Abaixo a Gravidade

CRÍTICA | ‘Abaixo a Gravidade’

Karinna Adad

Abaixo a Gravidade é rico em referências, mas confuso e cansativo na forma de narrar. O filme mistura uma Bahia real e, diga-se de passagem, dolorosamente real, com uma próxima da surrealidade. E nesse ponto é interessante notar que muitas vezes a realidade, de tão absurda, parece fantasia. Contudo, quando nos damos conta de que vivemos em um dos países mais desiguais do mundo a estranheza dá lugar ao senso comum. Um desses momentos que salpicam o filme com preciosidades é certamente a cena em que estamos num apartamento todo envidraçado e luxuosamente decorado com vista para uma enorme favela. Impressiona e choca.

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Paradoxos

Esse, aliás, é um dos muitos paradoxos presentes e que ajudam a pensar em Salvador como uma cidade única. Para o bem e para o mal. E é exatamente para lá que o vivido Bené (Everaldo Pontes) vai abandonando sua vida tranquila no interior em busca de tratamento médico. A troca de um ambiente marcado pelo contato direto com a natureza por um artificial e violento, ainda que algumas vezes, acolhedor, ocorre também por causa de Letícia (Rita Carelli). A moça, após dar à luz e ficar um tempo na casa de Bené, resolve voltar para sua cidade natal sendo acompanhada por ele.

A partir da chegada de Letícia, a vida de Bené passa a ter um novo sentido e um novo colorido. Isso se concretiza nos passeios pela capital, no encontro com os antigos amigos, nas conversas com o morador de rua Galego (e aqui vai um destaque merecido para a belíssima atuação de Ramon Vane), na busca por amor e na concretude do sexo. Todo esse colorido meio extravagante, meio surreal, só podia estar na Bahia. Ainda mais quando é para ela que se aproxima um asteroide chamado Laetitia, o qual promete causar a perda momentânea de gravidade e, poderíamos dizer, de preconceitos.

Contrastes

Enfim, seja por causa da perda de gravidade ou não, a verdade é que a vida em um grande centro urbano, no caso aqui personificado em Salvador, é marcada por idiossincrasias que colocam em xeque esse tipo de escolha. O mesmo tipo de lugar que permite experienciar um dinamismo. E até mesmo uma dose de incerteza exige que se conviva com a desigualdade, a pobreza, a violência, o preconceito, o “suprassumo da escrotecência”. Em suma, Abaixo a Gravidade nos lembra que vivemos em constante tensão entre o bom e o mau, bem como o certo e o errado, o puro e o impuro, o bonito e o feio, o real e o surreal. Por fim, a cidade é só um dos lugares possíveis para se estar em contato com esses contrastes.

::: TRAILER

::: FICHA TÉCNICA

Título original: Abaixo a Gravidade
Direção: Edgar Navarro
Elenco: Everaldo Pontes, Rita Carelli, Bertrand Duarte
Distribuição: Fênix Filmes
Data de estreia: qui, 01/08/19
País: Brasil
Gênero: drama
Ano de produção: 2019
Duração: 109 minutos
Classificação: 16 anos

Karinna Adad

Tranquila, mas multitarefada. Sou daquele tipo de pessoa que sempre está fazendo alguma coisa e descobrindo outras tantas pelo caminho. Topo qualquer parada desde que tenha prazer nela e uma das que por mais tempo vem me enchendo de alegria é a escrita. E como boa leitora consigo escrever sobre quase qualquer coisa, por mais que, como uma cientista social em formação, não consiga deixar de fazer agir meu raio problematizador nos meus textos.
NAN