Pray Away Netflix crítica de filme documentário

‘Pray Away’ é de embrulhar o estômago

Wilson Spiler

Antes de começar a escrever essa crítica, quero fazer uma observação. Sou um homem branco, de classe média e heterossexual. Ou seja, um privilegiado. Dito isto, ao assistir ao documentário Pray Away, que estreou recentemente na Netflix, a vontade era de desligar o aplicativo a todo momento. Não, o filme da gigante do streaming não é ruim. Muito pelo contrário. O desejo de abandonar a projeção vem de um sentimento muito em falta ultimamente: EMPATIA.

Dirigido por Kristine StolakisPray Away segue sobreviventes e ex-líderes da Exodus, organização responsável pela polêmica “terapia de conversão”, onde, teoricamente, pessoas que se consideram gays são convertidas para o heterossexualidade graças ao “poder divino”. O pior de tudo é que a associação não contava com psicólogos ou psiquiatras e tratava o homossexualismo como doença mental, algo que já está em desuso deste 1992 pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

Retrato fiel e cruel da realidade

E cada depoimento é um baque de embrulhar o estômago. Diante da situação atual que vivemos, não só no Brasil como em boa parte do mundo, onde a intolerância vem crescendo vertiginosamente, assim como o poder das igrejas, Pray Away é um retrato fiel – e cruel – da realidade.

O pior de tudo é que a arte vem “profetizando” esse rumo que a humanidade vem tomando faz tempo. Afinal, The Handmaid’s Tale está aí para não me deixar mentir sobre a união entre política e religião. Aliás, antes que me acusem de ateu, saibam que não sou. Cresci na Igreja Católica e fiz toda a trajetória que ela “exige”, com direito a crisma, primeira comunhão e encontro de jovens. Mas o amor que encontrei na fé está longe de ser o que pregam atualmente.

Terapia de conversão continua na ativa

Apesar do fim oficial da Exodus em 2013, o trabalho de Ricky Chelettte e Anne Paulk, fundadores da organização (que se negaram a dar entrevista para o filme), assim como dos ministérios da Living Hope, seguiu em frente, sendo criada outra instituição para destilar todo o preconceito contra a comunidade LGBTQIA+. Além disso, mesmo tendo sido decretado o fechamento, ainda é possível encontrar o site da associação no ar, inclusive com direitos autorais de 2021. Tem algo mal contado aí.

De acordo com informações do documentário Pray Away, aproximadamente 700 mil pessoas passaram por alguma terapia de conversão somente nos Estados Unidos. Uma pesquisa revelou que jovens que passaram por isso eram duas vezes mais propensos ao suicídio. Essa é só uma ideia do tamanho do mal que a instituição representou para os homossexuais.

Basta ter empatia

A ideia de Pray Away (apesar do título dar brecha para que se acredite nisso) – e muito menos da Netflix – não é pregar contra a religião, sequer se opor a Jesus Cristo e Deus. Pelo contrário. O filme mostra ex-membros da Exodus frequentando igrejas após a saída da organização, se aceitando como eles são. Inclusive há cenas de um casamento entre duas pessoas do mesmo sexo. Afinal, desde 2015, tanto a Igreja Presbiteriana quanto a Episcopal aceitam esse tipo de matrimônio.

Enfim, eu não preciso ser gay para ser a favor da união homoafetiva. Também não necessito ser negro pra ser contra o racismo. Muito menos miserável economicamente para entender a importância de programas sociais. Quanto mais ser vegetariano para me importar com os animais. E sequer atuar como militante das causas ambientais para me preocupar com a natureza. Basta entender que só porque alguém não pensa e age igual a você, essa pessoa não é pior nem melhor. É apenas diferente.

Infelizmente, o que vemos no documentário é apenas mais um capítulo da derrocada humana. Pray Away, da Netflix, mostra que é hora de parar, refletir e mudar enquanto é tempo. Não se escolhe ser gay. A opção aqui é somente pelo amor. E qual é o problema de amar?

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Trailer do filme Pray Away (Netflix)

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Ficha Técnica

Título original do filme: Pray Away
Direção:
Kristine Stolakis
Data de estreia: ter, 03/08/21
Onde assistir ao filme ‘Pray Away’: Netflix
País: Estados Unidos
Gênero: documentário
Duração: 101 min
Classificação: 16 anos

Wilson Spiler

Will, para os íntimos, é jornalista, fotógrafo (ou ao menos pensa que é) e brinca na seara do marketing. Diz que toca guitarra, mas sabe mesmo é levar um Legião Urbana no violão. Gosta de filmes “cult”, mas não dispensa um bom blockbuster de super-heróis. Finge que não é nerd.. só finge… Resumindo: um charlatão.
NAN