Crítica de Filme | Sin City: Dama Fatal

Pedro Esteves

A péssima noticia para os fãs de Sin City é que o segundo filme não conseguiu ir além do primeiro e, ainda por cima, destruiu boa parte do que o primeiro fez muito bem. Neste, temos a apresentação de uma estética que: tanto era fiel aos quadrinhos, como introduzia novas possibilidades imagéticas. Ser uma adaptação fiel aos quadrinhos insere o filme em duas já existente e amplas discussões sobre os caminhos que Hollywood tem tomado para se reconstruir. Um dos caminhos são as adaptações de super-heróis e não iremos aqui entrar no mérito (mas é importante citar) se faz sentido criar um filme que é igual a como ele é em seu meio de origem. O que nos remete ao ponto subsequente, a utilização através dos efeitos especiais de um conceito imagético que não tenta emular uma imagem filmada em um ambiente “natural”. Pelo contrário. O que antes a fotografia fazia durante a produção nos filmes expressionistas e filmes noir, por exemplo, agora ela faz na pós sem medo de ousar. A imagem do primeiro Sin City, então, deixou suas questões e instigou muitos espectadores.

Talvez esteja neste poder, de certa forma questionador da utilização dos efeitos fotográficos, o vício que o diretor e roteirista Frank Miller e o diretor Robert Rodriguez não conseguiram superar. Não que o filme tivesse que ter outra estética, mas ela não tem como ser mais instigante do que foi e, como vemos nessa sequência, ela não sustenta a proposta fílmica dos diretores sozinha. O apreço pela imagem estilizada criada por eles é tão grande que diversos recursos já apresentados, como sangue branco, são explorados inúmeras vezes em cenas ou situações sem propósito: a cena acaba e nada foi construído para o sentido da produção. Parece que os diretores foram tomados por uma vontade fetichista com a sua criação, como que “bastando a nossa estética, o filme será fantástico”. Assim, o que temos na tela é uma série de criações fetichistas apoiada em uma auto-indulgência que só faz mal aos fãs.

Cores sem propósito algum

Cores sem propósito algum

Vamos olhar para a cor e o PB, por exemplo, marcas fortes na estética: no primeiro filme as cores seguiam uma motivação, ou aparentavam isso, nada parecia estar colorido por um acaso, por puro desejo; em Sin City: Dama Fatal, as cores parecem que foram colocadas em modo aleatório, qualquer coisa pode ser colorida por qualquer motivo. Eva Green aparece em um sobretudo azul, magnífico, mas por que o azul? Por que no sobretudo? Pior: a mulher que vira “amuleto” da sorte, no segmento de Joseph Gordon-Levitt, está colorida por quê? Ela sequer representa algo real para a cena. Cenas acontecem só para apresentarem a “beleza” das imagens, puro fetiche.

O nível dessa relação mística com a imagem é tão grande que a película parece ter somente uma história a ser desenvolvida: a de Eva Green e Josh Brolin. As demais estão lá para fazer o filme ser vendido como um longa. Explico: a história de Jessica Alba e Bruce Willis é a continuação de uma das histórias do original, que mal se desenvolve aqui e chega a uma solução quase piegas para (spoiler alert) criar um “final feliz”, “justo”, etc da história, destruindo assim o pecado da cidade do pecado (SIN City) (fim do spoiler); a narrativa de Joseph Gordon-Levitt sequer faz sentido para a produção, ela chega à sua conclusão e não contribui com nada, é uma enorme perda de tempo (ok, tem uma moral, já batida e sem propósito no filme, que não conto para não “estragar”). Sendo assim, me recuso a discutir mais esses adendos inúteis à única boa trama do filme – para justificar minha visão, basta dizer que passamos boa parte dos 102 minutos do filme com a Eva Green e Josh Brolin, as outras histórias aparecem ocasionalmente, quase as esquecemos.

História entre Jessica Alba Bruce Willis mal se desenvolve

História entre Jessica Alba Bruce Willis mal se desenvolve

Olhando para a trama que importa, podemos fazer algumas reflexões interessantes. Uma delas é que a Eva Green deve ser a atriz francesa fetiche dos produtores Hollywoodianos: bonita, com fartos seios e sem nenhuma vergonha de apresentá-los e de fazer cenas de sexo – como podemos ver em seu primeiro e melhor filme, diga-se de passagem, “Os Sonhadores” (2003, Bernardo Bertolucci), que a levou a Hollywood e a TV estadunidense em um salto, onde além das boas atuações exibe seu corpo em cenas de sexo em diversas produções (300: A Ascensão do Império, Sentidos do Amor, Camelot, Penny Dreadful). Por que estou levantado essa questão? Por puro deleite? Não. Apresento-a porque conseguiram fazer uma história em que ela aparece a “maior parte” do tempo nua e, com os efeitos visuais, mais deslumbrante que o normal. Talvez por isso e por não terem muito que contar, esse é o segmento maior e que dá nome ao filme.

Contudo, seria injusto não dizer que a trama de Sin City: Dama Fatal é minimamente interessante. Nada de novo, mas um bom filme noir. As atuações secundárias (diante do poder de Eva, são todas assim) são, em geral, boas, com Josh Brolin e Mickey Rourke fazendo bem seus papeis. Já o ator de séries Christopher Meloni, que atua como polical, varia do canastrão ao psicopata, em uma atuação inconstante. A propósito, o personagem do primeiro, Dwight, que é o que seguimos durante a trama, passa por questões existenciais, lutando para não voltar ao seu passado cruel e viu, chegando a parecer que vai se transformar no Hulk, mas no fim ele não é lá grandes coisas (uma enorme decepção).

Resumo: quer ver Sin City: A Dama Fatal? Esqueça, assista apenas ao primeiro filme. Quer ver a beleza de Eva Green potencializada pelos efeitos visuais? Espere chegar na sua TV.

BEM NA FITA: Eva Green e uma história interessante.

QUEIMOU O FILME: Fetichismo com a estética do filme, histórias desnecessárias e chatas.

FICHA TÉCNICA:

Nome original: Sin City: A Dame to Kill For
Gênero: Ação
Direção: Frank Miller, Robert Rodriguez
Roteiro: Frank Miller, Robert Rodriguez, William Monahan
Elenco: Alexa Vega, Clive Owen, Dennis Haysbert, Jaime King, Jamie Chung, Jessica Alba, Michael Madsen, Mickey Rourke, Rosario Dawson
Produção: Aaron Kaufman, Robert Rodriguez, Sergei Bespalov, Stephen L’Heureux
Fotografia: Robert Rodriguez
Trilha Sonora: Robert Rodriguez
Ano: 2013
País: Estados Unidos
Cor: Colorido
Estreia: 25/09/2014 (Brasil)
Estúdio: Aldamisa Entertainment / AR Films U.S / Miramax Films / Quick Draw Productions / Solipsist Film / Troublemaker Studios
Distribuidora: Imagem Filmes
Informação complementar: Baseado na graphic novel de Frank Miller

Pedro Esteves

Cineasta, fotógrafo, pedagogo e enoconsultor. É curioso por natureza, chato por opção e otimista por realismo. Midiaeducador no ensino formal, expõe seus trabalhos artísticos em facebook.com/estevesarte e presta consultoria em vinhos a partir de www.primusvinho.com.br .
NAN