‘O Homem Invisível’ | CRÍTICA
Wilson Spiler
Atualmente, os gêneros de horror e fantasia tendem a ser um espetáculo metafísico inútil que visam assustar o público usufruindo excessivamente de fantasmas, demônios, assassinos loucos, o que não garante, necessariamente, uma experiência inovadora e inesquecível. Felizmente, não é o caso de O Homem Invisível (The Invisible Man).
De fato, Leigh Whannell faz uma engenhosa e divertida atualização de um conceito que existe há 120 anos. As emoções não apenas arrepiam o espectador, mas têm uma importância emocional. Esse suspense gratificante, inteligente e – às vezes – com encenação poderosa está muito enraizado em nossa época para ser chamado de antiquado. Seu lançamento, aliás, parece quase cármico sincronizado com a semana da sentença de Harvey Weinstein.
No entanto, podemos sim chamar o filme de antiquado: Afinal, trata-se de um trabalho admirável que nos remete a uma época em que um filme de terror poderia realmente significar algo.
A trama
Em O Homem Invisível, Cecilia Kass (Elisabeth Moss), uma arquiteta que acaba de escapar de um relacionamento tóxico, se vê perseguida e aterrorizada por Adrian (Oliver Jackson-Cohen), que descobriu uma maneira de se tornar invisível. Logo no início, ele invade um quarto, inédito e invisível, esperando o momento perfeito para tirar as cobertas da cama e deixar Cecilia completamente apavorada. Mas isso é apenas o começo.
Infiltrando-se em escritórios comunitários, salas de reuniões corporativas e células de asilo, Adrian se torna uma força silenciosa e invisível de vingança mortal. Ele pode drogá-lo, roubar seu portfólio de trabalho, despejar e-mails falsos e, mais do que tudo, brincar com sua mente.
Nova versão do Homem Invisível
No famoso filme de terror de ficção científica de James Whale, em 1933, o homem invisível era uma presença espectral, interpretada por Claude Rains como uma figura assombrada, mas delicada, envolta em bandagens – aquela cujo ato de fuga foi tratado, no final, como uma espécie de aflição.
A ideia do homem invisível como um invasor agressivo, por outro lado, um monstro humano que pode atacar a qualquer momento, cria um ambiente altamente carregado de medo e tensão, e o novo “Homem Invisível” é um filme de suspense encenado com verve assassina.
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Muito mais do que ‘filme de gato e rato’
De fato, seria fácil imaginar uma versão deste filme, que nada mais é do que um duelo de ação entre vítima e agressor que você não consegue ver. Mas Whannell, que colaborou com James Wan em Jogos Mortais e Sobrenatural, e que dirigiu Sobrenatural: Capítulo 3, tem algo mais ambicioso em mente.
Cecilia, que está morando por um tempo na casa de seu amigo de infância, um policial chamado James (Aldis Hodge) e sua filha do ensino médio, Sydney (Storm Reid), fazem algumas tentativas desastradas para explicar o que está acontecendo com eles. Mas nem eles acreditam no que ela está dizendo. Parece um obstáculo comum que a personagem precisa superar. Assim, o fato de todo mundo pensar que Cecilia está imaginando coisas é a fonte de angústia do filme.
O poder traumático da atuação de Moss é que ela interpreta o desespero convulsivo e a raiva de uma mulher que está sendo aterrorizada e, ao mesmo tempo, totalmente desconfiada, mesmo de pessoas mais próximas à ela.
Suspense social
O Homem Invisível é um filme de suspense social fundamentado em uma metáfora perfeita. É a história de uma mulher que foi sugada por um redemoinho de abuso e agora descobre que não pode se libertar, porque o abuso permanece (literalmente) fora de vista. Ela é toda mulher que já teve que lutar para ser ouvida porque sua provação não era “visível”.
As cenas iniciais preenchem o final do relacionamento de Cecilia com Adrian, um gênio da tecnologia óptica de cachorros doentes que parece uma versão malévola do guru de Oscar Isaac em Ex Machina. Adrian mora em uma remota mansão vítrea situada no alto das colinas de São Francisco (seu centro de vigilância parece algo fora da Batcaverna), e ele essencialmente fez de Cecilia sua prisioneira, prometendo matá-la se ela partir.
É por isso que ela acorda com uma garrafa escondida de Diazepan, tendo o drogado para dormir, para que ela possa correr para a estrada abaixo e ser resgatada por sua irmã, Alice (Harriet Dyer).
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Angústia incessante
Whannell estabelece um clima de paranoia de sugar a respiração, com Adrian atormentando Cecilia. Oficialmente, ele está morto (um suicídio). Cecilia já foi nomeada em seu testamento; ela recebe US$ 5 milhões em incrementos mensais de US$ 100.000. Mas, é claro, isso é bom demais para ser verdade. Especialmente quando Cecilia começa a prometer pagar pela mensalidade de Sydney na Parsons School of Design.
Moss age com uma angústia que queima lentamente, expressando o terror de como um relacionamento ruim pode se manter como um fardo, mesmo depois de muito tempo do rompimento.
Adrian, agora dedicando sua existência a torturar Cecilia (a ponto de negar sua própria existência), inicia seu jogo de terror. No entanto, ela revida, mesmo quando aqueles ao seu redor estão convencidos de que está perdendo a noção da realidade. Eles acham que ela ainda está tão traumatizada com a antiga relação que está alucinando.
Por um tempo, sua irmã se torna sua inimiga, mas Cecilia concorda em fazer uma reaproximação com ela em um lugar muito público – um restaurante chinês chique, onde o filme nos pega em uma cena cruelmente engraçada que atinge o último nível de etiqueta de garçom. Contudo, está apenas nos preparando para a matança. O que acontece depois é de cair o queixo! Horrível e emocionante.
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Mensagem profunda
A maneira como a invisibilidade é alcançada em O Homem Invisível é pura fantasia, embora tenha sido utilizada apenas o suficiente de uma base “tecnológica” sedutora. Whannell a usa para encenar a ação com originalidade de força bruta.
O Homem Invisível é um filme divertido, com uma mensagem extremamente profunda para atingir os mais diversos lares: que em um relacionamento tóxico, o que você vê é o que recebe – mas o que recebe é o que não vê.
::: TRAILER
::: FICHA TÉCNICA
Título original: The Invisible Man
Direção: Leigh Whannell
Roteiro: Leigh Whannell, baseado no romance de H.G. Wells
Elenco: Elisabeth Moss, Oliver Jackson-Cohen, Harriet Dyer
Distribuição: Universal
Data de estreia: qui, 27/02/20
País: Austrália, Estados Unidos
Gênero: ficção científica
Ano de produção: 2019
Duração: 125 minutos
Classificação: 14 anos