A Camareira (2)

‘A Camareira’ | CRÍTICA

Karinna Adad

Um emprego como outro qualquer. Não fosse o fato de ele exigir a abnegação quase total da vida fora do ambiente de trabalho e uma presença o mais invisível possível. Essas são duas das realidades trazidas pelo filme A Camareira (La Camarista), de Lila Avilés, dentre tantas outras. Na obra, acompanhamos o dia a dia de Eve (Gabriela Cartol), uma camareira que trabalha em um luxuoso hotel na Cidade do México, enquanto tenta conciliar a vida pessoal com a possibilidade de ascensão profissional. Essa ascensão na carreira, longe de garantir uma existência abastada como a dos hóspedes para quem trabalha, permitiria superar o estado de sobrevivência na qual se encontra e alcançar uma vida minimamente confortável.

A trama

Passando-se inteiramente nas dependências internas do hotel, o filme mostra uma jovem mãe solteira que precisa empreender longos e cansativos turnos de trabalho na esperança de tornar-se responsável pelos quartos do andar 42, tido como mais prestigioso e com melhores ganhos. Durante esse processo, Eve percebe a necessidade de crescer intelectualmente, uma vez que no andar almejado hospedam-se grandes executivos e é desejável estar à altura desse público. Então, começa a participar das aulas oferecidas por um projeto educacional financiado pelo hotel. Nesse ambiente, estabelece vínculos sociais determinantes para a virada final vivida pela camareira.

Enquanto frequenta as aulas, Eve, antes tímida, introspectiva e focada no trabalho, vai transformando-se em uma pessoa mais extrovertida e menos desconfiada. Em grande medida, isso ocorre após a aproximação de Minitoy (Teresa Sánchez), uma camareira mais velha e fanfarrona que consegue quebrar o gelo dela e mostrar que a vida pode ser mais do que trabalho. O interessante aqui é perceber que uma relação de confiança surge a partir de uma figura feminina que consegue, ao mesmo tempo, trazer momentos de alegria e de decepção quando é a preterida para ficar com o andar 42.

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A Camareira (1)
Dor e frustração para traçar um novo caminho

A partir desse revés, a realidade mostra que a vida nem sempre é justa. E que, por mais que isso traga algum tipo de dor, o resultado depende muito mais de como reagimos ao sofrimento imposto. No caso de A Camareira, a personagem principal parece utilizar a dor e a frustração como um forte motivador para tomar as rédeas da própria vida e traçar um novo caminho. Após o anúncio da preferência por Minitoy como responsável pelo piso 42, Eve ruma em direção a este andar. Ao adentrar em um dos quartos, observa toda a opulência que agora lhe parece ainda mais inacessível.

No entanto, ao invés de revolta ou mesmo tristeza, os movimentos e o olhar de Eve parecem demonstrar uma tomada de consciência do seu papel dentro de uma lógica de trabalho que exige muito, cria expectativas e as frustra sem levar em consideração os esforços sobre-humanos realizados. Enquanto se esforçava para conseguir o andar 42, ela, sucessivamente, solicitava retornos à gerência ante uma demanda para ficar com um vestido vermelho esquecido por uma hóspede. Não por acaso, a negativa do andar 42 vem acompanhada pela permissão para ficar com o tal vestido.

Enfim, trata-se de um prêmio de consolação e Eve compreende isso. A troca do tão querido vestido por um objeto sem valor pertencente a outra camareira e a sua saída do hotel pela porta da frente nos leva a crer que ela, por fim, entende o seu papel de subalternidade diante de um sistema pouco – ou quase nada – comprometido com os anseios e as renúncias feitas por seus funcionários. No final de tudo, para que a mesma invisibilidade imposta pelos hóspedes às camareiras ataca os próprios pares.

::: TRAILER

https://youtu.be/NoNNIe30428

::: FICHA TÉCNICA

Título original: La Camarista
Direção: Lila Avilés
Elenco: Gabriel Cartol, Teresa Sánchez, Augustina Quinci
Distribuição: Supo Mungam Films
Data de estreia: qui, 14/11/19
País: México
Gênero: drama
Ano de produção: 2018
Duração: 102 minutos
Classificação: a definir

Karinna Adad

Tranquila, mas multitarefada. Sou daquele tipo de pessoa que sempre está fazendo alguma coisa e descobrindo outras tantas pelo caminho. Topo qualquer parada desde que tenha prazer nela e uma das que por mais tempo vem me enchendo de alegria é a escrita. E como boa leitora consigo escrever sobre quase qualquer coisa, por mais que, como uma cientista social em formação, não consiga deixar de fazer agir meu raio problematizador nos meus textos.
NAN