CRÍTICA | ‘A Grande Dama do Cinema’

Alvaro Tallarico

Três idosos e uma dama dançando na metalinguagem.

A Grande Dama do Cinema (El Cuento de las Comadrejas) começa com imagens em preto e branco. Filmes antigos que vão passando um por um, cartazes de outros tempos e a face melancólica de Mara Ordaz (Graciela Borges). Neste instante, vemos toda a nostalgia estampada no rosto da atriz. O sentimento está ali, saltando. A vaidade, a lembrança dos prêmios de outrora. A dor de não ser mais quem era. E é devido a essa nostalgia que Mara poderá cair na armadilha dos vilões inescrupulosos, Bárbara Otamendi (Clara Lago) e Francisco Gourmand (Nicolas Francella), os quais querem manipular suas fraquezas para vender seu terreno. Porém, não tem noção de quem enfrentarão nesta teia de aranha com cara de jogo de xadrez e cheio de sinuca de bico.

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A direção de Juan José Campanella não decepciona – o que já era esperado. O cara dirigiu nada mais, nada menos do que o ótimo O Segredo de seus Olhos (que teve um remake de Hollywood intitulado de Olhos da Justiça) e o belíssimo O Mesmo Amor, A Mesma Chuva. Clássicos do cinema e símbolos da cinematografia argentina.

A Grande Dama do Cinema passa por sentimentos diversos, principalmente aqueles ligados à nona arte. Como a vaidade de atores, diretores e roteiristas. O sarcasmo e a ironia permeiam as relações entre os protagonistas. Vivem uma vida tranquila entre piadas e alfinetadas. Tudo é trabalhado majoritariamente com cinco personagens e praticamente em um único local, a enorme casa onde vivem os três anciãos e a senhora.

Há momentos sublimes como a fala do diretor Norberto Imbert (Oscar Martinez) para Pedro de Cordova (Luis Brandoni) explicando porque foi preterido no passado. Uma justificativa sincera e bonita, mas dolorosa. Ou quando o mesmo Pedro se declara para Mara. Seus olhos dizem mais do que as palavras várias vezes durante a película, é tocante. Uma parceria antiga, um amor de muitos anos, desgastado por algumas suspeitas e balançado pela chegada dos vilões. Em verdade, é difícil não elogiar todo o elenco. Grandes atores argentinos juntos dirigidos por um talentoso diretor. Teria como dar errado? Olha, até teria. Contudo, para nossa satisfação, não é o caso. Estão afiados, graciosos, cômicos. Vão do drama ao romance, do terror até a comédia; sendo esta última aquela que sobressai. Marcos Mundstock completa o elenco fazendo Martin Saravia, um roteirista que destila veneno o tempo todo.

Foto: Fênix Filmes / Divulgação

O filme é uma homenagem ao cinema. É pura metalinguagem do início ao fim. Os personagens brincam com a “realidade” o tempo inteiro, sempre com inteligência, enquanto suas mágoas e frustrações vem à tona. “Aquele papel era meu”.

O timing e o time estão alinhados em A Grande Dama do Cinema, são bizarros e perversos. Mordazes jogadores que não querem perder seu modo de vida e a estranha amizade de dinâmica tão particular e cruel, cujos valores podem ser distorcidos dependendo da situação. Criaturas tão encantadoras como ferozes, sedutoramente temíveis. Tudo bem elaborado, sutil muitas vezes, com elegância, alguma inocência (ou muita culpa?) e bom humor. Uma batalha geracional que se desenrola, idosos contra a modernidade e jovens ambiciosos que acham que sabem de tudo. Cinismo descreve bem a levada do longa.

::: TRAILER

::: FICHA TÉCNICA

Título original: El Cuento de las Comadrejas
Direção: Juan José Campanella
Elenco: Graciela Borges, Oscar Martinez, Luis Brandoni
Distribuição: Fênix Filmes
Data de estreia: qui, 16/05/19
País: Argentina, Espanha
Gênero: comédia dramática
Ano de produção: 2019
Classificação: a definir

Alvaro Tallarico

Jornalista vivente andante (não necessariamente nessa ordem), cidadão do mundo, pacifista, divulgador da arte como expressão da busca pela reflexão e transcendência humana. @viventeandante
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