Filme ‘Judas e o Messias Negro’ é uma aula sobre os Panteras Negras
Cadu Costa
Black Lives Matter. Vidas Pretas Importam. O punho cerrado pro alto. Uma forma de protesto importante desde os Panteras Negras nas décadas de 60/70. Nos dias de hoje, são cada vez mais necessários esse tipo de levantamento do movimento preto no mundo.
Mas por quê? Se você não votou num certo alguém deve ter percebido que, só em 2020, multidões tomaram as ruas para protestar contra a violência contra as pessoas pretas. Nos EUA, George Floyd foi morto por policiais brancos. Seu “I Can’t Breath” (“Não Consigo Respirar”) se tornou símbolo da dor preta. Além disso, Jacob Blake, de 29 anos, desarmado, levou sete tiros da polícia, em Kenosha, cidade do estado americano do Wisconsin.
Todavia, aqui no Brasil, o país mais miscigenado do planeta, tivemos o caso João Pedro, garoto de 14 anos morto numa operação policial em São Gonçalo. Assim como o menino Miguel, de cinco anos, que foi deixado para morrer pela elite branca. Por fim, ainda em 2020, em Porto Alegre, seguranças de uma rede de mercados atacaram fatalmente João Alberto Freitas.
A trama do filme ‘Judas e o Messias Negro’
O sofrimento da comunidade preta é um problema recorrente, doloroso e muitas vezes não encarado do modo devido. Livros, peças, músicas, documentários e diversos filmes já retrataram o tema. Com estreia nos cinemas nesta quinta (25), o filme Judas e o Messias Negro (Judas and the Black Messiah), do diretor Shaka King, chega para contar a história trágica de quem lutou pela importância das vidas pretas.
A saber, o filme narra a história de um dos principais ativistas pelos direitos da população negra nos Estados Unidos. Fred Hampton, presidente do Partido dos Panteras Negras, interpretado por Daniel Kaluuya, o astro de Corra! (2017) . Dividindo o protagonismo do longa também está Lakeith Stanfield, seu colega cujo grito dá nome ao sucesso do terror de Jordan Peele, que viverá William O’Neil, um criminoso que fez acordo com o FBI para ajudar na operação que pôs fim à vida de Hampton.
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Drama político
Primeiramente, Judas e o Messias Negro é um drama político. Mesmo com todas as cenas de ação e interrogatórios. Isso porque o roteiro, de Shaka King e Will Berson, é cercado de dor, tristeza, raiva e até amor. Aliada a uma direção rápida e direta de King, não seria surpresa caso a produção venha concorrer a prêmios importantes.
A frase “messias negro” não reflete uma hipérbole revolucionária romântica, mas sim à paranoia do diretor do FBI, J. Edgar Hoover (Martin Sheen). Afinal, ele via os militantes afro-americanos como a mais grave ameaça interna à segurança nacional. Além disso, também temia o surgimento de um povo guiado por um líder nacional que inspiraria multidões.
Assim como Hampton, Daniel Kaluuya assume o fardo de encarnar e exorcizar o monstro da imaginação de Hoover e um mártir do movimento Black Power. Ele mais do que enfrenta o desafio de descobrir a pessoa que luta, duvida e pensa por trás desses mitos.
Por outro lado, a duplicidade de O’Neal – e o desempenho instável, vulnerável e perspicaz de Stanfield – é o motor que impulsiona o enredo. Ele começa como um ladrão de carros cujos métodos incluem ocasionalmente se passar por um agente do F.B.I.
Depois de ser pego por um agente de verdade, Roy Mitchell (Jesse Plemons, de A Noite do Jogo), faz de O’Neal um informante para evitar sua prisão. Então, ele é instruído a ir às reuniões, coletar informações e se aproximar da liderança Pantera de Illinois. Assim, as recompensas incluem jantares com filé, bebidas de primeira qualidade e envelopes cheios de dinheiro.
“Eu estava lutando”
Este é o resumo de Bill O’Neal sobre sua participação na política preta radical do final dos anos 1960, apresentado de forma um pouco defensiva e com desdém enfático por aqueles que permaneceram à margem. É uma maneira estranha de descrever o duplo papel que ele desempenhou, como chefe de segurança do Partido dos Panteras Negras em Chicago e como informante pago do F.B.I. Se ele estava lutando, também deve ter tido muita luta interna.
Mesmo que essa alma – um senso de sua consciência, sua política e sua vida interior – permaneça fora de alcance. A motivação ambígua de O’Neal, sua luta para alinhar as peças contraditórias de sua identidade, ou pelo menos para sobreviver à colisão inevitável, mostra o quanto ele é um quebra-cabeça com peças perdidas. Impossível de ser resolvido.
Em princípio, suas cenas iniciais com o agente Mitchell onde este o pergunta se as mortes de Martin Luther King e Malcom X o incomodaram, demonstram o quanto O’Neal representa uma parcela importante da população preta que não consegue entender sua própria história pois tudo está tão atrelado à luta pessoal por sobrevivência que todo o mais é irrelevante.
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E o Messias Negro?
Igualmente poderoso, Daniel Kaluuya dá uma performance eletrizante que arrepia os cabelos da nuca. Antes de tudo, é fascinante como seu Fred Hampton perambula pelo palco inspirando seu público com discursos queimando intensidade e convicção. Tanto que o Judas do título, diz a seu manipulador que Hampton “poderia vender sal a uma lesma”.
E isso não é exagero pois Kaluuya faz você acreditar que ele terá sucesso em sua missão de unir uma “coalizão arco-íris” de pessoas de todas as raças contra um inimigo comum. É um trabalho estelar que será falado por algum tempo.
Por fim, Judas e o Messias Negro é um filme que terá seu espaço numa importante galeria de obras desta temática e um bom objeto de estudos sobre os Panteras Negras. Se você se interessa pelo tema e busca uma reconstrução de sua própria identidade e entendimento, escolha esse antes de sair maratonando Spike Lee, Ava DuVernay ou Jordan Peele. A escolha lhe guiará.
TRAILER
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FICHA TÉCNICA DO FILME ‘JUDAS E O MESSIAS NEGRO‘
Título original do filme: Judas and the Black Messiah
Direção: Shaka King
Elenco: Daniel Kaluuya, Lakeith Stanfield, Jesse Plemons
Distribuição: Warner
Onde assistir ao filme ‘Judas e o Messias Negro’: cinemas
Data de estreia: qui, 25/02/21
País: Estados Unidos
Gênero: drama, biografia
Ano de produção: 2021
Duração: 126 minutos
Classificação: 16 anos