CRÍTICA | ‘Elis’ tem ótimos momentos, mas falta ousadia e acaba resumido a uma boa aula de MPB

Wilson Spiler

“Não quero lhe falar meu grande amor
De coisas que aprendi nos discos
Quero lhe contar como eu vivi
E tudo o que aconteceu comigo
Viver é melhor que sonhar
E eu sei que o amor é uma coisa boa
Mas também sei
Que qualquer canto é menor do que a vida
De qualquer pessoa…”

“Como Nossos Pais”, composta por Belchior, mas brilhantemente interpretada por Elis Regina, mostra o quão intensa era a vida da cantora. A letra da música que abre a cinebiografia dela é um breve retrato da energia e do brilho que a artista emanava sobre seu público. A escolha dessa canção para os minutos inicias do longa também denotam um certo conforto do diretor Hugo Prata, que, com isso, tenta ganhar o público logo de cara com um dos maiores sucessos da “Pimentinha”.

Não, absolutamente não é isso que torna Elis aquém das expectativas. É bom destacar que também não estamos aqui tratando de um filme ruim, mas eu diria, frustrante. Sim, porque a maior cantora que tivemos por essas terras, envolta em tantas polêmicas, merecia uma obra mais aprofundada, com tratamento menos superficial do que vemos na telona.

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Elis Regina foi uma mulher forte, determinada. Diria até – com todo o clichê do mundo – que foi bem à frente de seu tempo. Essas características da cantora são até bem retratadas no longa, com uma atuação bem digna de Andreia Horta, mas o longa falha quando pende para o lado mais visceral da artista. OK, era preciso contar toda a sua carreira em cerca de duas horas de película, mas também era necessário encontrar soluções melhores para determinadas situações. Questões como a ditadura militar, a briga com Henfil, o problema de alcoolismo, além dos filhos e relacionamentos da gaúcha foram pouco aprofundadas, o que é uma pena.

No entanto, Elis tem seus bons momentos. Sobre as atuações, Andreia Horta, como dito anteriormente, faz um papel digno. Embora tenha certos exageros em sua interpretação, há trejeitos da artista que são bem cuidados pela atriz. É nítido seu esforço para representar bem a histórica intérprete brasileira. Mas os destaques entre os atores, para mim, fica com o elenco masculino: Gustavo MachadoLúcio Mauro Filho, Caco Ciocler e Júlio Andrade, que interpretam Ronaldo Boscôli, Miéle, César Camargo Mariano e Lennie Dale, respectivamente. Machado no papel de Boscôli, então, é para se aplaudir de pé. Toda a canastrice do compositor e produtor musical estava ali borbulhando na tela do cinema. Rodrigo Pandolfo (Nelson Motta) e Ícaro Silva (Jair Rodrigues) são apenas regulares.

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Na questão técnica, Elis é extremamente bem produzido. A cena em que a cantora é vigiada por soldados na ditadura e corre para ver como estava seu filho, por exemplo, é estupidamente bem realizada, deixando o o espectador à flor da pela de tanta tensão. A fotografia tem momentos belíssimos e a qualidade do som é acima da média para o cinema nacional, o que era mais do que a obrigação, já que trata-se de uma obra com temática musical.

No mais, Elis é um filme cheio de ótimas intenções, mas, infelizmente, resume-se a uma boa aula de MPB. Sem maiores polêmicas, a obra é para o público em geral que pretende apenas relembrar belas canções dessa incrível cantora.

TRAILER:

FICHA TÉCNICA:
Direção: Hugo Prata
Roteiro: Patrícia Andrade, Nelson Motta, Hugo Prata, Vera Egito, Luiz Bolognesi
Elenco: Andreia Horta, Gustavo Machado, Rodrigo Pandolfo, Caco Ciocler, Lúcio Mauro Filho
Distribuição: Downtown/Paris
Data de estreia: qui, 24/11/16
País: Brasil
Gênero: drama
Ano de produção: 2015
Classificação: a definir

Wilson Spiler

Will, para os íntimos, é jornalista, fotógrafo (ou ao menos pensa que é) e brinca na seara do marketing. Diz que toca guitarra, mas sabe mesmo é levar um Legião Urbana no violão. Gosta de filmes “cult”, mas não dispensa um bom blockbuster de super-heróis. Finge que não é nerd.. só finge… Resumindo: um charlatão.
NAN