Ao Seu Lado
Crítica do filme
‘Encontro com Ditador’ está na mostra Panorama Mundial do Festival do Rio. O seu maior chamariz é ser a escolha do Camboja para representá-lo na próxima cerimônia do Oscar em 2025. Ele é uma adaptação do livro When The War Was Over: Cambodia And The Khmer Rouge Revolution (Quando a Guerra Acabou: Camboja e a Revolução do Khmer Vermelho), escrito por Elizabeth Becker. Ele também fez parte da Cannes Premiére 2024. Essa é uma história triste, pesada e que merece uma adaptação. Se dependesse de mim, pelo menos ele estaria na lista final das indicações a Melhor Filme de Língua Estrangeira no Oscar.
Kampuchea Democrático (atual Camboja), 1978. Três jornalistas franceses viajam a convite do Khmer Vermelho para uma entrevista exclusiva com o líder Pol Pot. Tudo parece tranquilo, mas, na verdade, o regime está em declínio e a guerra contra o Vietnã ameaça o país de uma invasão. Procurando culpados, o governo comete secretamente um genocídio e a bela imagem nacional acaba destruída perante os olhos dos jornalistas, revelando o horror.
Fui vê-lo sem saber do mínimo de base sobre como era o Camboja em 1978. Para isso, vou colocar um pequeno resumo aqui. Após sofrer com a Guerra do Vietnã, o Camboja resolveu fechar suas fronteiras em 1975 e com isso veio a ascensão do Khmer Vermelho, partido liderado por Pop Pot. Começaram uma reorganização sistemática da sociedade cambojana. Todos vão da cidade para o campo, onde realizam trabalhos forçados. Os intelectuais morreram assassinados e a tortura, terror e morte viraram rotina. No final, descobriram que mais de dois milhões de pessoas (um quarto da população) acabaram mortas, se tornando assim um dos maiores genocídios em que temos conhecimento.
É nesse cenário que conhecemos os nossos protagonistas: Alain Cariou (Grégoire Colin), um jornalista com um viés mais filosófico que estudou com o próprio Pol Pot na faculdade e que o considera amigo; Lise Delbo (Irène Jacob), uma mulher jornalista que conhece o país e inclusive quer encontrar amigos do passado; e Paul Thomas (Cyril Gueï), fotógrafo que foi com a intenção de registrar toda a verdade com a sua câmera. Quando chegam lá só encontram as coisas bonitas e maquiadas, o próprio “para o gringo ver”. É a partir daí que as coisas começam a ficar tensas.
Cada um dos personagens reage de uma forma: um quer viver conforme as regras e esperar para que Pol Pot queira dar a entrevista para eles, outro quer através de um jornalismo básico desmascarar a maquiagem, e outro quer encontrar a verdade não importa o custo. É lógico que se você é convidado de um lugar com uma ditadura como essa e começa a meter o bedelho onde não deve, as coisas começam a piorar. Nós, como público, começamos a sentir esse sentimento de claustrofobia. E quando a verdade começa a aparecer, é difícil manter o nosso estômago saudável. Embora não mostre muito, sabemos o que aconteceu por ali e o que está havendo. O pouco que mostra é o suficiente para sentir uma ojeriza de ideais que são distorcidos completamente da cerne da causa.
O personagem de Pol Pot aparece no longa, mas não a sua cara. Achei isso emblemático. Uma figura dessa tão controversa talvez não mereça isso. Vê-lo falando sobre seus ideais é tão absurdo que custa acreditar que alguém pensava assim. Dói no nosso âmago ver ideologias sendo distorcidas e vendo uma população inteira sofrer por causa de fanáticos. O personagem de Alain, que já foi amigo de Pol Pot, sente isso no peito e o seu desconforto é enorme. O seu final é cruel e nos dá uma sensação de impotência gigantesca.
Não há dúvidas que Encontro Com Ditador é uma grande obra presente no Festival do Rio. Sua história merece ser conhecida por todos. Um genocídio desse tamanho não pode ser apagado e merece estar na cabeça de todo mundo. Antes de terminar, queria dizer sobre os momentos em que os atores eram substituídos por boneco de madeira. Me causou uma estranheza inicial, mas no geral, acabou sendo algo novo que caiu bem por aqui.
O filme Encontro Com DItador fz parte da programação do Festival do Rio.
Por fim, não deixe de acompanhar o UltraCast, o podcast do Ultraverso que fala sobre Cultura Pop.
Irène Jacob
Grégoire Colin
Cyril GueÏ
Bun-Hok Lim
Leng Thirith
Somaline Mao
Título original: Rendez-vous Avec Pol Pot
Direção: Rithy Panh
Roteiro: Rithy Panh e Pierre Erwan Guillaume em cima do livro de Elizabeth Becker
Duração: 112 minutos
País: Camboja, França, Turquia, Taiwan, Catar
Gênero: drama
Ano: 2024
Classificação: 14 anos