Matrix Resurrections: metalinguagem e nostalgia em forma de protesto
Guilherme Farizeli
O natal está chegando e, com ele, chegou aos cinemas Matrix Resurrections, o 4º filme da badalada franquia. Eu digo badalada porque o primeiro filme, lá em 1999, marcou seu nome na história do cinema. Recursos visuais inéditos e uma narrativa de certa forma disruptiva deram o tom daquele que se tornou um clássico. Por outro lado, os capítulos seguintes da trilogia original deixaram um pouco a desejar. Especialmente o terceiro filme, um “trauma” do qual muitos ainda não se recuperaram até hoje.
Dessa forma, é difícil entender qual a intenção do estúdio ao apostar nesse quarto filme. E eu me refiro à intenção criativa. É óbvio que a nostalgia vai levar muita gente ao cinema. E com razão.
Deus ex machina
Lana Wachowski tinha muita coisa pra falar em Matrix Resurrections. Isso é notório. E muita coisa boa. O longa te propõe uma longa reflexão sobre conceitos hollywoodianos que estão no mínimo datados. E não tem nenhum tipo de pudor ao citar, por exemplo, a própria Warner Bros, em um dos momentos mais hilários do longa. Aliás, eu ri bastante durante a sessão. Esse Matrix 4 não tem problemas em fazer graça do que é engraçado, ainda que isso possa aborrecer algum fã mais hardcore da franquia. No entanto, se a motivação criativa da diretora estava on fire, a execução talvez tenha ficado a desejar. Mas, vamos destrinchar melhor isso a seguir.
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O magnífico 1º ato
Pois é. Eu afirmo, sem dúvida, que esse primeiro pedaço de Matrix Resurrections é até melhor que o 1º filme. O longa já começa introduzindo a gente numa vibe de nostalgia pura, descarada. Somos levados pelas mãos da excelente Bugs (Jessica Henwick) e de um remodelado Morpheus (Yahya Abdul-Mateen II) para dentro da ação. Que é, ao mesmo tempo, nova e antiga. E, finalmente, reencontramos nosso amigo Thomas Anderson. Sim, o Neo (Keanu Reeves) está mais John Wick do que nunca. E está perdido em uma nova realidade que usa e abusa da metalinguagem e de referências diretas da franquia original para critica e protestar contra o status quo.
Ácido quase o tempo inteiro e muitas vezes debochado também, Lana Wachowski brinca de Philip K. Dick ao subverter a realidade fictícia estabelecida nesse universo. E assume a influência de Foucault, ao abordar mais um vez as consequências do panoptismo, presente de uma forma diferente no mundo atual. Nesse sentido, até piada sobre o bullet time rola em determinado no filme.
Enfim, com tanta coisa legal para discutir, ainda tinha trama. Nosso herói precisava de uma aventura. E ela veio.
Ação diferentona
Lana Wachowski apostou em um conceito quase artístico para suas sequências de ação mais pesadas. Embora tudo recaia sobre o CGI, existe uma diferença gritante entre as produções da moda. A diferença fica maior ainda quando a gente ainda tem na cabeça o filme do Miranha, assistido uma semana atrás. A decisão é ousada? Sim. Mas não acho que seja necessariamente ruim. A diretora foi fundo na ideia de fazer um filme diferente.
Os problemas começam justamente quando o filme precisa deixar a reflexão de lado para contar sua história. Porque, de fato, não existia uma história para contar. Quem assistiu com atenção o terceiro filme, sabe que o arco se fechou.
Quem lembra de tudo?
Um outro ponto que incomodou foi a necessidade de ter assistido os outros filmes da franquia para ter uma experiência completa. Apesar de trechos das produções anteriores inseridas no novo longa. O que também soou um pouco condescendente demais pro meu gosto. Mas, tudo bem. Melhor pecar pelo excesso de informação. O ponto é que, quem não assistiu com atenção o terceiro filme, pode ficar um pouco perdido em alguns trechos de Matrix Resurrections. Como eu o assisti umas cinco vezes, fiquei de boa. E dessa forma, as referências e os caminhos fizeram sentido pra mim.
Nesse sentido, não tivemos nem a surpresa da aparição de Niobe (Jada Pinkett Smith), antecipada por um dos trailers.
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Conclusão
O objetivo de recuperar Trinity (Carrie-Anne Moss), definitivamente, não se mostrou suficientemente forte para fazer valer o longa. Com tanta sofisticação na motivação criativa, eu esperava um “tempero” a mais na jornada de Neo. Algo mais substancial do que “fazer valer o poder do amor”. E faltou também uma ameaça do tamanho que Matrix merecia. A nova versão do agente Smith, interpretada pelo excelente Jonathan Groff, basicamente não fez diferença na história. Um desperdício. E O Analista (Neil Patrick Harris), acabou perdido enquanto contava seu plano diabólico.
Obviamente, fica uma curiosidade danada para saber o que vai rolar daqui pra frente. O filme deixa em aberto essa possibilidade. E talvez seja, de certa forma, uma chance de redenção para a franquia. Para começar com um filme mediano e terminar em grande estilo. O que fica pra mim é a grande artista que é a Lana Wachowski. Capaz de sair da caixinha e fazer cinema de uma forma um pouco diferente. E, é claro, um 1º ato do filme que deixou a gente com gosto de quero mais.
Assista o trailer de Matrix 4: Resurrections
Matrix 4: Resurrections – Elenco do filme
Keanu Reeves
Carrie-Anne Moss
Yahya Abdul-Mateen II
Jessica Henwick
Jonathan Groff
Neil Patrick Harris
Priyanka Chopra
Christina Ricci
Eréndira Ibarra
Toby Onwumere
Max Riemelt
Brian J. Smith
Jada Pinkett Smith
Ficha técnica
Direção: Lana Wachowski
Roteiro: Lana Wachowski, Aleksandar Hemon e David Mitchell
País: Estados Unidos
Gênero: Ação, ficção
Duração: 148 minutos
Ano de produção: 2021
Classificação: 12 anos