REVIEW | ‘Nier Automata’ é esplêndido e sem defeitos, ou seja magnificamente perfeito!

Stenlånd Leandro

Há muito tempo atrás (exatos 20 anos), questionava-me sobre como seria o processo de desenvolvimento de um jogo de videogame fosse ele 8, 16 ou 32 bits. Naquela época, onde Super Nintendo, Playstation 1 e Sega Saturno disputavam acirradamente por um espaço na mídia, tudo era mágico. Era legal comprar sua revistinha da Super Game Power ou Ação Games e ver os próximos lançamentos somente ali. Aliás, se existia internet nesse planeta, o Brasil não a conhecia ainda.

Como qualquer trabalho decente, desenvolver um jogo exige um cuidado minucioso e pode envolver diversas pessoas dedicadas exclusivamente à produção. O primeiro passo, claro, é ter uma boa ideia do overall. Saber que público atingir e a razão pela qual aquele jogo precisa ser desenvolvido são detalhes muito importantes, ainda mais quando ele vem de um estúdio independente com raríssimas oportunidades de ter um projeto de sucesso. Seja indie ou não, o mesmo precisará de uma empresa que apostará no seu sucesso e será preciso correr atrás dos chamados publicadores, que na verdade são grandes empresas especializadas em games e dispostas a investir no ‘sonho’ do desenvolvedor de ter um jogo rodando o mundo inteiro. Não basta somente vender a ideia. E é aí que Nier Automata entra. A famosa Platinum Games, conhecida pelo desenvolvimento de Bayonetta, que chegou aos consoles pela Sega, precisava mais uma vez de uma empresa que acreditasse em seu novo jogo. Foi quando veio a Square Enix, que fez uma aposta certeira e vou te explicar o por quê.

Poucos sabem a origem de Nier Automata. Ele não se iniciou em 2010 com o primeiro jogo da franquia chamado Nier, que foi desenvolvido pela Cavia e distribuído pela Square Enix. Nier tem sua origem – ainda que como spin-off – em Drakengard, que teve um certo burburinho em diversos países, mas que não ficou tão conhecido nas Américas. A história do título de 2010 se passava no ano de 3361, um futuro totalmente pós-apocalíptico e muito distópico, onde a civilização caiu em ruínas após uma catástrofe desconhecida por volta do ano de 2049 e boa parte da população humana foi dizimada. A humanidade perdeu a sua tecnologia e passou a viver de uma forma que remete à nossa Idade Média. Já em Nier Automata, a coisa é um bocado diferente e apesar de compartilhar o mesmo universo do primeiro jogo da assim dita franquia, aqui tudo envolve tecnologia. Você é uma androide chamada B2, que tem como missão restabelecer um pouco de paz junto ao que restou da humanidade. A resistência humana (ou o que restou da humanidade) luta diretamente contra uma invasão de robôs de outro planeta que tomam diversas formas de objetos e estruturas que conhecemos no mundo todo. De cara, lembra muito o filme Transformers. É incrível como uma plataforma de petróleo (ao menos parece uma) se torna o nosso primeiro inimigo principal no prólogo da trama. Nossa personagem, a já citada androie B2 (YoRHa No. 2 Modelo B), possui diversos movimentos de combate que lembram bastante Bayonetta, Devil May Cry, Enslaved Odissey to The West e, claro, God of War e Castlevania Lord of Shadows.

Não são só os movimentos da sexy personagem delineiam essa ‘obra de arte’ que chega ao Playstation 4 e ao PC. Se estaríamos empolgados com Nioh e Horizon Zero Dawn, Nier Automata não fica atrás. O primeiro mapa após o prólogo do game lembra muito open de The Witcher 3, mas por que estamos indo direto ao ‘segundo ato’ se podemos falar abertamente sobre as referências contidas no primeiro? Claro que sabemos que qualquer jogo envolve programadores de computador, designers gráficos, animadores e músicos que podem, a qualquer momento, ser convocados pelos estúdios para participar das diferentes fases de produção. No primeiro ato, por exemplo, temos o jogo se iniciando de uma forma que remete à clássicos shumps como Aegis Wings e Raiden, mas quase que, ao mesmo tempo, tudo muda. Um bocadinho mais para frente temos essa nave se transformando em uma espécie de robô voador que desperta lembranças de jogos como Gundam W, Dynasty Warrior Gundam e até mesmo Super Robot Taisen. Quando você menos espera (coisa de uns 3o segundos depois), o game já muda sua câmera e formato e começa a relembrar um dos grande clássico da Taito chamado Darius. É joguinho de nave mesmo. Ok… passadas essas impressões, temos a aventura começando da forma como foi mostrada em sua demo, ou seja, com sua personagem B2 saindo da nave e iniciando a trajetória a pé contra algumas máquinas (robôs) semelhantes ao R2-D2. Talvez daí tenha vindo as nomenclaturas dos personagens que outrora, em seu predecessor, não existiam. O jogo é uma mistura de combate estilo hack ‘n slash, Metroidvania, Plataforma e Action RPG, mas por algumas vezes também conseguimos, baseado no ângulo da câmera visto por cima, recordar também jogos como Champions of Norrah e Baldur’s Gate, ou seja, Nier Automata é um mar de breves referências a outros gêneros e games, uma coisa que a Platinum Games faz de melhor, com elementos da mecânica do game original para linkar com o passado e também trazer a experiência do RPG contida na alma da franquia.

Se as referências acima o enjoaram, ainda assim, elas não param por aí. O jogo tem montarias, algo inexistente na demonstração. Também possui algo que só conseguir ver até hoje no Final Fantasy XV (outro jogo da Square Enix): o famoso minigame de pesca, que, na verdade, esteve sempre presente em diversos jogos asiáticos.  Aí está a cereja do bolo: Nier Automata não é nem um pouco asiático. Apesar de imaginar que um dia o Japão venha a sofrer uma rebelião das máquinas no futuro, adiciono que Asimov amaria jogar esse game. Aliás, não somente ele, mas também Willian Gibson. Tem muita referência de Star Wars e Eu, Robô nesse jogo e nada mais me faz lembrar senão desses autores citados. É indiretamente uma batalha intergaláctica.

Saindo dos holofotes do que o jogo pode se mostrar como referência, temos um outro detalhe interessantíssimo aos cuecas de plantão.  Assim como Bayonetta, aqui vemos como o game explora a sensualidade feminina. Não é de hoje que desenvolvedoras utilizam o apelo de “mulheres com pouca roupa” para conquistar a atenção de público gamer, muitas vezes em sua maioria homens, mas escondem o fato de que muitas vezes o game nem é tão interessante assim. Essa fórmula está presente em JRPGs ou até mesmo em outros formatos como, além do já citado Bayonetta, Catherine e Dead or Alive. Essa adição, para muitos, pode ser irrisória, mas não para este gamer que vos fala através desta análise. A questão é: se grandes empresas apostam na sensualidade feminina para vender ou até mesmo influenciar a sua decisão de jogar, por qual razão questionaríamos? Você acredita que jogos mais fracos podem fazer mais sucesso pelo simples fato de mostrarem mulheres com pouca roupa ou essa é apenas mais uma característica do mundo dos games? Claro que nem sempre é assim. Estamos falando de um jogo onde tanto o desenvolvedor quanto o distribuidor, apostaram todas as suas fichas numa possível ‘continuidade’ daquilo que Bayonetta permitiu ser.

Quanto ao mundo em que se passa o jogo, as áreas são enormes e a presença de alguns robôs é repetitiva. Por diversas vezes, parece que os inimigos são exatamente iguais em todos os cenários, faltando um pouco de miscigenação no âmbito de modelos de máquinas a serem combatidas. Estamos falando de robôs assassinos.

Sobre melhorias de seu personagem, você não verá nada parecido com outros Actions RPG. A necessidade de melhorar seu personagem ou até mesmo seu POD e ficar farmando até subir de nível para lidar com bosses tem como foco itens de melhoria do mesmo. Você vive a vida de uma máquina, onde quando seu ‘life’ ou sistema em curto está próximo de explodir, a tela ficará com uma certa interferência, exatamente como deve acontecer com circuitos eletrônicos. Na hora de comprar itens, eles possuem uma nomenclatura estranha – MUITO ESTRANHA -, mas são seus detalhes que dizem exatamente o que você está comprando. Vale lembrar que, como todo bom RPG, cumprir missões secundárias ou equipar itens que melhoram os atributos farão com que seu personagem progrida indiretamente. Muitas vezes, para avançar na trama, as subquests forçarão você a realizar certas ações para que, em seu retorno, a real missão continue. É uma espécie de uma coisa leva a outra. E é aí onde teremos alternâncias de tons de esperança com melancolia, de destruição a ritmo frenético. Isso porque o jogo é muito melancólico. Por diversas vezes me senti solitário num mundo praticamente ausente de vida, fosse ela humana ou não. Até para encontrar os ditos robôs e combatê-los era uma tarefa complexa. Talvez porque Yoko Taro, o excêntrico diretor de Nier e Nier Automata, quisesse que o game trilhasse todo esse deserto descampado, envolto de um cenário sem vida.

Claro que, por mais que se sinta só, há seu companheiro POD que acompanhará em todas as missões e você também, como dito, poderá melhorar os atributos do mesmo e construir até versões muito diferentes – e mais fortes – da inicial dada a você. O Pod que te acompanha fornece a ‘habilidade’ de plainar por um certo momento (é bem rápido) e até mesmo disferir disparos altamente potentes ou simples tiros que lembram uma metralhadora. É através dele que sua vida como androide poderá se estender um bocado mais. Para isso, poderá instalar, por exemplo, chips que multiplicarão seu ganho de EXP, aumentar seu HP, entre outros atributos que valem a tentativa. Exemplo disto é que, ainda que fosse no início, upar o personagem é um suplício, visto que o que mais aparece em sua frente são personagens do level 1, enquanto eu já estava no 10. É necessário ficar atento no recolhimento de itens (loot) para que futuramente o assim chamado ‘ferreiro’ possa melhorar seus equipamentos. Por diversas vezes acabei me deparando com vilões com um nível muito acima do meu. Era impossível matá-lo, por mais que ficasse ali por horas pegando a mecânica de ataque do personagem, se esquivando dos mesmos e tentando executá-lo. Tudo em vão.

Já no teor técnico, o Playstation 4 roda Nier Automata lisamente em 60fps. As sombras, as cores, os detalhes provindos da textura do jogo são belíssimos. Claro que todos os jogadores possuem o costume de comparar jogos, não importando se eles são de gêneros, plataformas ou gerações diferentes. A presença da Platinum Games assegura facilmente que o game seja tudo aquilo que foi prometido. Num gênero onde tudo pode acontecer, inclusive mistura de outros estilos e influências de outros jogos,  o critério principal aqui não será o nível de realismo oferecido, mas o que o título consegue entregar aos fãs fiéis que aguardaram por longos anos até que o game fosse lançado.

De todos os fatores que compõem um ótimo jogo, como é o caso de Nier Automata, uma coisa é certa: nunca é dada a devida atenção à importância de uma trilha sonora bem feita. Desde composições simples de 8-bits a arranjos altamente orquestrados, a música pode ajudar a criar um clima e enriquecer a experiência. Composta por Okabe Keiichi, Hoashi Keigo e Takahashi Kuniyuki,  Nier Automata tem uma exímia trilha sonora que acaba criando uma atmosfera capaz de envolver os jogadores e ajudá-los a resolver certos enigmas durante sua jogatina.

O VEREDICTO

Com uma narrativa envolvente e simples, lindos gráficos, trilha sonora encantadora e diversas referências aos jogos do passado, Nier Automata é tudo aquilo que gostaríamos de ver em um Action RPG com pitadas Hack ‘n Slash. Não somente por isso, mas a ideia  de Yoko Taro da Square Enix em convencer o pessoal da Platinum Games de trabalhar com ele nesse projeto, que não inova tanto quanto poderia, mas mostra que pode trilhar com êxito mesmo com um emaranhado de jogos similares por aí. Excepcional em todos os quesitos, este jogo vai ficar na história como um dos melhores – senão o melhor – jogos de 2017, ao lado de Nioh e Horizon Zero Dawn.

Nier Automata‘ foi testado pela equipe do Blah Cultural no Playstation 4.
Jogo gentilmente cedido pela Square Enix

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Stenlånd Leandro

Leandro não é jornalista, não é formado em nada disso, aliás em nada! Seu conhecimento é breve e de forma autodidata. Sim, é complicado entender essa forma abismal e nada formal de se viver. Talvez seja esse estilo BYRON de ser, sem ter medo de ser feliz da forma mais romântica possível! Ser libriano com ascendente em peixes não é nada fácil meus amigos! Nunca foi...nunca será!
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