Agatha, Ivo Vargas e Júlia Vargas em foto de João Serra

Agatha, Ivo Vargas e Júlia Vargas em foto de João Serra

BÔNUS | Porangareté quer amar e mudar as coisas através da música

Alvaro Tallarico

Porangareté. O selo regido por Rodrigo Garcia e Chico Chico vem trazendo à tona uma nova geração de artistas – músicos – dotados de um misto de influências e vocações que vem dando um ótimo caldo cultural. Tive a oportunidade de cobrir aqui pelo BLAHZINGA o show de Agatha e Gui Fleming, com participação de outros músicos do selo, no Galpão Ladeira das Artes, e aproveitei a oportunidade para descobrir mais sobre essa galera talentosa. (foto de capa por João Serra)

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O produtor Rodrigo Garcia é quem vem buscando auxiliar esses músicos utilizando sua experiência e know-how, um homem que vê a arte como expressão do espírito. Declarou se sentir com sorte de conviver com essas jovens realidades. “A gente foi construindo esse grupo de artistas e essa ideia do selo a partir de uma galera que vai se admirando entre si, todas as pessoas do selo tem alguma conexão. Fico com essa sensação de eternidade muito interessante; de estar produzindo sons que vão ainda ser muito falados, é bem o começo. Tudo que é muito bom tem um começo”.

Aliás, ele foi enfático ao me dizer que essa é a melhor geração de artistas desde os anos 70. Em alguns atua mais para montar toda a produção; em outros, nem tanto. Garcia lembrou que tocava com a Cássia Eller, gravou três discos dela, contudo, se mudou para região serrana do Rio de Janeiro depois. Essa ideia do selo Porangareté acabou surgindo a partir do acervo da Cássia, as raridades dela, que Rodrigo começou a levantar. Isso acabou se unindo com o início do Chico Chico compondo e a cantora Júlia Vargas.

Rodrigo Garcia é fundador do selo Porangareté (foto: João Serra). Saiba mais na coluna Bônus, por Alvaro Tallarico.

Rodrigo Garcia é violonista, produtor musical e fundador do selo Porangareté (foto: João Serra)

a diversidade como trunfo

Por falar em Chico Chico, o artista fez questão de dizer que não está à frente, mas que é somente mais uma parte nessa turma, onde Rodrigo é o grande produtor e catalisador. “Não me sinto encabeçando, sinto fazendo parte mesmo, até porque não gerencio. E quanto à diversidade, isso é fantástico, esse é o nosso trunfo enquanto galera, enquanto compositores. Além da amizade o trunfo é que a gente não faz a mesma coisa cada um. Cada um tem a sua pegada, o que é essencial”.

Chico Chico deixou clara a importância da pluralidade e como esse grupo quer fazer som. Citei a efervescência musical dos anos 70 e ele disse: “Toda época é áurea. O que impede o florescimento em massa, acho que muitas vezes, é o mercado e não os músicos. Sempre vai ter gente foda, sempre teve. Não só nos anos 70, só que nos anos 70 elas estavam inseridas no mercado. Agora não mais. Nossa jogada agora é com a internet. O que acho que a gente tem que fazer é criar espaço. Gente boa sempre teve, o negócio é a gente achar, escutar e botar para frente.”

Outro dos músicos do selo é o Fidelis. Comentei sobre a moradia na região serrana do estado do Rio de Janeiro e a influência dessa musicalidade no retorno ao urbano. “Vemos as pessoas saindo do Rio de Janeiro para criar filhos por lá. A gente é um reflexo disso, novos artistas com novas propostas, novas ideias, mostrando verdade, se reunir lá é uma coisa natural por causa desse movimento. Sou um compositor e cantor que lida muito com a questão da natureza. Estou gerindo um álbum que vai sair em pouco tempo, então foi o momento propício de me retirar para aquele lugar”.

juliana linhares e o atual contexto cultural

Ademais, estava ali Juliana Linhares. Questionei a vocalista do Pietá sobre o atual contexto musical e cultural. Comentou que em parte se sente privilegiada por fazer parte desse movimento, pois é um momento onde é necessário reunir pessoas, ocupar os lugares e fazer as coisas acontecerem, contudo: “Se a gente não está aqui movimentando essas pessoas, elas estão sei lá aonde, sabe? E a gente está, sei lá, fazendo o que? E a gente precisa realmente valorizar a música que estamos fazendo, fazer com que seja ouvida. Fazer com que a música brasileira mude o mercado, que ele abra, se sustente, que o Rio de Janeiro que é uma cidade que nesse momento está muito falida, que a gente consiga circular e reerguer essa cidade. A gente não pode só abandonar a cidade, a gente precisa muito fazer com que ela renasça mesmo.”

Inclusive, Juliana louvou a Porangareté como um selo que nos últimos anos faz esse movimento acontecer, consegue reunir artistas e público. Realmente o Galpão Ladeira das Artes estava bem cheio. Juliana busca ser uma pessoa que contribui socialmente como artista para que esse espaço da cultura cresça cada vez mais. “Tem um avanço que a gente não volta mais atrás, que é esse avanço aqui de dar as mãos, de gritar, querer os espaços, querer a música, querer a poesia, querer a cultura como transformadora. Ferramenta mesmo de transformação e acho que a gente está buscando isso e em comum com a gente tem muita gente que veio. Porangareté é uma coisa que a Cássia deixou para gente com muito amor. O universo conspirou através dela.” Juliana me disse isso do alto de sua eloquência e sagacidade em um misto de firmeza e delicadeza.

Jhasmyna e Juliana Linhares no palco do Galpão Ladeira das Artes - Porangareté (foto: João Serra / @joaocserra )

Jhasmyna e Juliana Linhares no palco do Galpão Ladeira das Artes (foto: João Serra / @joaocserra )

BÔNUS: JÚLIA VARGAS, a mestra jedi

A vida não é sopa e se eu saio para rua é para me desdobrar. Naquela correria após o catártico show queria ter falado com todos. Quando consegui dar de frente com o Ivo Vargas e começava a perguntar, Júlia avisou que chegou o transporte dele, com aquela voz de arrepiar. Parece que ela não anda, só samba. Após o leve tremor na nuca, desci da minha canoa, como se do Rio Araguaia viesse, e perguntei se ela se sentia como uma mestra Jedi para alguns daqueles músicos. “É mais ou menos por aí por conta do tempo de estrada, por ter sido uma das primeiras no selo Porangareté. O selo se formou numa época em que eu estava fazendo um trabalho com o Rodrigo Garcia e logo depois emendei em um trabalho com o Chico Chico também.”

A felicidade da Júlia era óbvia no sorriso que não fechava enquanto me respondia. “Servir de alguma forma como uma espécie de exemplo, para mim é uma coisa muito incrível, amadrinhar tantos trabalhos incríveis e principalmente fazer parte da vida como amiga, uma pessoa próxima que eles podem contar. O Rodrigão com toda a experiência dele passou um pouco do que viveu para mim e eu um pouco do que vivi para esses meninos. É assim, vai passando adiante. Como diz a Luhli, minha grande madrinha, nossa grande madrinha: <<Passar adiante para não virar elefante>>”.

adiante: fazendo música

Afinal, fiquei curioso e perguntei para Júlia sobre o que vem por aí, algum projeto pessoal dela. Não esqueceu do grupo: “Faço parte desse coletivo em que a gente está sempre junto, em vários momentos, tanto com relação a esses lançamentos quanto com relação a simplesmente estar junto. A gente sempre arranja um motivo para estar junto. Acaba que a gente está sempre se visitando, fazendo participação um no show do outro. Como sempre foi, né? E tô aí, estou lançando um novo disco, meu quarto disco, que está passando por um  processo de financiamento coletivo. Estou nessa fase agora. Continuando a história”.

Apesar do distanciamento profissional como jornalista, foi difícil não sentir a energia que aqueles músicos do Porangareté emanavam, uma reunião de galáxias formando um universo cultural mágico. Porque, acima de tudo, para eles, amar e mudar as coisas – fazendo música – interessa mais. Muito mais.

*A coluna BÔNUS, assinada pelo jornalista Alvaro Tallarico @viventeandante, sai toda quarta-feira. Porque aqui no BLAHZINGA a cultura sempre tem espaço e a união faz a força.

Alvaro Tallarico

Jornalista vivente andante (não necessariamente nessa ordem), cidadão do mundo, pacifista, divulgador da arte como expressão da busca pela reflexão e transcendência humana. @viventeandante
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