Crítica de Filme | Mommy

Bruno Giacobbo

Desconhecido de boa parte do grande público brasileiro, o cineasta e ator canadense Xavier Dolan, de imberbes 25 anos, é considerado um dos novos gênios do cinema mundial. Um verdadeiro garoto prodígio. Além disto, assumidamente gay, é um militante das causas LGBT e seus filmes, de um jeito ou de outro, versam sobre esta temática. Estas poucas linhas que escrevi são um rótulo. Uma maneira simplificada de definir alguém e, como bem diz o senso comum, rótulos e simplificações são bastante perigosos.

Em Mommy, quinto filme do diretor, Steve (Antoine-Olivier Pilon) é um adolescente problemático, desajustado, que briga contra este rótulo. Ao ser expulso de um colégio interno por colocar fogo em uma cafeteira, tudo o que ele deseja é voltar para casa e provar que é um menino amoroso. Este amor é canalizado para a mãe, Diane (Anne Dorval), uma jornalista desempregada que, chamada para buscar o filho, não sabe como proceder. Ela precisa urgentemente de um emprego e não tem como deixá-lo sozinho.

A ajuda vem de onde Diane menos espera, de uma vizinha que também luta contra um rótulo. Kyla (Suzanne Clémment) é uma professora que diz ter tirado um ano sabático para cuidar do marido e da filha. Na verdade, ela sofre de uma gagueira crônica e não consegue pronunciar mais do que três ou quatro palavras seguidas. Logo, a realidade é que ela foi afastada do trabalho por ser considerada incapaz de dar aulas. Ao se envolver e se afeiçoar por este confuso núcleo familiar, Kyla toma para si a missão de cuidar da educação de Steve e provar que tem condições de trabalhar.

Ao dirigir, roteirizar, editar e produzir esta obra, Dolan derrubou um dos rótulos atribuídos a ele: o de que seus trabalhos versam sempre sobre assuntos LGBT. Há quem veja uma sutil insinuação entre as duas mulheres. Sinceramente, eu não vi. Há, sim, uma leve sugestão de incesto quando Steve rouba um beijo da mãe. No entanto, ela rapidamente repele este sentimento. Agora, a pecha da qual o cineasta não conseguiu se livrar é a de menino prodígio.

Mommy_meioO longa-metragem é esteticamente irrepreensível. O seu formato de exibição, durante a maior parte do tempo, é pouco usual e impactante. A tela quadrada serve a um propósito principal: aumentar a sensação de aperto vivida pelos personagens nas horas mais dramáticas da história. Além disto, como uma teleobjetiva, ela direciona o foco para a beleza da fotografia. Hipnotizado, o espectador acaba prestando atenção em todos os pequenos detalhes das cenas.

Ganhador do prêmio do júri no último Festival de Cannes e candidato canadense ao próximo Oscar, Mommy conta também com grandes atuações. Ainda que o destaque maior vá para a visceral interpretação de Pilon, jovem ator de apenas 17 anos que, em alguns momentos, devido as suas várias caras e bocas, lembra o ex-astro adolescente Macaulay Culkin (só que com um potencial latente muito maior), é preciso aplaudir de pé os desempenhos de Dorval e Clémment. Lados opostos da mesma moeda, yin e yang de Steve, são suas personagens que fazem a balança do protagonista pender para um lado ou para o outro na constante busca pelo equilíbrio pessoal.

Ainda sem estreia prevista para o Brasil, o filme de Dolan tem apenas um probleminha. Sua longa duração. Seus 139 minutos farão o expectador mais afeito ao cinema pipoca remexer na cadeira e se questionar se todos os chamados filmes de arte precisam ser cansativos. Não precisam e definitivamente não são. Contudo, este é mais um rótulo e como já se sabe…

Desliguem os celulares e boa diversão.

BEM NA FITA: A direção de Xavier Dolan e as magníficas atuações de Antoine-Olivier Pilon, Anne Dorval e Suzanne Clémment.

QUEIMOU O FILME: Os 139 minutos de duração.

FICHA TÉCNICA:

Direção, roteiro e edição: Xavier Dolan.
Produção: Xavier Dolan e Nancy Grant.
Elenco: Anne Dorval, Antoine-Olivier Pilon, Suzanne Clémment, Patrick Huard, Alexandre Lituac, Isabelle Nélisse, Pierre-Yves Cardinal, Viviane Pascal e Natalie Hamel-Roy.
Direção de Fotografia: André Turpin.
Gênero: Drama.
País: Canadá.
Duração: 139 Minutos.
Ano: 2014.

Bruno Giacobbo

Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
NAN