Os últimos dias de Gilda Canal Brasil série

‘Os Últimos Dias de Gilda’: a espiral narrativa de avanço e retrocesso da liberdade

Victor Lages

Na abertura dos episódios, já sentimos o tom de Os últimos dias de Gilda. Uma mulher embaixo de uma luz vermelha, em frente a uma mesa cheia de comidas a serem preparadas, apenas de sutiã e amolando uma faca. Seu olhar é determinado, há certa ira, certo ressentimento, certa determinação sobre seus atos.

Ela é Gilda, moradora do subúrbio carioca que vive sua vida e (por favor, não levem como reducionismo) é simplesmente livre.

O mundo de Gilda está mudando

Autônoma, cultiva porcos e galinhas no quintal como subsistência. Cozinheira, é sempre elogiada por tudo o que produz. Mãe, que se mantém distante do filho por segurança. Sexualmente ativa, transa com quem lhe interessa.

Mas toda sua liberdade vai incomodando seus vizinhos da vila onde mora, que passa por mudanças tanto cariocas, quanto brasileiras e, quiçá, universais.

Igrejas neopentecostais vão entrando nas casas, convertendo as pessoas e se misturando com a política, enquanto a força paramilitar vai tomando o território e instalando medo, ao invés de segurança.

Os últimos dias de Gilda série crítica

Gilda e Cacilda: nomes parecidos, personalidades diferentes

E ninguém melhor que Karine Teles (Benzinho) poderia representar Gilda, uma mulher que é carinhosa e afetuosa, mas também cirúrgica ao desarmar vulnerabilidades das pessoas.

Não seria por menos. O papel foi construído especialmente para ela pelo dramaturgo Rodrigo de Roure, inicialmente como um monólogo de teatro em 2004, remontado posteriormente em 2018 e agora levado às telas pelo Canal Brasil.

Sendo assim, na contramão do legítimo amor a oferecer, está Cacilda, interpretada brilhantemente por Julia Stockler (A Vida Invísivel), esposa de um pastor que está se candidatando a vereador e a inteira personificação da intolerância.

Aliás, o ódio retratado nos olhos e na postura corporal de Cacilda é um primor de assistir. É como se você sempre quisesse descobrir do que ela é capaz de fazer para importunar a liberdade de Gilda. Nomes que rimam, mas personalidades tão discrepantes…

Os últimos dias de Gilda Canal Brasil série

Uma série que garante maratona

A saber, temos na série apenas quatro episódios para apresentar as relações entre as personagens e as situações em que o microcosmo vai se envolvendo. Mas temos também a direção pontual de Gustavo Pizzi (Benzinho), que assina também o roteiro da adaptação junto com Karine Teles, para conduzir essa narrativa que vai numa espiral de avanço e retrocesso da libertação feminina.

Talvez a história não pegue de primeira, mas tudo bem; vivemos a era das maratonas seriadas e já estamos acostumados a consumir um material todo de uma vez.

Então, no final das contas, os espectadores assistirão tudo em sequência e ir se deleitando, momento por momento, até chegar em seu ápice: a última cena.

Por fim, não darei spoiler nenhum aqui, mas tenha certeza que o frame final ficará grudado na sua cabeça. De fato, um dos atos políticos mais bonitos e esperançosos do audiovisual brasileiro. É certamente daquelas imagens para emoldurar.

TRAILER

https://vimeo.com/479030078

FICHA TÉCNICA

Título original: Os últimos dias de Gilda
Temporada: 1
Data de estreia: sexta, dia 27/11
Criação: Gustavo Pizzi, Karine Teles
Elenco: Karine Teles, Julia Stockler, Erom Cordeiro
País: Brasil
Idioma: Português
Gênero: Drama
Ano de produção: 2020
Classificação: 16 anos
Distribuição: Canal Brasil

Victor Lages

Feito no coração do Piauí, onde começou sua aventura cinematográfica depois de descobrir as maravilhas do filme “Crepúsculo dos deuses”, o jornalista Victor Lages ama tanto a sétima arte que a leva para tudo em sua vida: de filosofias do cotidiano à sua dissertação de mestrado.
NAN