muitas falas. Diferente de outras obras deste tipo, os atores dialogam. As músicas, compostas por Bob Gaudio e Bob Crewe, servem como complemento e aparecem em cenas específicas: quase sempre apresentações do grupo. Além disto, com uma única exceção, e que deliciosa exceção, não há aquelas cenas gigantescas onde muitos personagens cantam e dançam, executado uma coreografia ensaiada exaustivamente.

Outra diferença em relação aos musicais tradicionais foi a forma escolhida pelo cineasta para narrar a história. Ao longo do filme, ouvimos as opiniões de Frankie Valli (John Lloyd Young), Tommy DeVito (Vincent Piazza), Nick Massi (Michael Lomenda) e Bob Gaudio (Erich Bergen). Alternadamente, os quatro integrantes da banda conversam com a câmera, como se falassem com o público, e vão dizendo o que pensam sobre determinadas situações. Em alguns momentos pode soar didático ou professoral demais, mas serve para explicar o que não pode ser filmado e mostrar que nem tudo era conto de fadas na carreira daqueles jovens talentosos.

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Com cores berrantes e vestuários que reproduzem com perfeição o clima dos anos 50 e 60, o longa-metragem de Eastwood chama a atenção também por guardar algumas semelhanças com outras obras de sua autoria. Tem um pouquinho de tudo. Ação (Gran Torino), dramas familiares (Menina de Ouro e Sobre Meninos e Lobos) e personalidades famosas (Invictus e J. Edgar). Uma mistura inusitada que se revelou eficiente.

Mesmo com ótimas atuações, destaque para o protagonista Lloyd Young, seu desempenho cantando Can’t Take My Eyes Of You é emocionante, Piazza, mais conhecido por sua participação na série Boardwalk Empire, e para um sempre carismático Christopher Walken, no papel de um chefão mafioso, esta receita alternativa de musical poderia ter dado errado. No entanto, Jersey Boys: Em Busca da Música funciona de forma tão maravilhosa que, após quase duas horas e meia de filme, é praticamente impossível não deixar o cinema com gosto de quero mais.

Desliguem os celulares e boa diversão.

BEM NA FITA: A subversão do gênero musical.

QUEIMOU O FILME: Niente.

FICHA TÉCNICA:

Diretor: Clint Eastwood.
Elenco: John Lloyd Young, Erich Bergen, Michael Lomenda, Vincent Piazza, Christopher Walken, Renée Marino, Kathrine Narducci, Lou Volpe, Freya Tingley, Grace Kelley, Elizabeth Hunter, Mike Doyle, Rob Marnell, Johnny Cannizzaro, Donnie Kehr, Jeremy Luke, Joey Russo, James Madio, Erica Piccininni, Steve Schirripa, Barry Livingston, Miles Aubrey, Kim Gatewood, Jackie Seiden, Kyli Rae, Troy Grant, Heather Ferguson Pond, John Griffin, Chaz Langley, Billy Gardell, Francesca Eastwood e Sean Whalen.
Produção: Clint Eastwood, Graham King e Robert Lorenz.
Roteiro: Marshall Brickman e Rick Elice.
Música: Bob Gaudio e Bob Crewe.
Montagem: Joel Cox e Gary D. Roach.
Fotografia: Tom Stern.
Duração: 134 min.
Ano: 2014.
País: Estados Unidos.

Bruno Giacobbo

Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
NAN