A Filha Perdida

‘A Filha Perdida’ discute o tabu da maternidade

Fábio

Existe uma cena emblemática em A FIlha Perdida (The Lost Daughter), em cartaz na Netflix, que descreve com sutileza e perfeição o tema central do filme dirigido com maestria por Maggie Gyllenhaal em sua estreia por trás das câmeras. Nela, a jovem Leda (interpretada nesta fase por Jessie Buckley), mãe de duas filhas pequenas, esgotada, lembra ao marido, que não sai do telefone, que hoje é o dia dele cuidar das garotas. A resposta dele traduz a mentalidade masculina sobre gravidez e criação: “não posso, estou trabalhando”. Em outras palavras, na cabeça do homem os bônus da criação ficam apenas com eles, enquanto que os ônus são todos das mulheres.

Discutir maternidade é um dos maiores tabus contemporâneos. Afinal de contas, a mística do “ser mãe é padecer no Paraíso” impede que as mulheres coloquem para foram todos os dessabores que elas sofrem durante e logo após a gravidez. Em suma, é praticamente inaceitável pela sociedade que mulheres recusem ou admitem que não gostam daquele papel que “lhe foi dado” pela graça divina. E é justamente nessa ferida que a diretora coloca o dedo, com delicadeza e sutileza, mas sem arrependimento ou medo de represálias.

A Filha Perdida

A trama

Adaptado do romance homônimo de Elena Ferrante, A Filha Perdida mostra uma madura Leda (agora interpretada pela excepcional Olivia Colman), perto dos seus 50 anos, de férias sozinha em uma praia, a princípio, ilosada na Grécia. Sua paz e tranquilidade acaba com a chegada de uma família grande, barulhenta e espaçosa. Ao mesmo tempo que sente seu espaço invadido, ela se conecta rapidamente com Nina (Dakota Johnson), uma jovem mãe que tem uma pequena filha que exige toda sua atenção, durante todo o tempo em que estão juntas.

A rápida conexão entre elas desperta um gatilho em Leda, que a faz refletir sobre seu passado, bem como sua experiência em ser mãe. Tanto no sacrifício pessoal e profissional durante os primeiros anos de criação de suas filhas, quanto nos anos em que deixou as meninas para serem criadas pelo pai durante alguns anos, quando ela resolveu tomar um tempo para si e para sua carreira.

A Filha Perdida

A força feminina

Por abordar um tema tão delicado e feminimo como a maternidade, A Filha Perdida precisava ser realizado por mulheres e, de preferência, fortes e talentosas. E neste quesito o filme também acerta em cheio. Conhecida mundialmente pela trilogia Cinquenta Tons de Cinza, Dakota Johnson demonstra uma enorme maturidade como Nina. Sobrecarregada, reticente, duvidosa em relação ao seu papel como mãe da pequena Elena (Athena Martin Anderson), ela se transforma e nos entrega uma personagem fantástica.

Mas é claro que a grande força do filme é Olivia Colman. A extraordinária atriz britânica que vem chamando a atenção desde a série inglesa Broadchurch é de uma força e talento avassaladores. Sua atuação é sublime, deixando para trás seus maravilhosos trabalhos realizados em belíssimas produções como ‘Fleabag’, ‘The Crown’, ‘Meu Pai’ e, assim como, ‘A Favorita’. Este último talvez o único empecilho de ganhar o oscar de melhor atriz, visto que ela conquistou o prêmio por sua atuação como a rainha Anne neste filme.

Por fim, nada disso seria possível sem a bela estreia de Maggie Gyllenhaal na direção. Um trabalho impecável, admirável e soberbo que mostra que a atriz tem tudo para se tornar uma grande diretor. Afinal de contas, não é todo mundo que consegue logo em seu primeiro filme entregar uma belíssima obra-prima.

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Ficha Técnica – A FIlha Perdida

Título original: The Lost Daughter
Direção: Maggie Gyllenhaal
Roteiro: Maggie Gyllenhaal, Elena Ferrante
Elenco: Olivia Colman, Jessie Buckley, Dakota Johnson, Ed Harris, Peter Sarsgaard, Dagmara Dominczyk
Data de estreia: sexta-feira, 31/12/2021
Onde assistir: Netflix
Duração: 122 minutos
País: Grécia, Reino Unido e Estados Unidos
Gênero: drama
Classificação: 16 anos

Fábio

Santista de Nascimento, flamenguista de coração, paulistano por opção. Jornalista, assessor de imprensa viciado em cinema, série, HQ, música, games e cultura em geral.
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