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‘Fervo’ e o amor acima de tudo

Taynna Gripp

Aquele refrão clássico que quase todo mundo já ouviu na voz de Cher, “Do you believe in life after love?” (“Você acredita em vida depois do amor?”) se encaixa perfeitamente para descrever Fervo, filme brasileiro que chega aos cinemas nesta semana.

No longa, o casal de arquitetos formado por Léo (Felipe Abib) e Marina (Georgiana Góes) trabalham reformando mansões para venda e acabam de comprar um casarão devastado onde no começo dos anos 2000 funcionava uma boate GLS. Assim como a construção, o casamento deles não está em seu melhor momento. E quando tudo parece cooperar para o caos, conhecemos os três fantasmas, muito carismáticos, que vivem há vinte anos na mansão: Mo Nanji Manhattan (Rita von Hunty), Lara (Renata Gaspar) e Diego (Gabriel Godoy).

Mo Nanji, Lara e Diego eram os antigos donos da Fervo e, desde que morreram, há 20 anos, durante um incêndio nas vésperas da inauguração da boate, têm suas almas presas ali. Afinal, todos ainda têm questões inacabadas nesse plano e não conseguem partir em direção à luz. Léo, por sua grande sensibilidade, consegue ver as almas e interagir com ela, o que acaba o afastando ainda mais de sua esposa. Tentando encontrar um modo de libertar os novos amigos, ele procura a ajuda profissional de Jonas (Paulo Vieira), um famoso médium, e também de seu amigo Jorge (Dudu Azevedo).

Humor contagiante

O humor de Fervo é leve e contagiante, mesmo quando o filme entra em esferas tristes, abordando como a morte nos separa de quem amamos. O longa consegue nos fazer gargalhar, principalmente com a atuação de Paulo Vieira, ótimo no papel de Jonas, e, em poucos minutos, arrancar algumas lágrimas quando os três fantasmas conseguem liberdade provisória para resolver suas pendências aqui nesse plano.

São com Paulo, inclusive, as cenas mais emocionantes, quando Mo Nanji pega emprestado seu corpo para ir encontrar os pais e se assegurar que eles estão bem, apesar de sua morte. O ator tem a sensibilidade necessária para fazer com que a cena do reencontro do filho gay com sua família seja o ápice emocional do filme.

Lições de representatividades

Fervo é o típico filme que por anos vai ser passado nas sessões vespertinas de domingo, e isso é um ponto vitorioso demais, porque ali, naquele roteiro simples, estão lições de representatividades que precisam ser presentes exatamente nesse horário. É necessário que o amor de um filho por seus pais (até mesmo por seu pai que não o aceita) seja mostrado; assim como o amor entre duas mulheres que têm, juntas, uma filha; o amor entre dois homens que não se superam, mesmo depois da morte; e o amor de um casal hétero que aprende com a diversidade a botar no chão todas as paredes que existem dentro de uma relação e que acabam afastando um do outro.

Quando o terceiro ato se encerra, em uma grande festa com uma performance bem inusitada, os créditos sobem junto com um calor no coração. Que seja fervorosa a nossa capacidade de encontrar vida depois do amor. E mais amor ainda depois da vida.