CRÍTICA | Dotado de beleza sensorial, ‘Unicórnio’ peca onde deveria ser mais concreto
Bruno Giacobbo
Em uma cabana distante, em uma região de paisagens idílicas, vive uma menina de ar triste e olhos nostálgicos. Seu nome é Maria (Bárbara Luz) e ali ela habita com sua mãe (Patrícia Pillar). Pouco é dito sobre a rotina delas. Na verdade, ao longo dos 30 minutos iniciais, dá até para achar que elas são a mesma pessoa, separadas pelo tempo e retratadas pelas lembranças da mais velha. Quem é quem nesta história só fica claro quando aparece o personagem de Lee Taylor, um pastor que mora nas redondezas. Ele contracena com ambas e assim fica nítido que as duas coexistem na mesma realidade espacial. A partir daí, temos a chance de finalmente vê-las juntas, em uma cena cotidiana, e compreender o porquê de tamanha nostalgia que transborda do olhar da protagonista: saudades do pai (Zé Carlos Machado).
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Segundo longa-metragem do cineasta, roteirista, editor e produtor Eduardo Nunes, Unicórnio pode ser considerado uma livre adaptação de dois contos da dramaturga e poetisa paulista Hilda de Almeida Prado Hilst. Entretanto, segundo palavras do próprio realizador, está mais para um filme sobre sensações em relação a obra dela, do que qualquer outra coisa. Fortemente apegada a figura paterna, em 1964, Hilst deixou para trás a agitada São Paulo e foi morar nas imediações de Campinas. Primeiro, na fazenda de sua mãe, depois, na Casa do Sol, uma propriedade idealizada por ela para lhe servir de inspiração e dar guarida para outros artistas. Nesta nova residência, produziu intensamente até a sua morte, em 2004, deixando um legado digno de uma das maiores escritoras da língua portuguesa no Século XX.
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As tais sensações descritas por Nunes podem ser percebidas (e sentidas, é claro) desde o início, pois esta é uma película extremamente sensorial. Da bela paleta de cores berrantes e vigorosas, utilizada pelo diretor de fotografia Mauro Pinheiro Jr., ao excelente trabalho de som, executado pela equipe chefiada por Roberto de Oliveira, todos os aspectos técnicos convergem em um grande esforço para fazer com que os espectadores se sintam dentro da história. Um fantástico trabalho de imersão que não era visto na nossa filmografia desde o lindo e doloroso “A História da Eternidade” (2014), de Camilo Cavalcante. Aqui, como acolá, este é um fator importante para a concretização plena da experiência fílmica em obras que trabalham, ainda que distintamente, com o idílico em doses cavalares. O grande problema desta adaptação sensorial, vamos chamar assim, está, justo, onde o filme deveria ser mais concreto.
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Não é possível que tamanha beleza resista a duas horas de exposição sem um conteúdo que a sustente. Mal comparando, ninguém contempla um Matisse por tanto tempo, afinal, até o belo se exaure. Em Unicórnio, era função do roteiro dar tal sustentação, contando uma história que capturasse a atenção dos espectadores da mesma maneira que, imagética e sensorialmente, todos os outros aspectos o fazem. Entretanto, ao demorar a engrenar e ao não desenvolver seus personagens com profundidade, ele acaba falhando em relação a este intento. No final, a impressão é de que a trama poderia ter sido melhor explorada. Consequentemente, é impossível saber se a Patrícia Pillar e o Zé Carlos Machado estão mal ou perdidos. A única que, com certeza, não está mal ou perdida é a revelação Bárbara Luz.
Desliguem os celulares e boa diversão.
::: TRAILER
::: FICHA TÉCNICA
Direção: Eduardo Nunes
Elenco: Patrícia Pillar, Bárbara Luz, Zé Carlos Machado
Distribuição: Vitrine Filmes
Data de estreia: qui, 16/08/18
País: Brasil
Gênero: drama
Ano de produção: 2017
Duração: 124 minutos
Classificação: 10 anos