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Foto: Divulgação

Ian Lassere e a poesia em forma de música

Wilson Spiler

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5 de novembro de 2022

O cantor baiano Ian Lasserre lançou, nesta sexta-feira (4), o single “Eu Vim Para Cantar”, nas principais plataformas digitais. Com a colaboração dos músicos Victor Cabral na bateria e percussão, Rafa Castro no piano, Conrado Goys na guitarra e Igor Pimenta no baixo, a faixa faz parte do novo álbum do músico, Meu Único Medo é Primavera, que será lançado em 2023.

Ian Lasserre já lançou dois álbuns pela gravadora sueca ajabu. O álbum “Átimo” ficou entre os 100 melhores álbuns da World Music Charts Europe no ano de 2020. Sua canção “Minha Bahia” hoje ultrapassa a marca de 500 mil plays na plataforma Spotify.

Para aproveitar o novo lançamento, o cantor Ian Lasserre conversou com o ULTRAVERSO sobre a música, o futuro álbum, a carreira e, claro, o Brasil como um todo. Confira o bate-papo:

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ULTRAVERSO: Eu Vim Pra Cantar, seu mais novo single, mistura bastante poesia, assim como seus trabalhos no geral. Você lê muito? Quais são suas referências literárias?

Ian Lasserre: Uma das canções do álbum, “Abraxas”, minha e do Flavio Tris, é baseada no livro “Demian”, de Hermann Hesse, que amplia a percepção do bem e do mal. Na literatura brasileira atual, me encantei com o romance “Torto Arado”, de Itamar Vieira Jr, contando uma estória fantástica desse Brasil baiano da chapada diamantina.

O mais legal disso é que eu morei dois anos durante a pandemia no sul da chapada, então, quando li esse livro na cidade de São Paulo, foi bastante paradoxal e inspirador, pois pude realmente imaginar os cenários e objetos descritos lá rememorando minhas próprias vivências na zona rural da chapada.

No momento, estou lendo “O Assassinato de Cristo”, de Wilhelm Reich. Esse último livro faz uma crítica fantástica a uma humanidade em decadência, refletindo a angústia criada pelos “homens encouraçados” para compreender o que levou Cristo à cruz e como existe uma força no mundo que é antivida. Eu me arriscaria em dizer que os encouraçados de Reich teriam hoje um outro termo mais contemporâneo que reflete esse comportamento da extrema-direita.

Você é baiano, da MPB e tem um timbre, bem como um ritmo de cantar muito semelhante com o de Caetano Veloso. Alguém já fez essa comparação?

Ian Lasserre: Olha, não vou mentir que já, mas ultimamente não tenho escutado mais isso. Para mim é uma alegria que exista essa comparação, afinal, eu acho que ele é o maior letrista, compositor que temos. Sou muito influenciado e fã da obra do Caetano, mas também me acho muito diferente em vários outros aspectos.

Tem vontade de fazer algum trabalho com Caetano?

Ian Lasserre: Eu tive a alegria de um amigo meu mostrar a minha canção “Minha Bahia” e acabou que o Caetano cantou junto o refrão e se mostrou feliz ao ouvir aquilo. Tenho tudo em vídeo, ainda bem! (risos). Seria uma honra, um sonho trabalhar com ele, e, como falei antes, realmente me envolvi com a obra do Caetano. Eu acabei levando a sério a sugestão da Adriana Calcanhoto quando canta: “Vamos comer Caetano/ Vamos desfrutá-lo”.

Fora Caetano, quais outros artistas são referência para você?

Ian Lasserre: Eu sou discípulo dos mestres baianos, talvez por ser soteropolitano e me identificar gratuitamente. Gil, Tom Zé, Caetano, João Gilberto, mas também adoro e escuto música de outros lugares como a do Toninho Horta, Moacir Santos, Milton Nascimento, Tom Jobim.

Atualmente, aqui no Brasil, existe uma cena muito legal surgindo de compositores que sou fã, como Luiz Gabriel, Paulo Ohana, Flavio Tris, Tiganá Santana, Letícia Fialho, Josyara, Bruna Moraes, François Muleka, Ana Barroso, entre tantos. Eu vejo coisas novas surgindo e com muita qualidade poética-musical e também inspiram bastante o meu fazer musical.

Você vai lançar em 2023 o álbum Meu Único Medo é Primavera, seu terceiro disco. O que podemos esperar dele?

Ian Lasserre: Você pode esperar a obra de um artista em metamorfose. A experiência que vivi durante a pandemia em uma realidade rural me trouxe reflexões e ideais novos para saborear o nosso devir. O álbum é um reflexo dessa transformação urbano-rural. Eu acho que eu sou uma pessoa muito visceral, entende? Note que não existe artigo no título. Meu único medo não é a primavera, ele é apenas primavera.

O álbum é baseado em um poema que escrevi antes da pandemia. Depois dele tudo mudou, pareceu um feitiço. Bem, por sorte nós tínhamos papel e caneta durante a borracheira de uma sessão de ayahuasca para escrever esses versos “Meu Único Medo é Primavera”. Versos que completavam a viagem espiritual: “os ventos não fazem curvas, certamente as esquinas se dobram aos ventos”.

Depois dessa experiência, a pandemia nos surpreendeu e muitas mudanças aconteceram na psique. Aposto que na de todos, mas o reflexo dessas transformações se imprime nas 11 faixas desse trabalho. Talvez “MUMEP” seja um retrato desses últimos quatro anos caóticos, ou quânticos.

O que mudou do Ian do primeiro para esse vindouro álbum?

Ian Lasserre: Mudou muita coisa, começando pela equipe. Meus últimos trabalhos foram produzidos pelo grande produtor sueco radicado em Salvador, Sebastian Notini. Dessa vez eu me aventurei ao lado do songwriter e produtor, no qual também sou fã, Rafa Castro, que é mineiro, então foi inevitável que o som mudasse muito.

Há uma fusão também com músicos incríveis daqui de São Paulo. Falo de Vitor Cabral na bateria, Igor Pimenta no baixo, Conrado Goys na guitarra, Sidmar Vieira no flugelhorn e o próprio Rafa Castro nos pianos e vozes. Estou muito feliz com o resultado desse trabalho e de ter convivido com esses artistas.

Seu trabalho tem muita influência familiar? Conte um pouco de como começou sua carreira.

Ian Lasserre: Meu avô era seresteiro, mas não deixou fonograma algum. Era um homem realmente talentoso e tinha um conhecimento de repertório da era pré-bossa e sambas raros como ninguém. Era capaz de tocar durante horas em uma festa e depois seguir para outra cantando mais algumas/muitas horas sem repetir o repertório. O amor e compromisso na hora de tocar o seu violão me encantaram desde quando pude presenciar aqueles atos nas rodas de família.

Meu pai também é músico e jornalista, e me incentivou a adentrar nesse universo musical. Então após eu ter participado de algumas bandas e trabalhos musicais como instrumentista, decidi gravar minha própria obra a convite da gravadora ajabu em 2014.

Você é um artista que se posiciona. Como vê a situação atual do Brasil e o que espera com o novo governo?

Ian Lasserre: Sim, minha posição é bem clara e antifascista. Eu acho que vivemos uma situação bem delicada, afinal as pessoas que apoiam o atual presidente estão perdendo as estribeiras do bom senso. Essas consequências vem parindo entre nós uma rivalidade absurda. Eu penso que a partir do momento que existe o fascismo, a rivalidade é fundamental.

Eu espero que o novo governo, a frente ampla liderada por Lula, traga para nós mais seriedade com as questões que são urgentes, como a fome, o meio ambiente e a legitimação das instituições democráticas.

Em uma canção do meu primeiro álbum canto algo que me parece muito atual “faltava raiz pra terra se juntar”. Vamos ter que cuidar da terra, cobrir o solo, regar periodicamente e reflorestar nosso sentimento para sonhar com um país que acolha o outro, e não sonhe com uma arma para matar a diversidade.

Nesse álbum, “MUMEP”, reflete esse universo da pandemia, do descaso e da banalização do mal. É uma costura de sentimentos polarizados que pintam esse set, mas também se fala de amor, do outro e da esperança.

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Além disso, claro, o (a) cantor(a) ou a banda precisa ter algo gravado com uma qualidade razoável. Afinal, só assim conseguiremos divulgar o seu trabalho. Enfim, sem mais delongas, entre em contato pelo e-mail wilson@ultraverso.com.br! Aquele abraço!

Wilson Spiler

Will, para os íntimos, é jornalista, fotógrafo (ou ao menos pensa que é) e brinca na seara do marketing. Diz que toca guitarra, mas sabe mesmo é levar um Legião Urbana no violão. Gosta de filmes “cult”, mas não dispensa um bom blockbuster de super-heróis. Finge que não é nerd.. só finge… Resumindo: um charlatão.
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