Ao Seu Lado
Crítica do filme
“Quem não luta já perdeu”, dizia Brecht. Em Guerra é um filme do diretor francês Stéphane Brizé sobre uma grande batalha. Calma, não fala sobre Segunda Guerra Mundial, mas sim de outras lutas dos tempos modernos.
Leia mais:
– ‘CORINGA’ SEM SPOILERS | CRÍTICA
– BÔNUS | ‘COCAINE’ E A ‘EUPHORIA’ DE UM CORINGA TÓXICO
– ‘FORO ÍNTIMO’ | CRÍTICA
Sem dúvidas, a escolha do diretor é corajosa e estilisticamente valiosa ao realizar um filme que na maior parte do tempo parece um documentário. Uma câmera nervosa que mantém certo distanciamento usando um foco que nos posiciona dentro da ação. Nas reuniões entre empresários e trabalhadores, ou entre sindicalistas e manifestantes, o filme consegue nos imergir na trama.
Afinal, são 1.100 reivindicando a manutenção de seus empregos. A administração da Perrin Industrie, multinacional alemã, decide fechar uma fábrica na França e reabrir na Romênia, onde os salários são substancialmente mais baixos. Contudo, apesar dos sacrifícios por parte de seus funcionários e lucros recordes no ano, a administração mantém a polêmica decisão. Desesperados, os 1100 lutam como os 300 de Esparta, usando principalmente a arma da greve. Na liderança está o carismático e firme sindicalista Laurent Amédéo, protagonista desse filme dramático que faz pensar sobre justiça, neoliberalismo e precariedade do trabalho. O roteiro é da autoria de Brizé, Ralph Blindauer e Olivier Gorce; o elenco conta com o veterano Vincent Lindon (sua quarta colaboração com Brizé) em uma atuação intensa e cativante. Ainda por cima, todo o elenco é eficiente em proporcionar a atmosfera realista.
Em uma passeata, a câmera chega a se perder, saindo do foco, aumentando nossa sensação de realidade. A trilha sonora original de Bertrand Blessing complementa e amplifica o clima de tensão mantido durante a exibição, um suspense contínuo como se tudo fosse explodir Em Guerra. O destaque do longa-metragem, além da incisiva exemplificação do jogo de interesses, é suscitar o debate sem pender para maniqueísmos baratos.
Aliás, pontualmente vemos também através da ótica da cobertura televisiva. A guerra é de informações, valores (em vários níveis). Enquanto isso, a tensão aumenta. Há uma reunião entre os grevistas onde percebemos claramente a estratégia dos diretores da empresa de “dividir e conquistar”. A batalha se afunila, o título do longa é uma alusão contumaz a essa guerra dos tempos modernos. Acompanhamos pugilistas disferindo socos em forma de argumentos. Os dividendos dos acionistas contra as necessidades básicas dos trabalhadores. Trocas de acusações e farpas, estratégias, mentiras, excessos, erros e acertos.
Enfim, a paisagem passa rapidamente através da janela do carro que corta para um close. Vaidades humanas, honra, nervos à flor da pele. Quando parece que a esperança sobressairá, a cruel realidade se impõe levando a um final angustiante. Ao mesmo tempo em que os créditos subiam, não pude levantar, ainda tentando digerir as últimas cenas desse filme contundente e necessário.
No entanto, mesmo dotada de óbvia carga ideológica, reitero que o longa não é maniqueísta mostrando empresários como vilões e trabalhadores como heróis. Há, inclusive, um esforço para apresentar as diferentes perspectivas da situação. As vaidades e lutas por protagonismo dentro das reuniões sindicais, as diferentes opiniões, a irrelevância humana perante os lucros, a linha tênue entre certo e errado. Em suma, um longa-metragem importante para refletir sobre os tempos em que vivemos.
https://www.youtube.com/watch?v=4ewwv4R2hrs
Título Original: En Guerre
Diretor: Stéphane Brizé
Elenco: Vincent Lindon, Mélanie Rover, Jacques Borderie
Distribuição: Supo Mungam Films
Data de estreia: 10/10/2019
País: França
Gênero: Drama
Ano de produção: 2018