crítica do filme Aranha

‘Aranha’ é brilhantemente assustador

Wilson Spiler

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18 de setembro de 2021

1973. Golpe militar no Chile. Salvador Allende, o primeiro socialista marxista a ser eleito democraticamente como presidente de república e chefe de Estado na América, é deposto do poder pelo ditador Augusto Pinochet. As forças armadas, no entanto, não agiram sozinhas. Afinal, contaram com a ajuda de um grupo de extrema-direita chamado Patria y Liberdad, responsável por diversos atos terroristas. O movimento se tornou um dos principais apoiadores do Golpe de Estado no país, mas foi dissolvido três dias depois do general assumir o poder pelos próprios membros.

Conhecido pelo seu cinema altamente político, o chileno Andrés Wood (Machuca, Violeta foi para o Céu) volta sua câmera, no filme Aranha (Araña), a esse momento marcante e delicado da história chilena. Representante do Chile no Oscar de 2020 e indicado ao Goya como Melhor Filme Ibero-americano, o título do longa faz uma alusão ao símbolo do grupo Patria y Liberdad, que existiu entre 1970 e 1973.

Sinopse do filme Aranha

No centro do filme Aranha estão três personagens em dois momentos diferentes de suas vidas. Inés (interpretada por Mercedes Moran e María Valverde); Gerardo (Marcelo Alonzo e Pedro Fontaine); e Justo (Gabriel Urzúa e Felipe Armas) que, na juventude, pertenceram ao Patria y Liberdad. No meio do conflito com a esquerda, o trio acaba se envolvendo amorosamente, enquanto participa da luta armada contra o presidente marxista. No entanto, um crime político cometido pelo grupo muda o destino do Chile e acaba separando o trio.

Quatro décadas mais tarde, quando ele reaparece, Inés e Justo, agora casados, vivem uma vida burguesa repleta de luxo e dinheiro. Gerardo, no entanto, ainda é obcecado pelas causas do passado. Ele quer, não apenas vingança, mas também trazer o ultranacionalismo novamente à tona. Contudo, quando é preso, em sua casa, com um grande arsenal de armas e munição, Inés, agora uma poderosa empresária, fará de tudo para que o passado não destrua sua vida e sua família.

O mesmo discurso

O filme Aranha remete a um período nefasto da história do Chile, quando grupos fascistas (é essa a denominação correta) criaram um verdadeiro caos com a mentira de que o país se tornaria comunista, uma nova Cuba. Dessa forma, o povo passaria fome e estaria morando em casebres, com todo a renda controlada pelo Estado. Exatamente o mesmo motivo levou João Goulart a ser deposto do poder pelos militares aqui no Brasil.

O que torna Aranha um filme tão assustador é que esse discurso voltou a ressoar cada vez mais forte não só no Brasil, mas como em vários lugares do mundo. Por isso, vários líderes populistas de extrema-direita têm sido eleitos ao redor do planeta. Como foram os casos de Donald Trump, nos Estados Unidos, e Jair Bolsonaro, por aqui, por exemplo. Aliás, quase aconteceu também com a França em 2012, com Marine Le Pen.

Aranha crítica do filme

Ideologia viva

Com uma montagem extremamente bem-feita, alternando entre passado e presente, e uma direção sublime, Aranha é um filme quase documental. Embora os personagens sejam fictícios, o retrato do que aconteceu e o futuro pelo qual estamos caminhando é de dar calafrios. O final da obra funciona como uma previsão de onde isso pode parar. Isso porque ondas conservadoras continuam crescendo fortemente utilizando o patriotismo, a família, a descrença na política e a fé como pano de fundo de um plano verdadeiramente fascista. Certamente vale lembrar que Hitler utilizou esse mesmo discurso para cometer suas atrocidades.

Aliás, tivemos um retrato disso no último dia 7 de setembro. Além disso, dois dias depois houve a “retratação” humilhante de Bolsonaro no já histórico documento “Declaração À Nação”, encabeçado pelo ex-presidente Michel Temer, um dos principais responsáveis por articular o impeachment de Dilma Rousseff, integrante de um partido com viés socialista. Coincidências? A última linha do texto escrito pelo atual governante do país deixa claro que não.

Afinal, “DEUS, PÁTRIA, FAMÍLIA” era simplesmente o lema do grupo Ação Integralista Brasileira. Um movimento político brasileiro ultranacionalista, corporativista, conservador e tradicionalista católico de extrema-direita, inspirado no fascismo italiano, no integralismo lusitano e baseado na Doutrina Social da Igreja Católica, fundado em 1932 pelo escritor e jornalista brasileiro Plínio Salgado. Portanto, as portas da barbárie já estão abertas. Só depende de nós alterarmos esse rumo.

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Trailer do filme Aranha

Aranha: elenco do filme

Mercedes Moran
María Valverde
Marcelo Alonzo
Pedro Fontaine
Caio Blat
Gabriel Urzúa
Felipe Armas

Ficha Técnica

Título original do filme: Araña
Direção: Andrés Wood
Roteiro: Andrés Wood, Guillermo Calderón
Distribuição: Pandora Filmes
Data de estreia: qui, 23/09/21
Onde assistir ao filme ‘Aranha’: nos cinemas
País: Chile, Brasil, Argentina
Gênero: drama, suspense
Duração: 109 minutos
Ano de produção: 2019
Classificação: a definir

Wilson Spiler

Will, para os íntimos, é jornalista, fotógrafo (ou ao menos pensa que é) e brinca na seara do marketing. Diz que toca guitarra, mas sabe mesmo é levar um Legião Urbana no violão. Gosta de filmes “cult”, mas não dispensa um bom blockbuster de super-heróis. Finge que não é nerd.. só finge… Resumindo: um charlatão.
10
Créditos Galáticos

Créditos Galáticos: 10

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