Snyder Cut

Snyder Cut: a redenção de Zack

Guilherme Farizeli

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22 de fevereiro de 2021

Primeiramente, o objetivo deste artigo não é exaltar ou defender Zack Snyder. A carreira do diretor fala por si só. Assim como a bilheteria de seus filmes. Não que isso seja referência, afinal, a avaliação da qualidade de um artista envolve uma série de questões.

Contudo, não vou me furtar de opinar, já que estou aqui no papel de “contador da história”. Eu acho o trabalho de Snyder divertido. Gosto bastante de alguns filmes e outros acho apenas ‘ok’. No caso do universo de filmes da DC, meu envolvimento emocional com esses personagens provavelmente me deixa mais paciente com eventuais pisadas na bola. Para Snyder, esse foi o ônus e o bônus de trabalhar com tais personagens.

A história do Snyder Cut

A história do corte de Zack Snyder para Liga da Justiça começou no início da década. Lá em 2010, o diretor foi chamado pela Warner Bros para desenvolver um universo de filmes dos personagens mais famosos da DC Comics. Certamente, o estúdio estava de olho no crescimento do universo dos filmes da Marvel. Faltou, no entanto, observar o cuidadoso planejamento estratégico do vizinho, comandado por Kevin Feige.

Snyder recebeu a promessa de autonomia e liberdade criativa. E, de antemão, utilizou essa liberdade para estabelecer seu plano: um arco de cinco filmes a transformação de Clark Kent em Superman. Desde o início, o estúdio estava ciente de que a abordagem seria diferente, por exemplo, da versão icônica do personagem, interpretada por Christopher Reeve. Nesse sentido, o diretor já afirmou que, sendo um pai adotivo, se interessou mais ainda em contar a saga desse ser extraordinário que se transforma no maior herói de todos os tempos graças, em boa parte, ao amor recebido de seus pais adotivos.

Snyder filmando a Liga (foto por Clay Enos)

Superamigos? Com certeza!

Dentro do universo planejado por Snyder também estavam presentes outros personagens. Todo eles fariam parte do amadurecimento de Clark e também ganhariam suas aventuras solo. O plano audacioso de diretor, portanto, continha a seguinte espinha dorsal:

  • Primeiro filmeO Homem de Aço: único filme em que Snyder conseguiu trabalhar com a liberdade criativa prometida. Aqui, temos o início da jornada de Clark (Henry Cavill), desde Krypton até a descoberta do Superman pelo mundo. Snyder escolheu caminhos difíceis aqui, como a morte de Jonathan Kent (Kevin Costner) e a morte de Zod (Michael Shannon) pelas mãos do herói.
  • Segundo filmeBatman Vs. Superman: A Origem da Justiça: do título até o corte final, foi a primeira interferência do estúdio no material pretendido por Snyder. O conflito principal do filme deveria ser a reação da humanidade, exemplificada por Bruce Wayne (Ben Affleck), à presença de um poderoso alienígena na Terra. A morte do Superman daria início ao conflito principal do arco de 5 filmes.
  • Terceiro filme – Liga da Justiça Parte I: a gente sabe como a história terminou, né? Ou, vamos saber em 18 de março, com o Snyder Cut. Em entrevista a Vanity Fair, o diretor falou sobre a intenção de aproximar Bruce e Lois Lane (Amy Adams). “A intenção era que Bruce se apaixonasse por Lois e então percebesse que a única maneira de salvar o mundo era trazer o Superman de volta à vida”, disse Snyder.

Então ele teria um conflito insano, porque Lois, é claro, ainda estava apaixonada pelo Superman. Teríamos um belo discurso em que [Bruce] diria a Alfred: ‘Eu nunca tive uma vida fora da caverna. Nunca imaginei um mundo para mim além disso. Mas essa mulher me faz pensar que, se eu conseguir reunir esse grupo de deuses, meu trabalho estará feito. Eu posso desistir. Eu posso parar.’ E, é claro que isso não funciona para ele.

O glorioso BatAffleck (foto por Zack Snyder)

O sacrifício de Bruce

A conclusão do arco, com os quarto e quinto filmes envolveriam mais decisões ousadas.

  • Quarto filme – Liga da Justiça Parte II: aqui, já cientes da ameaça Darkseid, os heróis se preparariam para uma grande batalha. O vilão, no entanto, acabaria matando Lois Lane. Esse fato permitiria a entrada da equação Anti-Vida no coração de Clark, dando origem ao futuro visto por Bruce em seus pesadelos. É isso aí, um Superman do mal. O Flash (Ezra Miller) do futuro voltaria dessa vez na hora certa (vocês lembram do Am I too soon?, né?) e explicaria tudo para Bruce. A chave, portanto, seria evitar a morte de Lois. No final do filme, o Batman voltaria no tempo, se sacrificaria no lugar de Lois e evitaria que o Superman se entregasse ao lado negro da força.
  • Quinto filme: a saber, poucas informações foram divulgadas até aqui, mas seria o embate final da Liga da Justiça contra Darkseid. No final, Clark e Lois teriam um filho e lhe dariam o nome de Bruce.

Tragédia muda a perspectiva

A falta de planejamento estratégico do estúdio era bem clara. Os desencontros entre Snyder e o estúdio, que vinham de BvS, chegaram com tudo em Liga da Justiça. O estúdio não aceitou a maioria das ideias do diretor. Recusou a ideia de dois filmes, bem como exigiu que a duração máxima do longa fosse de duas horas.

Em meio a esse caos, uma tragédia. Autumn, a jovem filha do diretor, tirou a própria vida. Zack Snyder ainda tentou por alguns meses focar no trabalho, mas queda de braço com o estúdio mostrou-se infinitamente menos importante do que estar em casa com a família. A Warner Bros contratou Joss Whedon para reformular todo o filme, se afastando da visão de Snyder. O resultado, nós já sabemos qual foi. O pior é que, no final das contas, nem a Warner ficou satisfeita com o resultado. Na mesma matéria da Vanity Fair, um executivo que pediu anonimato comentou que “quando pudemos ver o que Joss realmente fez, foi espantoso! O ladrão no telhado – tão bobo e horrível. A família russa – tão inútil e sem sentido. Todo mundo sabia disso. Foi tão estranho porque ninguém queria admitir que porcaria era aquela“.

Release the Snyder Cut

Os fãs do universo criado por Snyder até então ficaram inconformados com o resultado final. Não era aquele filme da Liga da Justiça que todos esperavam. Logo depois, esses mesmos fãs criaram o movimento #ReleasetheSnyderCut. Mais do que a vontade de assistir o filme idealizado pelo diretor, o movimento visa ajudar uma causa nobre. O movimento contribuiu com meio milhão de dólares para a American Foundation for Suicide Prevention por meio de doações, vendas de camisas, canecas e leilões de adereços dos filmes.

Zack Snyder e Gal Gadot (foto por Clay Enos)

A Warner, que não é boba nem nada, viu o apelo que o Snyder Cut poderia ter e convidou o diretor a voltar e fazer o lançamento. A proposta inicial era que Snyder lançasse uma versão crua do longa, que ele manteve em seu notebook logo depois da saída do filme, em 2017. A ideia foi imediatamente rechaçada pelo diretor. Com o aporte financeiro da HBO Max e o desejo de popularizar a nova plataforma de streaming, foi anunciada a Liga da Justiça de Zack Snyder.

Logo depois, o diretor estimou um orçamento de cerca de US$ 70 milhões para desfazer o que Whedon fez. O próprio Snyder não ganha nada. “Não estou sendo pago”, diz ele. Ele foi pago pela primeira vez, é claro. Desta vez, ele quer controle criativo e abrir mão do pagamento ajudou. “Eu não queria ficar em dívida com ninguém, e isso me permitiu manter meus poderes de negociação com essas pessoas muito fortes.”

Vitória dos fãs, enfim

Acima de tudo, o lançamento do Snyder Cut é uma vitória daqueles que curtiram o trabalho desenvolvido por Zack até o momento. Nesse sentido, eu não faço parte do time daqueles que acham que o diretor é um enganador. Pelo contrário, acredito que ele tem boas ideias. Contudo, se a Warner queria algo similar ao que a Marvel faz, colocou os pés pelas mãos.

Enfim, aproveito a diversidade de sentidos da palavra redenção para concluir: o Snyder Cut é uma maneira da Warner se redimir com Zack. Além disso, é a chance do diretor lançar um bom filme e retornar a um patamar de sua carreira que ficou em um passado não tão distante. Em conclusão, Liga da Justiça de Zack Snyder chega ao Brasil em 18 de março, on demand. O diretor prometeu, inclusive, uma participação especial bombástica no final do filme. Estamos ansiosos ou não?

Jared Leto como Coringa (foto por Zack Snyder)

Guilherme Farizeli

Músico há mais de mil vidas. Profissional de Marketing apaixonado por cinema, séries, quadrinhos e futebol. Bijú lover. Um amante incondicional da arte, que acredita que ela deve ser sempre inclusiva, democrática e representativa. Remember, kids: vida sem arte, não é NADA!
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