Ao Seu Lado
Crítica do filme
Depois de cinco filmes (2002, 2004, 2007, 2012 e 2014) e dois protagonistas diferentes (Toby Maguire e Andrew Garfield), os produtores, enfim, parecem ter acertado e finalmente conseguirão agradar gregos e troianos, ou melhor, aranhas e abutres. O sexto capítulo da franquia, que na verdade é um reboot, arrancou elogios entusiasmados da crítica norte-americana, encantou a imprensa brasileira nas exibições prévias feitas em São Paulo e no Rio de Janeiro; e tem potencial para conquistar o grande público. Entre algumas das explicações para este feito, que parecia ser uma missão digna dos Vingadores, está a acertadíssima escolha de Tom Holland para viver o novo Peter Parker. O jovem ator britânico, de apenas 21 anos, conseguiu compor um personagem bem mais parecido com o dos quadrinhos do que os seus antecessores. A patetice abobalhada de Maguire, um verdadeiro looser, e a falta de carisma de Garfield deram lugar a um herói autêntico que, durante quase duas horas, enfrenta uma árdua jornada de amadurecimento e termina este Homem-Aranha: De Volta ao Lar (Spider-Man: Homecoming), do cineasta Jon Watts, pronto para alçar novos voos, como veremos nos próximos longas do Universo Marvel.
CRÍTICA #3 | Homem-Aranha: De Volta ao Lar é divertido e levemente nostálgico
CRÍTICA #4 | ‘Homem-Aranha: De Volta ao Lar’ é um um grande recomeço do herói e traz grandes expectativas
O filme começa um pouco depois dos eventos de “Capitão América: Guerra Civil” (2016). Levado de volta para casa por seu mentor, Tony Stark (Robert Downey Jr.), o Homem-Aranha é orientado a aguardar um novo chamado quando, digamos, as coisas esquentarem. Seu contato é o motorista e segurança Happy Hogan (Jon Favreau). Acontece que os dias vão passando e ele fica completamente entediado. Prender ladrões de bicicletas, ou ajudar velhinhas dominicanas que estão perdidas, não é tão charmoso quanto enfrentar o Capitão América (Chris Evans). Paralelamente, sua vida como estudante não é muito diferente de qualquer outro adolescente. Junto com o seu melhor amigo, Ned Leeds (Jacob Batalon), Peter frequenta a escola e sofre bullying nas mãos de Flash Thompson (Tony Revolori), aqui, inusitadamente retratado como um garoto de tez morena e origem latina (nos quadrinhos, ele é loiro, forte e um esportista nato). Há, ainda, a relação, nem sempre simples, com a tia May (Marisa Tomei). Contudo, o nosso herói terá a chance de provar o seu valor ao se apaixonar por Liz Allan (Laura Harrier), a menina mais popular do colégio, e ao se deparar com um bandidão.
O bandidão em questão, brilhantemente interpretado por Michael Keaton, é Adrian Toomes, um empreiteiro contratado pela prefeitura de Nova Iorque para limpar a bagunça da batalha com Loki (Tom Hiddleston) e os aliens da raça Chiatauri, mostrada em “Os Vingadores” (2012). Posto para fora da jogada com a entrada em cena da Stark Entreprises, o vilão decide que não sairá de mãos abanando e rouba destroços que possuem resquícios de tecnologia alienígena. Usando de engenharia reversa, ele constrói o par de asas que o transformará no Abutre, um dos grandes inimigos do Homem-Aranha, e armas de alto poder de destruição para serem vendidas no mercado negro. Assim, entre uma negociação e outra, os caminhos de Toomes e Parker se cruzarão. Lembram o que escrevi lá em cima sobre a árdua jornada de amadurecimento do protagonista? Então, mais até do que Stark em seu papel de mentor e espécie de pai postiço, o Abutre será fundamental para esta transformação. E a química entre os personagens, na verdade, entre Holland e Keaton, é, de longe, a melhor coisa do longa-metragem.
Se o jovem intérprete britânico incorporou o Homem-Aranha mais semelhante ao dos quadrinhos, o veteraníssimo ator norte-americano deu forma a um antagonista à altura, crível e com a envergadura moral dos grandes mafiosos (ainda que esta seja incapaz de validar seus crimes). Claro que existe o rancor em relação a Tony Stark e aos grandões, como ele se refere aos demais super-heróis, mas a justificativa de Adrian Toomes é que de ele faz tudo o que faz pela família. A família é a sua motivação principal. Este sentimento fica absolutamente claro em uma conversa dentro de um carro, cara a cara, entre o vilão e o herói. Mais do que qualquer outro instante, este é momento emblemático da história. O ápice do embate envolvendo dois homens completamente diferentes. Vendo o filme, outra coisa também me chamou a atenção: o Abutre tem um quê de Darth Vader, ainda que este seja sutil e se configure através da música que pontua a tensão crescente de todas as lutas. É a sua marcha imperial.
Se não há uma tomada espetacular, daquelas de tirar o fôlego, tal qual acontece em “Mulher Maravilha” (2017), da concorrente DC, ou efeitos especiais inebriantes como os de “Doutor Estranho” (2016) e “Guardiões da Galáxia: Volume 2” (2017), Homem-Aranha: De Volta ao Lar é extremamente hábil no seu intento de rebootar a franquia do personagem mais popular do Universo Marvel. Este sucesso se deve ao investimento maciço em um roteiro bem amarrado, ótimos personagens e uma história bastante humana. Esqueçam a ideia de que blockbusters precisam ser grandiloquentes, pois temos aqui mais uma prova de que eles podem ser filmes de atuações. Neste aspecto, a comparação é óbvia: o longa de Watts segue o caminho trilhado, anteriormente, por “Batman: O Cavaleiro das Trevas” (2008) e “Logan” (2017). No entanto, se vocês esperavam algo grandioso, por favor, não encuquem. Eu garanto que, no mínimo, irão se divertir. São muitas as cenas engraçadas, inclusive uma onde é feita uma referência explícita ao clássico máximo de John Hughes: “Curtindo a Vida Adoidado” (1986).
Desliguem os celulares e ótima diversão.