Crítica de Filme | Boi Néon

Bruno Giacobbo

Em sua estreia como diretor de ficção, o documentarista pernambucano Gabriel Mascaro retratou com uma simplicidade desconcertante o dia a dia de uma comunidade litorânea nas Alagoas. Seu filme suscitou todo tipo de reação, de defesas apaixonadas a criticas virulentas, e um dos aspectos mais discutidos foi o fato dele não ter utilizado atores de verdade. A única exceção era a protagonista Dandara de Morais. Assim, talvez, o normal seria imaginar que, em seu segundo trabalho nesta nova fase da carreira, ele fosse tentar algo completamente diferente. Quase. O elenco de Boi Néon, longa-metragem vencedor da mostra Horizontes, na 72ª edição do Festival de Veneza, é formado, em sua maioria, por profissionais, contudo, as lentes do diretor continuam voltadas para o que há de mais simples no cotidiano.

A Vaquejada é uma das festas mais populares do Nordeste do Brasil. No entanto, quem vai a uma apenas como espectador, não imagina como é a vida de quem atua longe dos holofotes. Desprovidos do glamour de vaqueiros e bois, as estrelas do espetáculo, homens e mulheres como Iremar (Juliano Cazarré) e Galega (Maeve Jinkings) trabalham de sol a sol, quase sem tempo de realizar seus sonhos. O dele, por exemplo, é criar roupas elegantes. Contrariando o estereótipo dos peões que cuidam do gado, entre uma pausa e outra no trabalho, ele improvisa com panos e restos de manequins as coleções que um dia, quem sabe, apresentará ao mundo. Já o dela é conseguir dar um pouco mais de conforto para a filha Cacá (Aline Santana) e encontrar alguém que repare na feminilidade que, com esmero, ela cultiva por trás da fachada de caminhoneira.

Engraçado, lúdico, mas acima de tudo humano por retratar seus personagens da maneira mais natural possível e distante das amarras dos estereótipos, Boi Néon é a confirmação do talento de seu diretor como autor de obras de ficção, uma vez que também ele assina o roteiro. Com uma direção de atores segura, fato comprovado logo na primeira obra ao extrair o máximo de um elenco de não-atores, Mascaro desponta como um dos melhores cineastas da nova geração. Um nome a ser seguido e olhado de perto, assim como ele faz com tudo que o Nordeste tem a oferecer.

Desliguem os celulares e ótima diversão.

(Filme assistido no 17º Festival Internacional de Cinema do Rio de Janeiro).

FICHA TÉCNICA:
Direção e roteiro: Gabriel Mascaro.
Produção: Rachel Ellis, Sandino Saravia e Marleen Slot.
Elenco: Juliano Cazarré, Maeve Jinkings, Aline Santana, Carlos Pessoa, Vinicius de Oliveira, Josinaldo Alves e Samya de Lavor.
Diretor de Fotografia: Diego Garcia.
Montagem: Fernando Epstein e Eduardo Serrano.
Diretora de Arte: Maíra Mesquita.
Figurino: Flora Rebollo.
Som Direto: Fabian Oliver.
Trilha Sonora: Otávio Santos, Cláudio N. e Carlos Montenegro.
Edição e Design de Som: Mauricio d’Orey.
Mixagem: Vincent Sinceretti.
Duração: 101 minutos
País: Brasil, Uruguai e Holanda.
Ano: 2015.

Bruno Giacobbo

Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
NAN