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‘Cabul, Cidade no Vento’: quando a tragédia se torna cotidiana

Ana Rita

Documentários sobre guerras são, em sua maioria, obras fortes para se assistir, independente da existência ou não de cenas de violência e tragédia. Relatos fortes são capazes de construir obras impactantes, principalmente quando partem de um ponto de vista mais vulnerável. Sem o uso de cenas apelativas, o filme Cabul, Cidade no Vento (Kabul, City in the Wind), documentário dirigido por Aboozer Amini, consegue sensibilizar e mostrar a realidade de uma parte dos moradores da capital do Afeganistão.

Seguindo duas histórias paralelas, temos os relatos e cenas do cotidiano de Afshin e seu irmão mais novo Benjamin. Além disso, a trama ainda traz a saga de Abas no trabalho. Com a  cidade de Cabul sendo também um personagem, vamos conhecendo os impactos da guerra na cidade e na vida de cada um. De medos a sonhos, e como essa cidade se apresenta para nós e para seus habitantes.

Infância e guerra

No início do documentário Cabul, Cidade no Vento, já vemos as duas crianças no alto de uma montanha olhando para a cidade enquanto cantam uma música que parece ser infantil com o seguinte refrão: “Gatinho amarelo, fique em casa. Não vá para a guerra, você pode morrer”. Ver e ouvir crianças falando sobre os ataques de homens-bomba em Cabul de forma natural é chocante. Afshin perde parte da sua infância para ajudar em casa, tendo que trabalhar e cuidar dos irmãos enquanto o pai não está em casa.

Há pouco tempo, acontecera na cidade um atentado suicida que  resultou   na morte de pelo menos 80 pessoas. As duas crianças vão a um cemitério com o pai, que vai mostrando algum dos túmulos. Dentre eles, o de Reza, seu melhor amigo que se foi no ocorrido. Ele era um oficial da polícia que, após se machucar em um ataque suicida, pede demissão. O menino conta que o pai estava no acampamento 121 do exército de Kandar, e que todas as noites o Talibã atacava o acampamento. Em um dos ataques, apenas cinco dos 80 soldados sobreviveram. O pai de Afshin não estava presente porque passava 20 dias em casa na época.

A guerra e seus efeitos são facilmente notados enquanto a câmera acompanha os personagens pela cidade, como quando vemos crianças brincando em um antigo tanque de guerra. Em vários momentos, Benjamin e outras crianças cantam a canção do ‘gatinho amarelo’, deixando mais claro para  o espectador como a guerra e suas tragédias se tornaram cenas cotidianas para essas crianças.

É então perguntado a Afshin do que sente medo. Depois de um tempo encarando a câmera com um olhar sofrido, a criança diz que seu maior  receio são os ataques suicidas.

Leveza no meio do caos

Com Abas, um motorista de ônibus, acompanhamos sua saga para consertar seu instrumento de trabalho. Ele, que é pai e marido, é daquelas pessoas que precisa se virar para sobreviver, tentando arranjar dinheiro emprestado para pagar as contas e se manter de pé. 

Mesmo com tantos problemas, Abas se mostra alegre e feliz. Dentro de todo esse caos e essa guerra, consegue transparecer uma leveza, mesmo nos momentos sobre a guerra. Apesar disso, o homem mostra que nem tudo é pensamento positivo, apenas é o que precisa fazer, em meio a toda essa tristeza.

Banalização da tragédia

Como já dito, mesmo sem imagens da guerra ou cenas explícitas, os relatos e as falas de homens e, principalmente, de crianças sobre os ataques desses grupos extremistas e terroristas de forma natural e comum impactam e até perturbam o espectador.

Afinal, é triste ver como esses conflitos afetam a região. A realidade dessas crianças é a guerra, tragédias se tornam banais, sendo inclusive presentes em brincadeiras, como a das pedras e nas canções infantis.

Em um determinado momento, vemos um homem em um restaurante falando que as pessoas se tornaram animais selvagens com explosões de bombas todos os dias, com 200 ou 500 vítimas. Aquelas fatalidades se tornaram algo muito normal para eles. E isso se torna comum no próprio documentário Cabul, Cidade no Vento, com casos de ataques de homens-bomba sendo relatados com: ‘mais um ataque suicida’.

Cidade cinza

Com construções cinzas em pedras e ruínas, o resultado desses conflitos se tornam os mais concretos possíveis. Há um enorme contraste de paisagem e cidade, com um céu cinza e coberto pela neblina da poeira. Em diversos momentos, com um enquadramento mais contemplativo, é notória uma certa insignificância do homem perante aquela terra, aquela grande cidade sofrida por essa guerra.

Em conversas mais diretas com a câmera sobre sonhos e medos, percebemos a falta de esperanças e de perspectivas do futuro dessa gente. Cabul, Cidade no Vento é um duro e excelente documentário sobre os efeitos dos ataques em Cabul sob a fala e visão de quem vive aquela triste realidade.

Onde assistir ao filme Cabul, Cidade no Vento?

A saber, o filme Cabul, Cidade no Vento, novo documentário, está disponível para assinantes da Supo Mungam Plus desde sexta-feira, 8 de outubro de 2021.

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Trailer de Cabul, Cidade no Vento, da Supo Mungam Plus

Ficha Técnica

Título original do filme: Kabul, City in the Wind
Direção:
Aboozar Amini
País: Afeganistão, Alemanha, Holanda e Japão
Duração: 90 minutos
Gênero: documentário
Ano de produção: 2018
Classificação: 14 anos

Ana Rita

Piauiense, nordestina e estudante de Arquitetura, querendo ser cinéfila, metida a crítica e apaixonada por cinema, séries, arte e música. Siga @trucagem no Instagram!
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