Crítica de Filme | O Senhor do Labirinto
Giselle Costa Rosa
Se fosse para falar só dos aspectos técnicos do filme O Senhor do Labirinto, a expressão mal produzido o definiria. Um tema tão controverso como a loucura, com todos os seus signos embutidos e toda a sua potencialidade expansiva, acabou sendo apenas um relato pouco estruturado da vida e obra de Arthur Bispo do Rosário (1909 – 1989), nascido em Sergipe e estabelecido no Rio de Janeiro.
Bispo ultrapassou sua condição de louco, transformando sua sentença em arte, sendo reconhecido como artista no Brasil e no Exterior por suas obras que constituíam bordados, assemblages, estandartes e objetos advindos de sucatas.
Vivendo até seus 80 anos, ele passou pela marinha, foi boxeador e seguiu fazendo um biscate ali outro aqui. Contava com a ajuda de seus semelhantes para sobreviver. Diagnosticado como esquizofrênico-paranoico, na véspera do Natal de 1938, Bispo foi guiado por imagens e vozes, apresentando-se ao Mosteiro de São Bento como um enviado de Deus; tinha a missão de julgar os vivos e os mortos e recriar o mundo para o Dia do Juízo Final.
Na colônia Juliano Moreira, onde foi internado, configurando-se como seu paradeiro final, recusava-se a tomar os remédios que reduziriam ou mesmo anulariam as manifestações delirantes e consequentes agitações motoras. Seguiu com sua obra, ou melhor, missão: recriar o mundo para o Dia do Juízo Final, o dia da passagem que o levaria ao encontro com a morte. Ele bordou, costurou, pregou e colou. Fez composições a partir da apropriação de objetos. Em meio à clausura, à violência e às condições de higiene precárias da instituição psiquiátrica, ele produziu, ao longo de 50 anos, inúmeras obras.
No filme podemos ver, em algumas passagens, que Bispo mantinha um contato nada superficial com a realidade, mesmo sem o uso das drogas prescritas. Nessa via, o ex-boxeador teve um importante aliado, o funcionário Wanderley (Irandhir Santos), cuja confiança conquistou em pouco tempo, tornando-se “xerife” local, ajudando-o na tarefa de deter os “rebeldes”.
Essa adaptação do livro homônimo, escrito por Luciana Hidalgo, de baixo orçamento, só não decepciona mais pela atuação dos atores principais: Flávio Bauraqui, como Bispo e Irandhir Santos como funcionário que dá suporte a ele. Ambos transbordam muita sensibilidade no papel. Do roteiro a enquadramentos perdidos, não vemos pulso na direção. Cortes um tanto grosseiros são desanimadores. A caracterização da passagem do tempo em Bispo é sofrível.
Que o filme sirva para trazer à tona uma discussão maior em torno da noção do que é ser normal, afinal, por que temos que pensar, sentir ou nos relacionar com a realidade da mesma forma?
BEM NA FITA: as atuações de Flávio Bauraqui e Irandhir Santos.
QUEIMOU O FILME: a produção inteira.
TRAILER:
FICHA TÉCNICA
NOME: O Senhor do Labirinto
PAÍS DE ORIGEM: Brasil
DURAÇÃO: 80 min
ANO: 2014
DIREÇÃO: Geraldo Motta
ROTEIRO: Geraldo Motta, Luciana Hidalgo
FOTOGRAFIA: Kátia Coelho
EDIÇÃO: Karen Akerman
MÚSICA: Egberto Gismonti
FIGURINO: Simone Aquino
DIREÇÃO DE ARTE: Sérgio Silveira
PRODUÇÃO: Monica Faria, Luiz Otero, Elisa Tolomelli
ELENCO: Flávio Bauraqui, Irandhir Santos, Maria Flor, Odilon Esteves, Eriberto Leão, Luiz Carlos Reis, Rodrigo Riszla, Edlo Mendes, José Carlos Ngão, Andrea Villela, Diane Velôso