Bemti Logo Ali Capa crítica do álbum

Bemti canta o real, irreal e irreversível em ‘Logo Ali’

Cadu Costa

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18 de outubro de 2021

No final de setembro, o mineiro Bemti lançou, em todas as plataformas digitais, Logo Ali, seu segundo álbum, realizado através do edital Natura Musical. O disco conta com uma extensa lista de participações especiais e colaborações, como Fernanda Takai, do Pato Fu; do paraense Jaloo; da baiana Josyara; do português Murais (membro da emblemática banda portuguesa Linda Martini); e do duo paulistano ÀVUÀ.

Entre os musicistas convidados estão Helio Flanders, Paulo Santos (do grupo Uakti) e Marcelo Jeneci, que coproduziu, toca e canta vocais de suporte na faixa “Livramento”, junto a Paulo Novaes, artista indicado ao Grammy Latino 2021. Já nas composições, há colaborações com artistas como Roberta Campos, Barro, Nina Oliveira e Pedro Altério, membro do 5 a Seco (produtor musical do disco ao lado de Luis Calil, líder da banda Cambriana).

Viola caipira + indie folk

Assim como em seu primeiro disco – era dois, lançado em 2018 – o novo álbum tem como base uma sensível exploração da viola caipira de 10 cordas ao som indie folk. Mas é possível notar uma maturidade aliada a uma percepção do mundo ao redor. Suas letras são focadas no real, irreal e irreversível. Ou como diz Bemti, é sobre “amar e desamar e seguir em frente nesses tempos”: “O ato é atravessado pelo eterno fim e recomeço de todas as coisas, tendo o afeto, a arte e a criação como refúgios em tempos difíceis. Um disco sobre caminhar em direção a algo que está sempre quase chegando, que pode ser um futuro melhor ou o colapso definitivo”, explica.

E isso já se nota na primeira faixa “Canto Cerrado” com letras como “Fujam do planeta enquanto há tempo / Na nave que sai ao meio-dia / Não tenho passagem, nem alento / Mas não vou lutar sem melodia.”

A capa é uma “reinvenção expandida” do quadro “O Derrubador Brasileiro” (1879), de Almeida Júnior, notório artista do realismo brasileiro, famoso por registrar com “rigor acadêmico” cenas do cotidiano caipira. Numa mistura de fotografia e arte digital, Bemti repousa com os pés descalços num cenário de floresta tropical semi-derrubada, encostado na viola caipira ao invés do machado da imagem original. Segundo o músico, uma “representação de cantar experiências pessoais envolto por uma sensação constante de mundo acabando: um apocalipse tropical diário”.

Arranjos grandiosos

Neste lançamento, a viola caipira de 10 cordas conversa tanto com arranjos grandiosos de sopros e cordas quanto com eletrônicos de diversas referências contemporâneas. Entre as inspirações, nomes tão diversos como Milton Nascimento, Bon Iver, Arcade Fire, Baleia, Phoebe Bridgers, Tulipa Ruiz, Moses Sumney, Joni Mitchell, Björk, entre outros.

Com 12 faixas e 40 minutos de duração, o álbum se divide em dois atos unidos por um interlúdio.  De acordo com Bemti, ele repetiu e amplificou em Logo Ali algo que adorou fazer no era dois. Mas, segundo o próprio, no trabalho anterior, “a história era bem mais simples: uma ruptura e um recomeço”, comenta.

“O primeiro ato é mais diurno, afetivo e pré-apocalíptico, enquanto o segundo ato é mais noturno, solitário e cataclísmico. O final aponta para uma vontade de viver muita coisa mesmo num cenário inóspito, e se pergunta quando e se a gente realmente chega nesse outro lado. Uma mistura constante entre o íntimo e o superlativo”, finaliza.

Temáticas do coração

Outros destaques entre os músicos ficam por conta da baterista Bianca Predieri (Jadsa); da violista Kinda Assis (Teko Porã); e de Cauê Lemes, que toca piano de cauda e fez a pré-produção do disco. A mixagem do disco é assinada por Luis Calil e a masterização é de Florencia Saravia-Akamine

“Livramento” inaugura as “temáticas do coração” no disco com um afastamento repleto de contradições emocionais. Por outro lado, “Catastrópicos!” tem a parceria de Jaloo e continua o ritmo acelerado com um pop tropical. E, de acordo com Bemti, o single foi escolhido como a primeira parte da “trilogia dos pontos de exclamação” em Logo Ali, ao lado de “Samba!” e “Se Entrega!”.

Aliás, “Se Entrega!” se apresenta como o momento mais direto do disco. Um indie-pop caipira com beats de reggaeton onde a letra romântica vai se cercando de um arranjo que cresce como uma ventania de fim de tarde de verão.

Dois atos

Logo Ali se divide em dois atos, unidos por um interlúdio, composição instrumental com a função de separar partes musicais. Bemti conta que, por ter experiência em roteiros, gosta da ideia de discos narrativos. E o destaque dessa primeira parte vai para “Quando o Sol Sumir”, com a participação da Fernanda Takai. A composição foi feita em parceria com Roberta Campos e a presença do Helio Flanders, do Vanguart, no trompete. Fala de amor de uma forma simples e leve como um romance deve ser. Chega a emocionar quem ainda sabe amar.

Em seguida, “Salvador” é o interlúdio que apresenta uma linda poesia sobre corações partidos e a Bahia. Tem a participação da artista baiana Josyara.

Elementos diferentes

A partir daí, o disco Logo Ali segue sua caminhada de amor, leveza mas com uns elementos diferentes em sua sonoridade como mostra “Eu Te Dei Tudo Que Eu Sou”. Segundo Bemti, foi a primeira música composta para esse trabalho, no fim de 2018.

“Samba!”, com o duo ÀVUÀ, possui arranjos criativos com percussão, baixo e sintetizadores com as vozes ressaltando “a plenitude final do amor, desejo indivisível em mim”.

Nesta segunda parte “Do Outro Lado (Mantra Tornado Grito)” merece o apreço maior pela crescente musicalidade. O artista português Murais compõe um final inspirado em fados que junto da viola caipira de Bemti anuncia um final de mundo e disco grandioso.

Por fim “De Tanto Esperar” se reconecta com o início de Logo Ali. Remete a “Canto Cerrado” pra se perguntar: a caminhada termina? Não saberemos, mas se ela continua, que seja com Bemti como trilha sonora.

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Ouça o álbum Logo Ali, de Bemti

Cadu Costa

Cadu Costa era um camisa 10 campeão do Vasco da Gama nos anos 80 até ser picado por uma aranha radioativa e assumir o manto do Homem-Aranha. Pra manter sua identidade secreta, resolveu ser um astro do rock e rodar o mundo. Hoje prefere ser somente um jornalista bêbado amante de animais que ouve Paulinho da Viola e chora pelos amores vividos. Até porque está ficando velho e esse mundo nem merece mais ser salvo.
8
Créditos Galáticos

Créditos Galáticos: 8

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