CRÍTICA | 1ª e 2ª Temporada | ‘The Handmaid’s Tale’ mostra realidade de uma sociedade intensamente machista onde mulheres nada podem
Stenlånd Leandro
Antes de assistir The Handmaid’s Tale, vi inúmeros comentários relevantes no Facebook sobre a série, logo a curiosidade para assistir a adaptação do livro O conto de Aia surgiu e ficava sempre pairando a questão do que o show poderia trazer de positivo. O serviço de streaming Hulu tem vindo com a corda toda para ‘brigar’ de igual com a Netflix. Com provavelmente sua mais grandiosa produção original até o momento, The Handmaid’s Tale não me mostrava muito daquilo que eu li discretamente sobre o livro e sem conhecer muito da obra literária, adentramos neste mundo de ‘conto de aias’, que está longe de ser de fadas, mostrando uma realidade totalmente distópica, trazendo à tona uma breve amostra grátis sobre como mulheres sofriam e sofrem até hoje em uma sociedade intensamente machista, que tenta impor um ritmo que ultrapassa gerações.
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O mundo anda bastante rigoroso com certas atitudes e não há mais espaço para relevar certas coisas quando se trata de violência contra a mulher. Estamos em uma série que se passa nos Estados Unidos, onde após uma situação traumática, um grupo terrorista ataca a Casa Branca. A partir daí, todo o território americano torna-se uma espécie de regime nazista com imposições criadas por homens, onde todos os direitos das mulheres são reduzidos a pó. Mulher não tem direito a quase nada, não se pode ler, não se pode questionar e sua única opção de vida é ser submissa ao homem em um alto grau de escala.
Na série, a violência afeta mulheres de todas as classes sociais, etnias e regiões. Nos Estados Unidos, a violência é entendida não como um problema de ordem privada ou individual, mas como um fenômeno estrutural, de responsabilidade da sociedade como um todo que viu que a única solução de terem um melhor avanço na sociedade era vetar os direitos da mulher. Apesar de os números relacionados à violência contra as mulheres na série serem alarmantes, é a coragem e a força delas que tenta mostrar que nada podemos contra elas, mesmo em termos de legislação.
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Handmaid’s Tale é praticamente uma série que tenta mostrar de forma ‘resumida’ o que acontece com o psicológico de mulheres que vivem em um regime totalitário e totalmente voltado ao nazismo. Muitas das agressões retratadas são: cárcere privado, violência física, psicológica, sexual, moral, patrimonial, tráfico de pessoas, homicídio e assédio. Há um cuidado grande com a simetria e com as expressões dos personagens, justamente para tentar mostrar tais detalhes.
O seriado tem seu drama engrandecido principalmente por seus atores Elizabeth Moss, Samira Wiley, Yvonne Strahovski e Alexis Bledel. O mesmo ganhou diversas premiações e indicações. Durante toda a trajetória, em um total de 23 episódios, temos diversas nomenclaturas que colocam as mulheres sob inúmeras circunstâncias e todas elas levam ao fatídico momento onde obedecer seu marido ou comandante é a única alternativa que lhes restam.
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As Tias, por exemplo, são mulheres separadas para comandar um emaranhado de outras mulheres denominadas Aias. A maioria das ‘Aias’ são empregadas domésticas e têm como a principal função conceber filhos para senhoras de comandantes que são estéreis ou velhas demais para darem à luz. O país está em total declínio e a linhagem precisa ser continuada. As mulheres dos comandantes se sentem inadequadas e com sentimento de culpa por não corresponderem às expectativas da masculinidade hegemônica, sofrendo consequentemente uma marginalização social, por compactuar da crença de que elas próprias estariam infringindo regras e padrões sociais por não seguirem os papéis pré-fabricados pelo regime.
A protagonista June, sua filha e seu marido começam a trilhar um caminho de fuga justamente deste povo que incessantemente tenta prendê-la. Após sua filha ter sido retirada de seus braços e ainda todos seus direitos removidos, até mesmo seu nome, a mesma passa a viver na casa do comandante Fred. Todas as aias possuem uma nomenclatura um bocado bizarra. No caso de June, interpretada por Elizabeth Moss, a mesma se chama Offred. Se notarem bem, o nome do comandante em que June torna-se uma aia é Fred, então OF-FRED significa: Do Fred. Sendo assim, após dar um filho para o Fred, a mesma mudará de casa e terá como dono outro comandante.
A Aia em questão é totalmente inquieta e não consegue se submeter às leis impostas pelo regime da República de Gilead, onde a religião domina e dita as regras. A mesma se mantém firme para reencontrar a filha e nessa incursão de tentar escapulir do regime totalitário, recebe diversas punições. A tortura é grande, seja ela física ou psicológica, pois antes de Offred chegar à casa de Fred, a aia antiga deles suicidou-se, justamente por não aguentar a pressão. A primeira temporada é bastante focada nas cenas de violência sexual, já a segunda, é voltada para o relacionamento de June e Serena, mulher do comandante Fred. Elas se tornam quase que amigas, mas sempre que há aquele clima de paz, June tenta fazer com que Serena deixe-a ver sua filha. Aí tudo volta a ser como era antes.
Há todo um jogo de sedução envolvido, Fred acaba gostando da aia e é que toda a trama muda de direção. Com a vida totalmente revirada do avesso, se é que podemos chamar isso de vida, Fred tenta seduzir June e consegue. Malandramente, nada inocente e com bastante resiliência, June coloca na cabeça de que sua melhor chance de sair desta vida é seguir tudo aquilo que seu comandante deseja: sexo sem a tal cerimônia. O comandante, para conseguir um breve sorriso da menina, acaba cedendo ao charme da mesma. No ímpeto da alma, June carrega consigo uma carga de rancor muito grande e tudo sempre está envolto a rever sua filha e marido.
Há um evidente esforço dos produtores em demonstrar como a mulher sofria numa época onde as mesmas não podiam fazer absolutamente nada. Este é um assunto que divide o país entre os que defendem acabar com uma sociedade machista e aqueles que permanecem intactos em seu ideal. O seriado apresenta referências reiteradas sobre um mecanismo que há muito tempo perdura, que não concebe lados. Mas enquanto o roteiro aborda superficialmente alguns personagens secundários, em especial uma amiga de June, essa adaptação dos fatos reais pode confundir o espectador menos informado, por mais que o assunto esteja escancarado nos dias atuais.
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A adaptação do livro homônimo tem um dos mais tocantes finais de temporada de todos os tempos. Percebemos que após tanto sofrer, a protagonista dá uma chance à sua senhora de entender o quanto é sofrível estar longe de sua família. Com reviravoltas inimagináveis no roteiro para contar essa história de intrigas, poder, traições, confissões e até mortes, a impressão deixada pelos 23 episódios é que há uma esperança que nunca morrerá: a de reunir a família a qualquer custo, independente do quanto tenha sofrido, mesmo que para isso tenha que abandonar um outro pedaço de si.
::: TRAILER
https://www.youtube.com/watch?v=dKoIPuifJvE&list=PLviBkls1C5CKggZSYvWZoavkEti2Mpvmp&index=24
::: FICHA TÉCNICA
Título original: The Handmaid’s Tale
Temporada: 1 e 2
Criação: Bruce Miller
Elenco: Elisabeth Moss, Joseph Fiennes, Yvonne Strahovski, Alexis Bledel, O. T. Fagbenle, Max Minghella, Samira Wiley, Ann Dowd, Madeline Brewer, Bradley Whitford.
Produção: Hulu
Gênero: Drama, Ficção
Ano: 2017/2018
Classificação: 16 anos