CRÍTICA | ‘Borrasca’
Karinna Adad
Em meio ao que parecia ser uma tempestade, os amigos Gabriel (Mario Bortolotto) e Diego (Francisco Eldo Mendes) conversam sobre vários aspectos da vida que inevitavelmente culminam em um ponto em comum: Enzo. E, nesse sentido, o amigo é a própria Borrasca, que, se observada de perto, mostra a verdadeira aparência: uma chuva tranquila e duradoura.
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Enzo é o amigo ausente, porque está morto, porém presente em todo o diálogo. Quando Diego retorna do velório para o qual Gabriel não compareceu, os dois começam a conversar sobre o falecido e relembram fatos antigos e recentes. A conversa que inicialmente é recebida com irritação por Gabriel se desenrola para divagações sobre a vida e de como ela é moldada por situações inesperadas.
Dentre o fato doloroso que fez com que Gabriel não fosse ao enterro, os amigos restantes riem e choram, concordam e discordam quando relembram de Enzo. Em alguma medida, Gabriel e Diego encontra-se naquele momento porque ambos precisam de consolo. Enquanto aquele tem em Diego um incentivo para superar a perda da esposa através de verdades nem sempre fáceis de ouvir, este conta com Gabriel para consolar a perda do amigo querido.
Nessa troca entre os dois, Diego procura despertar em Gabriel uma empatia pelo falecido perdida no momento em a esposa do segundo o trocou pelo terceiro. O desenrolar da conversa mostra que por mais que haja uma pitada de amargura da parte do traído, algo pronunciadamente negado pelo personagem quando afirma que não é amargurado, ela não é maior do que o afeto por Enzo. Desse modo somos cada vez mais convencidos de que não há decepção suficientemente grande que sobrepuja o poder de uma amizade verdadeira. E isso pode ser pensado tanto em relação a Enzo quanto a Diego.
Em uma sequência de cenas que ocorrem em uma única locação, isto é, a casa de Gabriel, o diretor Francisco Garcia não se priva de levar toda a teatralidade da peça que dá origem ao filme Borrasca para a tela. No entanto, o que poderia ser um diferencial e uma grata surpresa acaba surtindo um efeito negativo. Por conta da atuação teatral, que se não é bem conduzida quando transposta para o cinema torna os personagens superficiais, o cineasta acaba entregando ao espectador um longa cansativo e artificial.
Por mais que o diretor tente superar essa artificialidade com o uso de palavrões na conversa entre os amigos e, assim, mostre a intimidade existente entre os dois, a empreitada se revela mal sucedida quando nos mesmo diálogos, marcados por temas tão íntimos como traição, uso de drogas, problemas familiares, Gabriel e Diego empregam uma linguagem culta em alguns momentos totalmente desconectada de uma situação tão cotidiana e banal quanto um papo entre amigos.
Outro ponto que não contribui para a película é a atuação pouco convincente dos autores. Ainda que Mario Bortolotto, intérprete de Gabriel e escritor da peça, consiga chamar um pouco de atenção pela desenvoltura, seu colega de cena Francisco Eldo Mendes não o acompanha, tornando a interpretação ainda mais forçada. Por fim, fica o insatisfação diante de um filme que tinha potencial para desenvolver e aprofundar temas complexos e dramáticos, mas que resolve tratá-los de modo superficial e enfadonho.
::: TRAILER
https://www.youtube.com/watch?v=RedhI0cBdro
::: FICHA TÉCNICA
Título original: Borrasca
Direção: Francisco Garcia
Elenco: Mário Bortolotto, Eldo Mendes
Distribuição: Fênix Filmes
Data de estreia: qui, 02/05/19
País: Brasil
Gênero: drama
Ano de produção: 2017
Duração: 75 minutos
Classificação: 14 anos