Ao Seu Lado
Crítica do filme
Dividido em capítulos, como se fosse um livro, a trama de A Favorita (The Favourite), filme dirigido por Yorgos Lanthimos, se passa na Inglaterra do século XVIII. O longa, que recebeu diversos prêmios no Festival de Veneza, revela um ar de ironia e drama ao mesmo tempo e retrata com bastante precisão a hierarquia e o período monarca da Inglaterra na época entre a Guerra de Sucessão Espanhola (quando estava em conflito lutando com o Sacro Império Romano Germânico e os Países Baixos contra a França e Espanha) até o fim da disputa e início de uma possível aliança com o império Francês.
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A Rainha Anne (Olivia Colman) sofreu de saúde ruim por toda sua vida, tendo ficado cada vez mais manca e corpulenta a partir dos trinta anos de idade. O filme faz um retrato realístico perfeito dessa situação. Historicamente, há registros de que ela tinha sérias doenças de estômago, dores nas pernas, e indícios de alguma enfermidade parecida com Gota, que não tinha diagnóstico preciso ou tratamento na época e que foi levando-a a ter dificuldades para caminhar tendo que se movimentar via cadeira de rodas e ter ânsias de vômitos constantes após comer. Apesar de ter ficado grávida 17 vezes do seu marido, não conseguiu ter nenhum herdeiro, tendo sido assim, a última monarca da Casa de Stuart. O longa retrata que ela teria substituído cada filho perdido em aborto espontâneo ou natimorto por um coelho, tendo assim em seus aposentos também 17 “crianças”, como a própria os chama na trama.
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Em termos de produção, A Favorita revela, além de um filme de época baseado em fatos, um esplendor visual esperado para esse tipo de história: as locações transmitem a abundância em termos de bens materiais com riqueza de detalhes, cômodos do castelo que tiveram a perspectiva ampliada através de uso de câmera olho de peixe, as vestimentas, figurinos que retratam época antes da Era Vitoriana, o uso de joias e perucas ou penteados, maquiagem adequada para a época, que trazem perfeita personificação e caracterização dando personalidade ao longa.
O uso de trilhas sonoras fortes e impactantes com bastante musica clássica e orquestras sinfônicas aliadas a cenas gravadas em câmera lenta e imagens fixas, acompanhando movimento dos personagens fazendo balanços em 180 graus, deram bastante drama à produção, que foi reforçado pela paleta de cores em tons frios azulados e acinzentados. Algumas cenas podem causar certo estranhamento, pois a fisheye e os planos fechados com lentes angulares extremas podem dar a ideia de ver através de olho mágico de uma porta, mas nada que desabone o filme.
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A iluminação também acentua os contrastes de luz do dia entrando por janelas sem clarear completamente os aposentos e, por isso, para quem busca um retrato fiel aos modos, nomes, dados históricos, A Favorita cumpre seu papel. E este é um dos maiores valores que você encontrará na película, pois honrou o período a que se refere.
Os nobres se divertem com animais um tanto quanto pitorescos, como coelhos e patos, e mesmo mulheres costumam sair para treinar tiro ao alvo acertando pássaros. O linguajar também não é culto e lapidado como estamos acostumados, o que aproxima os diálogos de uma sátira que usa de insultos, vulgaridades e maus modos à mesa, além de carcaças de animais expostas, retratando uma bela crítica ao modo luxuoso como a sociedade burguesa vivia. E segue assim, também, nas cenas nos jardins do palácio e nas conversas com sua amiga Sarah (Rachel Weisz), percebe-se a rainha vivendo em universo-bolha onde ela não tem ideia do que se passa no mundo exterior ou até mesmo dos arranjos políticos de seu próprio reinado.
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Depois de elucidar um pouco o contexto histórico, onde a trama se passa, pode-se dizer que A Favorita se trata de um filme épico, dramatúrgico, quase a composição de uma obra Shakesperiana. Dividido em atos como o teatro e tratando-se de uma tragicomédia muito bem representada pelos atores que estão escrachados de maneira positiva, com diálogos rápidos e certeiros. Abigail (Emma Stone) é prima distante de Sarah e, após ter a queda de seu pai que costumava ser bem de vida, ela decide ir à Corte para tentar se aproximar da parente e conseguir algum cargo lá dentro. De aparência angelical, a atriz consegue se camuflar tanto em sua personagem que quase não se nota inicialmente que é a responsável pelo papel. Já a enciumada e manipuladora Sarah Churchill, braço direito da rainha nos assuntos políticos, é retratada como amante de Anna. Abigail chega para abalar as estruturas da Corte. Os demais criados, por saberem de seu parentesco, com Churchill, pregam diversas peças nela, mas ela sabe se utilizar dessas mazelas para encontrar algum caminho para crescer no local. Aos poucos, vai se infiltrando como uma parasita demonstrando que algo bom não sairia dali. Com uma personalidade frágil, infantil e imatura, a rainha tenta sempre chamar a atenção para si ou utiliza-se de seus mal estares para sair de situações desconfortáveis de governo. A amizade de Anne com Sarah, Duquesa de Marlborough (assim ela é chamada no longa) foi-se desfazendo por diferenças políticas (ou por questões de ciúmes da relação com Abigail, como fica implícito).
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Ficam algumas perguntas na trama: qual delas é A Favorita? Qual das duas é a mais manipuladora ou tem melhor senso de humor e consegue entreter a rainha que as usa como bobo da corte, como dama de companhia, como amante e conselheiras? Trata-se de um filme sobre ascensão e decadência do começo ao fim, que mostra o jogo de poder, mas, ao mesmo tempo, traz a mensagem de empoderamento feminino. Com excelentes atuações, fica bem difícil separar a protagonista (ou antagonista) das coadjuvantes e sentimos uma vibe de Oscar por aí! Veja os horários de exibição do filme na Mostra de SP.
Título original: The Favourite
Direção: Yorgos Lanthimos
Elenco: Emma Stone, Rachel Weisz, Olivia Colman
Distribuição: Fox
Data de estreia: qui, 24/01/19
País: Estados Unidos, Reino Unido
Duração: 120 minutos
Gênero: drama
Ano de produção: 2018
Classificação: 14 anos