A última música de Glee

Paula Simões

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27 de março de 2015

Glee acabou e, de certa forma, não vai deixar tantas saudades, isso porque a série já deixa faz tempo O penúltimo episódio, que foi um flashback para 2009 e deixou bem claro o que se perdeu: a essência que o grupo original tinha como os excluídos tentando encontrar um espaço no mundo, ou se alimentando de sonhos de que iria dar tudo certo no final. Claro, problemas você resolve e depois vem outros, mas a série ficou confusa quando se dividiu em Ohio e Nova York, um pouco sem foco e cansativa, principalmente com o elenco novo em Ohio, tanto que eles não voltaram para a última temporada.

Algumas pessoas parecem perambular pela vida como se o caminho fosse tão simples e claro, sem grandes dramas ou frustrações, apenas existindo e sendo felizes. Nada de sonhos ou ambições que às vezes te esmagam com insegurança. Claro que o jardim do vizinho é sempre mais verde, ou com um filtro maravilhoso do Instagram, e Glee foi uma série sobre essa sensação: a de precisar sentir que no fundo você tem valor, mesmo que todos ao seu redor ignorem isso. Também foi quando diferentes tipos de pessoas, divididas entre nerds e populares do Mckinley High School, se juntaram em uma sala, expondo suas vulnerabilidades uns para os outros através da música, mostrando que não importa a sua reputação nas diversas microbolhas da sociedade, sempre haverá uma parte de nós vazia. Essa parte a gente só ocupa com nós mesmos e nos permitindo um pouco de alegria (joy) que foi repetida diversas vezes nesse final de temporada como a definição de Glee.

Glee is about opening yourself to joy”

Muita gente critica Glee e musicais em geral por acharem que não faz o menor sentido uma pessoa “do nada cantar sobre como a xícara de chá está quente”, mas um personagem dessa última temporada, sutilmente, traduziu o que realmente musicais e essa série em particular significam: Rodrerick Meeks. O gordinho desajeitado que estava sempre andando invisível pela escola com os seus fones de ouvido, deixando a música ocupar o seu espírito vandalizado pelas habituais práticas de bullying. É isso! Seja a xícara de chá quente, seja o seu chefe tendo um mal dia e descontando em você ou até aqueles fantasminhas de desânimo que perambulam pela nossa cabeça, cantar “do nada” é isso. Claro, que a sociedade é totalmente desencorajadora sobre cantar uma canção no meio do transporte público (acredite, eu sei!), então colocamos nosso fone de ouvido e nos transferimos para outro lugar, cantando na nossa mente.

Você não precisa ter 15 anos e ser um excluído no colégio para entender a mensagem que Glee tentou transmitir nas suas seis temporadas. Sobre aceitar uns aos outros e acima de tudo se aceitar, que é um drama universal que a maioria das pessoas carregam por toda vida. Parece clichê e um conselho óbvio, mas como disse a minha terapeuta outra dia, em uma adaptação livre aqui, a sociedade tenta colocar todo mundo em uma caixa, todos precisam ser iguais. Se um líder precisa ter as características x, y e z, então é isso que os RHs da vida vão fazer, te treinar em x, y e z. Não importa se suas qualidades e aquilo que te torna único está em a e b, a maioria das pessoas acabam sendo obrigadas a ignorar essas qualidades e tentam ser melhor nas características que elas não tem. E isso é o que causa tanta frustração, porque para ser bom em algo que não tem a ver com você, o esforço é enorme e o resultado é muito pequeno. Claro, se você é naturalmente desorganizado, é preciso melhorar isso, mas é preciso colocar esforço naquilo que te faz especial. E Glee fez isso. É até estranho a gente no Brasil se deparar com uma série que mostra um clube de coral em uma escola, quando aqui os colégios acreditam que temos que ficar a primeira parte da vida estudando para passar num vestibular, para então definirmos o resto de nossas vidas. Ficamos sem muitas opções de carreira fora da química, física, matemática e português. A não ser que nossos pais tenham dinheiro para pagar cursos extras como música e artes. E lá vamos nós, menos favorecidos financeiramente ou com pais que não incentivam isso, empurrados para nossas caixas e o inevitável erro da primeira graduação.

Acho que as três primeiras temporadas de Glee foram as que importaram mais, eram os excluídos em busca de um sonho que às vezes lhes era negado, mas eles davam a volta por cima. É basicamente o que é a vida. Eternos desafios a serem superados. Claro, que como todo final de novela, tudo deu certo na vida deles. Mas desafios são eternos ciclos e a jornada desses personagens no colégio e um pouquinho na vida adulta, as músicas que embalaram aquelas emoções confusas, quem assistiu a série vai poder carregar pra sempre, como uma inspiração.

Finn Hudson/Cory Monteith

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Dificilmente alguém aqui vai me ver escrevendo sobre Game of Thrones. Eu não sei lidar com morte na ficção, a vida já é dura e eu não preciso de mais esse luto no meu imaginário. Agora quando essa morte na ficção vem acompanhada da morte no mundo real, é realmente doloroso. Glee soube lidar muito bem com essa perda. Não ignoraram ao fazer os personagens seguirem com suas vidas, indiferentes, muito pelo contrário, esse luto esteve bem presente. Cory teve um episódio especial (The Quarterback) e sua camiseta do time foi pendurada no set do vestiário. Sua imgem também apareceu diversas vezes nos dois últimos episódios, inclusive uma cena da primeira performance do Glee original, cantando “Don’t Stop Believing” foi exibida em “2009” e no season finale, o auditório foi nomeado Finn Hudson.

Cory fez parte da série e o personagem dele era fundamental. Glee era uma família dentro e fora das telas, preservar a memória do personagem Finn foi extremamente importante para quem é fã e até para quem já experimentou a dor de uma perda como essa. A série tanto era uma família que não foi a toa que mantiveram a personagem da Kitty na escola depois de todos da temporada anterior terem saído. A atriz Becca Tobin perdeu o namorado um ano após a morte de Cory, por motivos parecidos.

Lea e Becca são amigas fora das gravações

Lea e Becca são amigas fora das gravações

Tchau Gleeks!

Paula Simões

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