‘Aves de Rapina’, uma história sobre empoderamento feminino e sororidade
Mayara Ferreira
A transformação da tela do cinema em uma história em quadrinhos é a referência para adentrarmos o mundo de Arlequina. Com uma fotografia exageradamente colorida, abusando de cores quentes, a montagem acelerada e a narração da protagonista, o longa cria a atmosfera fantástica e cartunesca de Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa.
O novo longa do universo de heróis da DC conta a história da independência da Dra. Harleen Quinzel após seu término com Coringa. Ademais, claro, aborda a formação das Aves de Rapina: Canário Negro, Caçadora e a policial Reneé Montoya.
A independência de Arlequina
Antes de mais nada, é preciso dizer que: sim, Aves de Rapina é um filme sobre empoderamento feminino. Não à toa seu subtítulo fala da “emancipação” de Arlequina, personagem conhecida nos quadrinhos como a namorada do Coringa.
Paradigma que já é quebrado no primeiro ato do longa quando ela “atualiza seu status de relacionamento”, como disse Montoya. Afinal, a personagem destrói a fábrica da Ace Chemicals, em Gotham City, lugar que foi o palco de um episódio bizarro entre ela e Coringa em Esquadrão Suicida.
Recapitulando: ela voluntariamente se jogou em uma banheira de ácidos, como uma prova de amor para o “Sr. C.”, para logo ser resgatada pelo vilão, acreditando que ele, de fato, se importava com ela.
Se no fiasco Esquadrão Suicida, a relação abusiva e louca dos dois personagens era romantizada, Arlequina e as Aves de Rapina vieram para encerrar de uma vez por todas a imagem da mulher frágil e dependente que nossa anti-heroína tinha, enquanto namorada do palhaço do crime.
Por trás de todo grande homem existe uma grande mulher?
Coisa nenhuma.
Aves de Rapina é uma história sobre a independência de Arlequina, que, como para todas nós, foi conquistada a duras penas.
A trama
Após declarar que havia se separado de Coringa, Arlequina passa a ser perseguida por todos os inimigos que conquistou durante sua vida no mundo do crime com ele. Sem a proteção do ex, ela estava fadada a enfrentar todos os seus fantasmas do passado. Incluindo o vilão Roman Sionis e a detetive Renee Montoya.
Somada a uma trama com um diamante que, além de revelar um segredo milionário, une as personagens Canário Negro e Caçadora a esse enredo, e pode tornar Sionis dono de Gotham City, temos o roteiro de Christina Rodson, também responsável por Bumblebee, da franquia Transformers.
Com um tom leve e por vezes infantil, a história do filme é convincente e consegue mandar seu recado. Apesar de contar com cenas “fantabulosas” demais. Como, por exemplo, a que Arlequina tira Cassandra Cain, a criança que possuía o diamante procurado, da delegacia depois de derrotar todos os policiais sem uma arma de fogo e lutar com vários presidiários em meio a uma sala inundada.
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Discurso acima da luta
Mesmo com o esforço em mostrar o empoderamento da personagem, as cenas de luta perdem em significado para os momentos em que nossa protagonista parece se empoderar através discurso.
“Eu sou pós-graduada, seu babaca”, diz Arlequina. Isso logo depois de quebrar as pernas de um homem que a humilhava.
O mesmo vale para as cenas em que vemos nossas outras protagonistas se levantarem contra situações opressoras. Montoya, por exemplo, precisa lidar com seu chefe ou Canário se posicionando contra as atitudes de Sionis.
Mas óbvio, que as cenas de luta corporal com homens também demonstram empoderamento e servem para atender ao público que, primeiramente, foi ao cinema assistir uma história de super-heróis.
Vale ressaltar que o humor também compõe boas surpresas no roteiro e proporciona aos espectadores mais uma identificação com o filme.
A narrativa de Harley, em primeira pessoa, e, por vezes, quebrando a quarta parede, também aproxima mais a plateia da história e convence, principalmente, no sentido de gerar identificação pessoal com a personagem, que, nesse caso, fala diretamente para as mulheres.
Protagonismo Feminino
Arlequina só era respeitada porque era a namorada de Coringa.
A detetive Montoya teve sua promoção roubada por um chefe homem.
A Canário Negro era constantemente submetida às vontades do vilão Sionis.
Por romperem com essas relações de submissão e mostrarem o poder das heroínas enquanto mulheres comuns, os arcos narrativos das personagens se tornam necessariamente histórias de emancipação.
Começando com Arlequina descobrindo como ela vai trilhar seu caminho depois do fim do relacionamento abusivo com Coringa. Além disso, passa pela aceitação das Aves de Rapina sobre seu compromisso na luta contra o crime em Gotham City.
Apesar do patriarcado marcar o filme todo, o protagonismo feminino de fato é um ponto essencial em Aves de Rapina. Assim, não foi pela terrível atuação de Jared Leto (que, aliás, eu considero um ótimo cantor) em Esquadrão Suicida que o Coringa não apareceu no filme. O personagem é resumido a mera lembrança quando focamos na história de Arlequina.
Mesmo o vilão excêntrico de Ian McGregor, que teve ótima atuação, não rouba os holofotes de Margot Robbie. Afinal, a atriz garantiu a exploração da personalidade de Harley Quinn de forma descontraída e cativante. A anti-heroína, que parece se divertir em todas as situações e consegue nos cativar, apesar do caráter duvidoso e do desequilíbrio mental, graças à atuação de Margot, demonstra total sintonia com a personagem desde de Esquadrão Suicida.
Roteiro com agenda femininista
A sororidade formada entre as personagens também é ponto de destaque num roteiro que atende a uma agenda feminista. Não que isso seja um problema. Afinal, não tem como falar de emancipação feminina sem adentrarmos o tema, certo?
Por ser um filme produzido, roteirizado e dirigido por mulheres, Aves de Rapina é uma herança positiva, que alcança um legítimo lugar de fala nos filmes de heroínas femininas e garante o engajamento do público com a franquia de Esquadrão Suicida, mesmo após o fracasso do seu primeiro lançamento.
Será que veremos novidades da Harley nos próximos anos?