Miúda e o Guarda-Chuva

CRÍTICA | ‘Miúda e o Guarda-Chuva’

Alvaro Tallarico

Esteticamente estiloso e poético.

“Verde é uma cor que sobra”. São tiradas como essa e perspectivas diversas viajando entre fatalismo, poesia e existencialismo, que permeiam Miúda e o Guarda-Chuva, longa-metragem voltado para o público infantil, mas que bota muita formiga atrás da orelha dos adultos.

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A trama

Miúda (dublada por Luana Carrera) é uma menina míope e muito imaginativa. É inteligente e comunicativa, passando a maior parte do tempo cuidando de sua planta carnívora de estimação (Harildo Deda). Esta última vive com fome, recebendo muito amor e formigas fresquinhas e crocantes. Uma estranha relação de dependência

A pequena garota está prestes a completar 7 anos e deseja apenas que aquela planta falante lhe chame pelo seu nome verdadeiro. Com uma fome interminável, a plantinha exige cada vez mais formigas, o que vai fazendo a menina refletir.

Miúda e o Guarda-Chuva (1)

Por outro lado, as formigas, cansadas da situação de viver com medo de virar comida de planta, bolam um plano que envolve certa dose de poesia, uns guarda-chuvas e, talvez, quem sabe, uma máquina do tempo. A partir dessa louca história, a menina começa a desenvolver novas perspectivas para compreender o mundo em que vive e aprender que crescer é fazer escolhas. Em meio a tudo isso, ela conta com a companhia da amiga Inércia (Ariane Souza), hiperativa e divertida, com suas pernas de mola, e do personagem carteiro Seu Zé (Fábio Costa), responsável por alguns dos momentos mais cômicos da película, devido ao medo paralisante que tem da planta carnívora (a qual parece ter certo prazer sádico no fato). Ele vê com muito receio a relação de Miúda com a planta, parecendo perceber coisas que ninguém percebe, buscando avisar sobre algo perigoso implícito naquele ser.

Poesia pura

Miúda e o Guarda-Chuva, às vezes, parece confuso, mas é como poesia, precisa ser interpretado, visto de uma outra forma, ou, na palavra que surge tantas vezes: perspectiva. As formigas têm uma(s); a menina tem outra; a planta, mais uma. Alguns bordões são repetidos várias vezes, visando semear pequenas questões no público infantil. A dublagem é ótima e tem alguns toques de sotaque nordestino, fato este que confere ainda mais identidade ao longa. Brasilidade de alto nível.

O que salta e sobressai durante a exibição é que, acima de tudo, a poesia sempre encontra um meio, crescer é inevitável e é necessário cuidado com as caixas que abrimos. Voltar no tempo pode ser perigoso e você escolhe no que quer acreditar. Achou viagem? Assista ao filme. Além disso, aproveite toda a variação de cores e as reflexões que apresenta.

Miúda e o Guarda-Chuva (2)

Animação estilosa

Miúda e o Guarda-Chuva tem muito estilo, lembrando algumas animações europeias. A carismática dupla de formigas me remeteu um pouco a Pinky e Cérebro, só que mais filosóficos. A Formiga Azul é dublada afetuosamente por Daniel Calibam e a branca com eficiente pessimismo por Yoshi Aguiar. Pessoalmente, são os personagens que mais gostei, com sua dicotomia e divergência de opiniões. Amigos e trabalhadores querendo salvar a vida de seu povo de alguma forma enquanto dialogam sobre o significado da vida e seus infindáveis paradoxos. Ao mesmo tempo, vão juntando peças para resolver os problemas existenciais e o perigo de vida que enfrentam. De fato, a alegria pode estar em uma chuva de açúcar.

Interessante que a trajetória do filme começa em 2009, quando Miúda e Guarda-chuva ganhou os palcos baianos como espetáculo teatral. Em 2010, a obra ganhou um piloto de animação para TV, produzida pela Santo Forte, com desenhos de Igor Souza, bem como direção de Amadeu Alban e Jorge Alencar. O episódio-piloto da série foi contemplado em edital pelo ANIMATV e estreou no mesmo ano na TVs Cultura e Brasil. Ainda peregrinou muito, passando pela mostra oficial do Festival International du Film d’Animation d’Annecy, o próprio Anima Mundi, o Animaí (BA), o Festival Internacional de Cinema Infantil (RJ) e o Animagem (PE), entre outros; até, enfim, virar esse belo longa-metragem que será exibido no Anima Mundi.

::: TRAILER

::: FICHA TÉCNICA

Direção: Amadeu Alban, Jorge Alencar
Roteiro: Paula Lice, Victor Cayres
Elenco: Luana Carrera, Harildo Deda, Ariane Souza, Fábio Costa, Daniel Calibam, Yoshi Aguiar
Direção de arte: Igor Souza
Trilha sonora: Luciano Simas, Ronei Jorge
Produção: Santo Forte Imagem & Conteúdo
País: Brasil

Alvaro Tallarico

Jornalista vivente andante (não necessariamente nessa ordem), cidadão do mundo, pacifista, divulgador da arte como expressão da busca pela reflexão e transcendência humana. @viventeandante
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