CRÍTICA | ‘La Vanité’ levanta questões importantes por meio de um enredo simples
Bianca Moreira
O mais recente filme do diretor Lionel Baier, “Lá Vanité” se debruça sobre um assunto que apesar de ser a única certeza absoluta da existência humana ainda é objeto de muitas dúvidas, incertezas e medos. Essa que muitas vezes é um fenômeno que nos deixa atônitos e sem palavras: a morte.
O filme acontece, em sua maior parte, em um quarto de hotel. A trama é introduzida ao espectador gradativamente. Nos primeiros vinte minutos do filme não é possível chegar a uma conclusão concreta do que realmente se trata a história.
O personagem principal é um arquiteto idoso chamado David (Patrick Lapp) que decide colocar um ponto final em sua vida em um hotel que ele e sua esposa projetaram e construíram durante a juventude.
A entrada de David no hotel é a primeira cena do longa. A partir daí uma nova personagem é inserida, trata-se de Esperanza (Carmen Maura), uma espanhola membro de uma instituição que promove a eutanásia.
Lionel Baier usa três personagens para quebrar estereótipos e questionar valores que estão muito bem arraigados na cultura judaico cristã ocidental. David possui uma personalidade muito libertária, admitiu que nunca foi capaz de amar seu único filho e que o deixou sob os cuidados de um casal de amigos para viver sua vida nos EUA. Sem coragem de tirar a própria vida e com a justificativa de estar com uma doença grave – fato que é posto em xeque por Esperanza diversas vezes – e que não vê mais sentido em viver sem ter a companhia de sua falecida esposa, foi a procura de uma instituição para realizar seu desejo.
Esperanza é a antagonista de David. Com uma cultura assumidamente católica apoia a eutanásia somente em casos em que não há mais nenhuma chance de cura para a pessoa, conserva valores típicos de família tradicional e demostra-se claramente contra a algumas posições de David.
O terceiro personagem é um vizinho de quarto de David, Tréplev (Ivan Georgiev), um garoto de programa que se comprometeu a ser a testemunha da morte de David. Tréplev é um personagem que provoca e também quebra paradigmas, vive sua vida sexual de forma livre, se afirmar como bissexual e para a surpresa dos dois outros personagens, também possui uma esposa e dois filhos. Tréplev é um ponto de conflito em algumas partes da trama. Apesar de ter uma posição mais progressista em relação a sexualidade, possui alguns valores contraditórios em relação a eutanásia. No primeiro momento se apresenta contra a decisão de David e tenta persuadi-lo de desistir da ideia.
Um aspecto muito interessante do filme, é a transformação que os personagens – que a princípio não se conhecem- durante as poucas horas que permanecem juntos. Tréplev e Esperanza mudam sua concepção sobre o direito individual de escolher a morte e David acaba despertando curiosidade sobre experiências homossexuais.
Lionel Baier levanta questões importantíssimas com um enredo extremamente simples e até um pouco monótono. Discute a eutanásia e questões de sexualidade de forma natural e pouco óbvia. A morte é representada como uma parte da vida e não como uma negação da mesma. A morte, nesse caso, vem pôr em causa uma reflexão sobre o sentido da existência.
FICHA TÉCNICA