Crítica de Filme | Colegas
Colaboração
*** Colaboração de Danielle Lima ***
Com um par de ingressos na mão, assisti ao filme Colegas em uma sessão Hour-Concours no Festival de Cinema do Rio, em setembro do ano passado. Ficamos, eu e uma amiga da época no colégio, no segundo andar do Odeon, um dos raros cinemas de rua que ainda resistem a lógica de salas megas nos shoppings, para ver antes do lançamento comercial o melhor longa eleito na 40ª edição do Festival de Gramado.
Dias antes, eu já havia conversado com o diretor Marcelo Galvão, que também assina o roteiro, e com os três protagonistas para a Vitória, uma revista voltada para pessoas com deficiência para a qual tenho o prazer de escrever. Quando o filme terminou, com os olhos marejados, me dei conta de que, mesmo estando brifada pelos principais atores desta produção, sabia bem pouco além da sinopse.
A obra foi feita em homenagem a um tio do Marcelo que teve Síndrome de Down. Ok, isso é um plus. Outro diferencial do meu parco aprendizado foi saber eu Colegas é o modo como os downianos se chamam entre si. Não saber mais não era uma incompetência minha, mas tem uma lista de coisas que não basta “ouvir dizer que”; elas têm de ser vividas.
Começo meu check list por um item que independe da história: a fotografia de Colegas estava impecável. A maior parte das cenas externas do filme foi gravada em Paulínia, cidade do interior de São Paulo, de onde ouvi dizer que – olha aí o tal “ouvir…que” – era feia. Louvores ao produtor fotográfico que captou ângulos tão perfeitos mostrando campos floridos, estradas com trechos bem acabados, lojinhas típicas e por aí vai.
Márcio (Breno Viola), Aninha (Rita Pokk) e Stalone (Ariel Goldenberg) vivem em um orfanato para pessoas com Síndrome de Down. Stallone quer ver o mar, Aninha precisa se casar no dia de São Judas Tadeu e Márcio deseja voar. Desde a infância cada um deles tentava realizá-los a seu modo até que perceberam que juntos seria muito mais fácil. É neste ponto da história que se destaca o segundo item da minha listinha: o filme evidentemente deixa de lado as questões sobre deficiência para falar de amor, cumplicidade, generosidade e coragem. Temas que ultrapassam as barreiras da deficiência.
Com humor e um toque de genuinidade – característica dos downianos – os protagonista vão de São Paulo até Buenos Aires (Argentina) cometendo vários delitos para comer, se vestir e realizar seus sonhos. Delitos esses que do lado de dentro dos murros do orfanato onde viveram toda a vida poderiam ser considerados travessuras.
Chegando para ticar o item ‘humor’, dá para fragmentá-lo em três tipos. O primeiro vem pelas frases de outros filmes, já que os protagonistas são aficionados por cinema – fato que se repete na vida real –, inseridas no contexto dos diálogos; nas tiradas do personagem de Breno Viola (Márcio) como, por exemplo, ao paquerar uma mulher sem deficiência numa festa de casamento, ouve dela “você não percebe que a gente é diferente” e ele responde “não tem problema, eu gosto de gorda”. Risada geral nas poltronas; e por último são os clichês vindos de outros personagens que formaram um mar de estereótipos: a repórter gostosona que só faz perguntas sensacionalistas, o policial indicado por alguém do governo que tem carro do ano [fora do padrão de salário]; os programas de TV com discussões rasas e por aí vai.
Neste ponto, o filme é bem fraco, mas acho que foi pensando para ser estereótipo mesmo. Para evidenciar como as pessoas com Síndrome de Down também são julgadas por seus estereótipos e, na vida real, são bem diferentes entre si e tão parecidas com a maioria.
BEM NA FITA: Fotografia, ousadia na escolha dos protagonistas.
QUEIMOU O FILME: Trilha sonora, excesso de clichês.
FICHA TÉCNICA:
Diretor: Marcelo Galvão
Elenco: Ariel Goldenberg, Rita Pokk, Breno Viola, Lima Duarte, Rui Unas, Deto Montenegro, Leonardo Miggiorin, Marco Luque, Juliana Didone, Christiano Cochrane, Alex Sander, Amélia Bittencourt, MarceloGalvão, Maytê Piragibe, Monaliza Marchi, Daniele Valente, Nill Marcondes, Pedro Urizzi, Roberto Birindelli, Elder Torres, Oswaldo Lot, Alexandre Tigano, Theo Werneck, Carlos Miola, Giulia de Souza Merigo, Simone Teider, Anna Ludmilla, Simone Teider
Produção: Marcelo Galvão, Marçal Souza
Roteiro: Marcelo Galvão, Ricardo Barreto
Fotografia: Rodrigo Tavares
Distribuidora: Europa Filmes
Estúdio: Gatacine
Classificação: 10 anos