Oscar da diversidade: a derrubada definitiva do “muro” para as minorias?
Danilo Firmino
Embora ainda seja a premiação de cinema mais famosa do mundo, nem tudo são flores para o Oscar nos últimos anos. Além de gafes terríveis, como o erro na entrega da premiação de melhor filme em 2017, o evento vem perdendo audiência. De acordo com artigo da Variety, assinado por Kristopher Tapley, os números de telespectadores nos EUA estão cada vez menores, com o Oscar 2018 representando uma queda de 20% do público em relação ao de 2017.
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Temos ainda acusações cada vez mais frequentes de discriminação. O auge da indignação de parte do público ocorreu em 2016, muito em razão dos dois anos anteriores terem sido indicados ao prêmio apenas atores brancos. Além disso, até aquele ano, 90% dos 5 mil membros do júri era composto por homens brancos. Essa situação levou nomes como Will Smith, Jada Pinkett e o diretor Spike Lee a boicotarem o evento. Em 2018, outra polêmica ocorreu, dessa vez envolvendo o comediante Kevin Hart. Ao ser anunciado como o apresentador do Oscar 2019, teve seus tuítes vasculhados por internautas, revelando assim uma série de publicações consideradas homofóbicas – a reação negativa por parte do público fez com que o ator desistisse da ideia de ser apresentador, além de um constrangido pedido de desculpas mesmo depois de negar que faria.
I have made the choice to step down from hosting this year's Oscar's….this is because I do not want to be a distraction on a night that should be celebrated by so many amazing talented artists. I sincerely apologize to the LGBTQ community for my insensitive words from my past.
— Kevin Hart (@KevinHart4real) December 7, 2018
I'm sorry that I hurt people.. I am evolving and want to continue to do so. My goal is to bring people together not tear us apart. Much love & appreciation to the Academy. I hope we can meet again.
— Kevin Hart (@KevinHart4real) December 7, 2018
“Eu fiz a escolha de renunciar à apresentação do Oscar deste ano…. isso é porque eu não quero ser uma distração em uma noite que deve ser comemorada por tantos artistas talentosos incríveis. Eu, sinceramente, peço desculpas à comunidade LGBTQ pelas minhas palavras insensíveis do meu passado.
(…)
Me desculpem por ter machucado pessoas… Estou evoluindo e quero continuar a fazer isso. Meu objetivo é unir as pessoas e não separá-las. Muito amor e apreço pela Academia. Espero que possamos nos encontrar novamente”.
Observando essas polêmicas, aparentemente o Oscar 2019 adotou a multiplicidade como sua tônica. Entre os indicados para Melhor Filme, Pantera Negra, Infiltrado na Klan e Green Book: O Guia trazem em seu elenco negros como protagonistas, bem como histórias que destacam negros em suas narrativas. Ainda nessa categoria, Bohemian Rhapsody retrata a história de Freddie Mercury, gay assumido, e Nasce uma Estrela tem Lady Gaga, querida pelo público LGBTQIA e ativista em sua causa como atriz principal. Uma mudança bastante importante nas indicações da mais cobiçada estatueta que envolve diretamente os principais alvos recentes de polêmicas da Academia.
Outras premiações importantes também apontaram para a pluralidade como caminho. Ainda na categoria Melhor Filme, foram indicados o mexicano Alfonso Cuáron por Roma, o sempre provocador grego Yorgos Lanthimos em A Favorita. Ambos os cineastas também concorrem na categoria Melhor Diretor, com a ilustre presença do polonês Pawel Pawlikowski com Guerra Fria.
Em Melhor Ator, destaque para indicação de Rami Malek pela interpretação de Mercury em Bohemian Rhapsody. Já no âmbito de Melhor Atriz, surpreende a indicação de Yalitza Aparicio, não pela qualidade inquestionável do seu trabalho em Roma, mas por ser uma mexicana e figurar fora dos padrões de beleza determinados pelo público norte-americano e pela Academia de maneira geral. Em um país onde seu presidente pretende colocar um muro dividindo as fronteiras e restringe de maneira implacável a imigração, a indicação de uma atriz do México é curiosa e bem-vinda.
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Como podemos ver, a diversidade marca as indicações do Oscar 2019. Filmes que retratam a história e realidade dos negros norte-americanos se misturam com películas que abordam temáticas e personalidades caras ao público LGBTQIA. A busca por uma maior heterogeneidade também se encontra nas indicações de diretores de diferentes nacionalidades, comumente desprezados. A indicação de Pantera Negra como Melhor Filme merece um segundo destaque, pois comumente super-heróis são descartados – que o diga o sensacional Batman: O Cavaleiro das Trevas, deixado de lado em 2008 para a indignação de muitos.
Todas essas mudanças são louváveis, afinal, o Oscar precisava de uma renovação e os números cada vez menores de audiência demonstram isso. Porém, uma pergunta deve ser feita: seria apenas uma estratégia para atrair um novo público e acalmar os ânimos dos críticos mais ferrenhos ou uma mudança real nos critérios e na atuação do júri? Estaria a Academia caminhando de maneira definitiva para a multiplicidade? Difícil responder. Fato é que a cerimônia se mantém como a premiação mais importante do cinema mundial e abriu espaço para transformações significativas em 2019. Só o tempo (e os índices de audiência) dirão se tais alterações irão permanecer ou não. Que a resposta seja positiva.