CRÍTICA | No Portal da Eternidade
Tatiana Trindade
Indicado na categoria de melhor ator, Willem Dafoe sempre se mostrou um excelente profissional. Em atuações de tirar o fôlego e filmes maravilhosos, há anos ele é esquecido pela Academia, que começou a prestar mais atenção nele de novo apenas ano passado, por “Projeto Florida”. Em uma tentativa de corrigir esse erro, No Portal da Eternidade (At Eternity’s Gate), em sua única indicação, traz o ator não em sua melhor performance, mas em uma suficientemente boa pra figurar na lista de melhores atores da temporada, uma lista que era inédita na carreira do ator até então.
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No Portal da Eternidade conta os últimos momentos do pintor holandês Van Gogh, que culminaram em sua morte, aos 37 anos, no ano de 1888. Entre os avanços da paranoia e depressão, e sua extensa coleção de arte construída em um curto período, o longa tenta mostrar um outro viés e um olhar diferente sobre os tormentos pelos quais ele passava.
Por mais que os esforços do diretor e roteirista Julian Schnabel sejam louváveis ao tentar transformar a loucura e a desorientação em algo palpável e visível a diferentes olhos, ela não é efetiva, e atrapalha, transformando a experiência em um incômodo visual. O diretor de “O Escafandro e a Borboleta” (2007) opta, novamente, por usar a câmera em mãos, sempre balançando e deixando a imagem desestabilizada. Nesse caso, entretanto, é extremamente cansativo para o propósito narrativo e perde muita força quando não aproveita a fotografia ao redor da excelente performance do ator.
Por outro lado, Dafoe não entrega a sua melhor atuação, mas ela é suficiente para quebrar a injustiça feita com ele durante todos esses anos de mais de 35 anos de carreira. Não me surpreenderia se dessem o Oscar desse ano a ele pelo “conjunto da obra”, já que é o que detém maior experiência dentre os indicados e nunca levou uma estatueta para casa.
É incrível perceber que, enquanto alguns atores desaceleram o passo em suas carreiras quando ultrapassam os 60 anos, Willem Dafoe parece ter dado o maior gás que já teve. Só em 2017, ele esteve envolvido em 8 produções diferentes, mantendo uma média de 4 a 5 produções anuais. É um número alto, se comparado com outros atores na mesma faixa etária e até mais novos, o que nos mostra que ele está longe de querer se aposentar. Por conta de tudo isso, é extremamente justo que ele esteja indicado a Melhor Ator, porque basicamente é um dos únicos elementos que se salvam do filme todo.
Por maiores esforços feitos por ele em sua performance, nada consegue equilibrar a obra como um todo. A direção é falha e não funciona em seu propósito, o roteiro é linear, mas prejudicado pelas decisões estilísticas, e a edição é enervante, por ter cortes abruptos entre a trilha e a imagem, e uma montagem extremamente mal executada. É um tanto quanto arrogante e prepotente achar que todos os espectadores irão cair na falácia “de demonstrar a visão inquieta do protagonista para trazer o viés de loucura e desorientação para o público”, ou ainda “um trabalho que visa trazer o interior para o exterior”, sendo que estas frases ilustram a tentativa de esconder um trabalho mal pensado.
O experimental, aqui, foi um erro, já que quebra qualquer emoção que o espectador possa ter com a trama e faz o filme, que tinha tudo pra ser um espetáculo visual, ser uma bagunça negativa. E por mais que já tenham diferentes histórias contando a vida e obra de Van Gogh, em No Portal da Eternidade, ele não apresenta nada antes, parte de um diálogo em tela preta e segue sem grandes introduções. Também fica um pouco nebulosa a ideia sobre “a fluidez da narrativa, que retoma a arte de Van Gogh”, porque existem várias formas melhores de fazer isso.
No fim, os pontos diferentes que poderiam ter sido explorados de maneira mais inteligente no longa, como as centenas de novas artes que acharam dele em 2016 e as suspeitas de que seu suicídio possa ter sido um assassinato, são, aqui, de modo muito literal, meras pinceladas superficiais.
Dito tudo isso, No Portal da Eternidade existe apenas para correção profissional no Oscar e para ser um amontoado de execuções duvidosas que, por alguma razão, costumam agradar em festivais. Uma salva de palmas para Dafoe por deter todos os méritos e que, raramente, decepciona, exceto por aquela catástrofe chamada “Death Note”. Nesse caso podemos fingir que não existiu, passar a caneta e seguir o baile.
*Crítica feita em parceria com o canal Tatiana Trindade.
::: TRAILER
::: FICHA TÉCNICA
Título original: At Eternity’s Gate
Direção: Julian Schnabel
Elenco: Willem Dafoe, Rupert Friend, Oscar Isaac
Distribuição: Diamond Films
Data de estreia: qui, 07/02/19
País: Reino Unido, França, Estados Unidos
Gênero: drama
Ano de produção: 2018
Duração: 110 minutos
Classificação: 12 anos