‘Marighella’ e uma parte que o Brasil atual finge não lembrar
Marcelo Bastos
Wagner Moura conheceu a biografia de Carlos Marighella, feita por Mário Magalhães, pelas mãos de Maria Marighella, neta do personagem. Inicialmente iria apenas produzir, mas algo o levou a definir este filme como sua primeira incursão na direção.
Geralmente diretores iniciam por projetos mais simples e fáceis de conduzir. Contudo, a história do guerrilheiro comunista que lutou contra a ditadura militar falou mais alto para o ator, que gostaria de trazer ao brasileiro um pouco de sua história, resgatar um período tenebroso do Brasil e, assim, mostrar que a volta de algo deste tipo jamais pode sequer ser cogitada. É preciso, sempre, lutar.
Espírito de Marighella
E este é o espírito de Carlos Marighella mostrado no filme. Ao contrário de alguns de seus aliados, que acreditavam no debate, na incursão intelectual e no crescimento de uma corrente argumentativa contra o golpe militar, ele era do olho por olho, dente por dente. Pensava que só poderia derrotar a ditadura militar com a mesma violência com que os opositores do regime eram tratados. E assim levou sua luta contra o regime, criando uma milícia de combate. Geralmente formada por jovens estudantes que gostariam de fazer a diferença naquele momento.
Wagner fez um filme sem concessões. Duro, seco, com uma fotografia escura e locações fechadas, o agora diretor quis trazer a ideia claustrofóbica do regime militar. As imagens são violentas, os closes dos atores cada vez mais diretos, a trilha sonora sutilmente avassaladora. Há poucas músicas, mas em cenas pontuais.
A equipe parecia perfeitamente equilibrada. Seu Jorge dá vida a Marighella com uma perfeição ímpar, mostrando um cidadão com erros e acertos, defeitos e virtudes. Parece que aliou o papel à vida. E quando trabalhamos com o que gostamos e com o que nos representa, sempre soa melhor. Adriana Esteves, Bella Camero e a própria Maria Marighella mostram perfis diferentes da mulher na luta pela ditadura. Bruno Gagliasso como Lúcio, o delegado que representa o regime militar, traz um personagem unidimensional, o mal em pessoa.
Obra difícil
De fato, Marighella não é uma obra fácil. Apesar de o diretor sempre declarar que pensa nos seus filmes para a maior plateia possível, não é esse tipo de produção.
Além disso, não há arroubos cinematográficos. A sua simplicidade é um atrativo. A câmera trêmula e nervosa traduz com perfeição a cena mostrada. Seus planos-sequência trazem a violência angustiante de um assassinato, de uma tortura ou de uma repressão a direitos. Sua trilha e fotografia densas e diretas só usadas dentro da sua essencialidade para a trama.
Tudo é bem difícil de dissecar e, por isso, não há como agradar a todos. Ainda mais em um país cada vez mais polarizado. Aí é mais do que a obra representa. É toda uma ideologia que a nação da ditadura não conhecia. E uma parte que o Brasil atual finge não lembrar.
Aliando sua técnica como diretor ao já poderoso e forte enredo, Wagner Moura atinge, no filme Marighella, um objetivo único de, mais uma vez, descrever a nossa história. Insistindo em nos fazer lembrar do que nunca poderíamos ter esquecido. Nosso passado nos condena e é imperioso que sempre tenhamos ele em lugar de culpa, vergonha e, principalmente, em um limbo do qual jamais poderá voltar.
Onde assistir ao filme Marighella?
A saber, o filme Marighellla chega, de forma exclusiva, nos cinemas brasileiros a partir desta quinta-feira, 4 de novembro de 2021. Aliás, vai comprar algo na Amazon? Então apoie o ULTRAVERSO comprando pelo nosso link: https://amzn.to/3mj4gJa.
Trailer do filme Marighella
Marighella: elenco do filme
Seu Jorge
Adriana Esteves
Bruno Gagliasso
Ana Paula Bouzas
Bella Camero
Herson Capri
Ficha Técnica
Título original do filme: Marighella
Direção: Wagner Moura
Roteiro: Felipe Braga e Wagner Moura, baseado no livro de Mário Magalhães
País: Brasil
Duração: 155 minutos
Gênero: drama
Ano de produção: 2019
Classificação: 16 anos