Ao Seu Lado
Crítica do filme
Foi inevitável. Quando vi Humphrey Bogart interpretando um garimpeiro que enlouquece por causa da cobiça, pensei, imediatamente, no Golum, de “O Senhor dos Anéis”. Só faltou ele falar my precious, pois o olhar alucinado e o raciocínio conturbado que atrapalha a forma como as palavras são pronunciadas são os mesmos. Coincidência? Provavelmente, uma vez que J.R.R. Tolkien publicou o seu best-seller em 1954 e o longa-metragem em questão, O Tesouro de Sierra Madre (The Treasure of The Sierra Madre), é de 1948. A menos, claro, que a inspiração tenha se dado ao contrário e o autor britânico tenha homenageado o personagem americano, por sinal, também oriundo de um livro. Duvido. Foi uma daquelas coincidências gostosas com as quais, às vezes, nos deparamos. Agora, certeza mesmo é que Bogart está fantástico.
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Dirigido e roteirizado por John Huston, cineasta com quem o astro fez alguns dos seus melhores trabalhos, este clássico narra a história de três garimpeiros americanos, Dobbs (Humphrey Bogart), Curtin (Tim Holt) e Howard (Walter Huston), que unem forças para procurar ouro nas montanhas mexicanas. Inicialmente, eles não se conhecem. Passando necessidade em terra estrangeira, a impressão é de que o destino forçou o encontro deles. Dobbs e Curtin travam o primeiro contato quando são recrutados para um trabalho temporário. Até aí tudo bem. O problema é que novo patrão é um vigarista que costuma passar a perna em seus empregados. Dito e feito, os novos amigos se veem, mais uma vez, na rua da amargura, forçados a dormir em uma estalagem de quinta. E é lá que eles se deparam com o experiente Howard, homem que já se viu frente a frente com a fortuna e perdeu tudo.
Não sei qual é pegada do romance homônimo escrito em 1927 por B. Traven, um autor alemão que fez sucesso nos Estados Unidos. No entanto, a intenção de John Huston foi bem clara e igualmente bem realizada. O filme, que começa como uma aventura recheada de um humor peculiar – prestem atenção na cena em que Dobbs pede esmola três vezes para o mesmo homem – se transforma em uma espécie de western em que, de início e propositalmente, não fica claro quem é quem. Em um México onde as chagas de sua sangrenta revolução civil ainda não cicatrizaram, os protagonistas são forçados a firmarem alianças de última hora se quiserem sobreviver aos ataques de bandoleiros que perambulam pelas estradas. Desta forma, o papel de cada um deles é delineado aos poucos e à medida que a história toma corpo.
Este é um daqueles clássicos quem sempre ouvi falar e por algum motivo nunca tinha assistido. A motivação de decisiva veio com o livro “Bogart: Em busca do meu pai”, de Stephen Humphrey Bogart. Nele, lá pelas tantas, o filho do ícone enumera os filmes que ele considera fundamentais para a formação do culto em torno do nome do seu progenitor, nos anos seguintes a morte deste: “Seu Último Refúgio” (1941), “Relíquia Macabra” (1941), “Casablanca” (1942)”, “Uma Aventura na África” (1951) e, claro, a película em questão. Independentemente das razões do autor, a verdade é que Bogart está realmente fantástico e tem talvez a melhor atuação de sua prolífica carreira. Esta interpretação lhe rendeu uma indicação de melhor ator no Oscar de 1949. Contudo, ele não é o único a desfilar todo o seu imenso talento na tela.
Pai do cineasta, Walter Huston faleceu dois anos depois do lançamento de O Tesouro de Sierra Madre, logo, este foi um dos seus últimos filmes e o que fincou o seu nome, definitivamente, no rol dos grandes atores. Pela interpretação do divertidíssimo e perspicaz Howard, ele, que já havia sido indicado duas vezes, uma delas pelo excepcional musical “A Canção da Vitória” (1942), ganhou a estatueta de melhor ator coadjuvante. Ao receber o prêmio, contou que, uma vez, virou para o filho e pediu: “Se um dia você se tornar um diretor, não se esqueça de me arrumar bons papéis”. Um pouco depois, ao encerrar o seu discurso de agradecimento, vendo que seus colegas sorriam e aplaudiam, o velho Huston exibiu um largo sorriso de volta. Naquele momento, a ficha caiu e uma certeza invadiu seus pensamentos: o pedido fora atendido.
Desliguem os celulares e excepcional diversão.
Título original: The Treasure of Sierra Madre
Direção: John Huston
Elenco: Humphrey Bogart, Walter Huston e Tim Holt
Distribuição: Warner Bros
Data que estreou: 06/01/1948
País: Estados Unidos
Gênero: aventura e western
Ano de produção: 1948
Duração: 107 minutos